Anti-Horácio | Daniel Glaydson Ribeiro


por Taciana Oliveira__






Cadamŷ

 

Nestas veias grassa

mata nativa

e dança o fogo

preto da terra

cum vela branca de mar

 

Kariri-cangaceiro

trisavô matou-se alguns

carcando no próprio sangue

a dor de não ser mais um

 

[Parahyba Siará Piauhy

fronteiras judiciosas

o que é daqui?

mar serra sertão

a mesma face

nimensidão[

 

Per-manheço

Confederação

dos Cariris.

Na língua do tupi,

ki’riri:

silencio e observo.

 

Minha pintura é interna:

menstruo palavras.

 

 

Aforisma I

 

No momento em que pressupormos saber

tudo o que pode ser dito:

morte li(ngua)geira.

 

 

II (ibiapaba)

 

§ Donada, passar dentro duma nuvem

E perceber: que já estou no céu.

 

§ sentir passando dentro: uma nuvem

na névoa da serra e já estar: céu

 

 

III (a diego mendes sousa)

 

A poesia dialoga por acaso.

 

 

Cocal

 

§ esta noite me trouxe

a sensação gostosa

de encontrar Bagagem

 

§ no meio da praça pública:

uma biblioteca sem sistema

sem código em lombada

sem ordem, sem adesivo

 

§ lindos livros misturados

em estantes do mesmo ferro

do trem que passava

dos trilhos, aqui

 

§ a bagagem é de adélia prado

e a poesia desta noite simples

não cabe em trocadilhos que estampem camisetas

mas segue gravada em peito

descamisado

 

§ uma pequena folha me trouxe

pelos cabelos

 

 

IV (a rosa morena)

 

Aprender a te soltar

ainda quente.

 

 

V (a clarice)

 

¿é possível ler-te

sem riscar-te?

 

 

VI

 

delicadeza é tirar sapatos

para entrar na vida

 

(não simplesmente

para que a sujeira

se esqueça)

 

[sim para que pés

possam tocar

o céu do chão[

 

{a pele do pé pisando,

sentindo a sola no solo,

e esse som ressonando{

 

enraizando

como um rizoma

na areia da origem.

 

 

VII (a argentina castro)

 

Teu verso

vale mais

que mil imagens.

 

 

VIII

 

¿Quanto espanto

cabe no pranto

de um sufragista?

 

 

IX

 

Por trás do acúmulo de capital,

fica o lastro da extorsão.

 

 

Aforisma sentipensante (aos peixes)

 

Depois de tantas mortes,

eu sou, apenas,

um espírito em carne viva;

 

Com uma clave-patuá

sob a língua.

 

  Solo onírico (em construção)

 



 













C#m7                   D7M

Viver plenamente é estar consciente

A7M                          F7M

que a vida da gente é ũa semente,

 

C#m7                        D7M

que exige o cuidado de um chão adubado,

A7M                    F7M

que seja regado com flores do lado.

 

C7M                             F7M

A planta assim cresce, robusta floresce,

C7M                                F7M

dá fruto, chega a messe, que louvamos em prece.

 

C#m7                       D7M

Encontrar a palavra, costurar o teu livro,

C#m7                          D7M

sem pensar em lucro: tua letra é teu fruto.



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Daniel Glaydson Ribeiro nasceu em Picos (1985). Pai de Anita, Tarsila e Bento.Professor do Instituto Federal do Piauí. Com o grupo Ausgang de Teatro, organizou o livro Almanach Muda (2016) e levou o Samba de Brecht para a Universidad de las Artes, em Havana, Cuba. Dentre as publicações recentes, estão: a plaquete “Marcescível” pela Mirada (2020); o poema “Põlinud-iná” na revista Desenredos (2020); e traduções de Paul Valéry na revista Em Tese (UFMG), com Fábio Roberto Lucas. "Pulsão de língua" (Mirada, 2021) é seu primeiro livro solo. Coordena o projeto de extensão “Linguagem e poesia #dendicasa”, cuja produção virtual pode ser encontrada em youtube.com/LinguagemePoesiaDendiCasa

 

 



Taciana Oliveira – Editora das revistas Laudelinas e Mirada e do Selo Editorial Mirada. Cineasta e comunicóloga.  Na vitrolinha não cansa de ouvir os versos de Patti Smith: I'm dancing barefoot heading for a spin. Some strange music draws me in…