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por Kamila Ataíde__
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Andrei Tarkovscki é um gatilho, um convite à memória. Foram às minhas lembranças mais caras da infância a que fui atirada. Quando recebi o impulso de escrever sobre ele, pensei que das tantas coisas as quais eu o atribuo, a que eu poderia falar com mais propriedade e, aliás, a mais presente quando lembro das suas obras, é o impacto emocional e afetivo ao qual ele me lança sobre minha própria vida, mais especificamente, sobre a minha infância. Fui rememorando cada um de seus filmes e noto que há sempre uma sensação de nostalgia em mim impactada pelas representações intensas e pungentes de cada momento em que ele projeta um traço de memória. Particularmente, as minhas lembranças mais ternas da infância se desenham na minha mente exatamente com determinadas características de cores e texturas de algumas das suas películas. Isso não só acontece com memórias reais, mas com alguns dos meus sonhos mais significativos.
Tarkovscki trouxe uma verdade onírica e humana às narrativas, que através das características visuais e linguagem fotográfica escolhida por ele me atira sobre cenas calorosas dos 5 ou 6 anos de idade, como também aos sonhos mais conflitantes. A rua da minha casa às 7 horas da manhã, as tardes chuvosas e à meia luz, assistindo TV na companhia da minha avó sentada na cadeira de balanço - fui levada a essa memória ao assistir Nostalgia (1983) e me deparar com a cena do quarto de hotel, onde o personagem Gorchakov está deitado na cama e a iluminação vai se modificando aos poucos no quarto, os cachorros que tive, a tarde em um sítio de algum parente, em algum lugar do mundo, as correrias de fim de semana no meio da rua.
Revisitando alguns trechos do filme O Espelho (1975) para escrever esse texto, fui arrebatada por memórias inéditas de algum lugar no espaço-tempo da minha infância. Apenas alguns flashes de um campo arborizado, pessoas muito altas por perto e uma luz de fim de tarde. Andrei ainda dota desse poder. A cada vez em que paro para revisitar alguns de seus filmes, eles extraem de mim alguma cena esquecida e guardada no fundo da memória.
O Espelho (Andrei Tarkovski, 1975)
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Nesse mesmo filme, O Espelho (1975), Tarkovscki traz uma leitura da própria vida através do paralelo entre passado e presente e sugere - através de algumas características do filme como a utilização dos mesmos atores para personagens diferentes – a percepção de como algumas vidas são reflexos de outras, como uma reprodução hereditária de comportamentos. Isso me faz pensar sobre como vi e ainda vejo algumas histórias da minha família se repetirem com o passar das décadas. Cada uma das películas me convidou, em determinado momento, a viajar no tempo até algum instante considerado importante para a cabeça de uma criança entre os 4 e os 10 anos. E cada uma dessas películas também me convidou à refletir como os elementos de uma linguagem fotográfica, seus aspectos técnicos, dramáticos, suas composições, a iluminação, a música, o silêncio em momentos cruciais, são capazes de inspirar e encaminhar o espectador a regiões tão pessoais da própria vida e, por mais destoante que possa ser a realidade da personagem com a do espectador, ainda assim, gerar algum segundo de identificação e viagem no tempo. Tarkovscki é realmente um convite à memória, a dele e a nossa, da forma mais sensível e humana que se pode fazer.
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Andrei Tarkovski nasceu em 1932, na extinta União Soviética. Filho de uma atriz e de um poeta, foi criado pela mãe (seu pai abandonou a família quando Tarkovski tinha cinco anos). Formado em geologia, mas apaixonado pela sétima arte, cursou a Escola Soviética de Cinema (VGIK). Dirigiu A Infância de Ivan (1962), Andrei Rublev (1966) Solaris (1972) e Stalker (1979), Nostalgia (1983), O Sacrificio (1986) entre outros títulos. É considerado um dos maiores cineastas do século 20 e talvez seja apenas superado, em grau de importância no cinema russo, por Sergei Eisenstein.
Faleceu em 1986 em consequência de um câncer no pulmão.
Faleceu em 1986 em consequência de um câncer no pulmão.
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por Taciana Oliveira__
Poeta, artista visual, produtor cultural e editor literário. Baga Defente é múltiplo e incansável. Há tempos que a gente queria publicar essa entrevista. Há tempos que ela precisava acontecer. Equilibramos nossas agendas e o resultado de nossas conversas compartilhamos agora.
por
Fernando de Souza__
APRENDENDO A VIVER COM A SOLIDÃO DO MORRER
APRENDENDO A VIVER COM A SOLIDÃO DO MORRER
morte,
não sejas orgulhosa
apesar
de alguns te chamarem terrível e poderosa
tal
não serás
aqueles
que pensas teres deixado para trás
não
morrem, pobre morte,
nem
a mim podes levar
após
um breve sono, acordamos eternamente
e
a morte deixará de existir,
morte,
tu também morrerás
(John
Donne)
Emma Thompson |
por Fernando de Souza__
..Não
dá pé, não é direito
Não
foi nada, eu não fiz nada disso e você fez um
Bicho
de sete cabeças
Não
dá pé, não tem pé nem cabeça
Não
tem ninguém que mereça, não tem coração que esqueça...
(Zé
Ramalho)
A
expressão popular “bicho de sete cabeças”, assim como “fazer
muito barulho por nada”, refere-se à (infindável) capacidade
humana de projetar seus medos, ansiedades e angústias em situações
aparentemente sem grandes repercussões factuais. Este “bicho”
nos lembra a Hidra de Lerna, monstro da mitologia grega, também com
várias cabeças, e que tinha a capacidade de regenerá-las toda vez
que uma era cortada, crescendo outras em seu lugar. Via de regra, o
grande problema dos “bichos de sete cabeças” é justamente este:
assim como a Hidra, eles tendem a tomar proporções maiores do que
as reais, especialmente quando mal ou não resolvidos...
Neto, personagem interpretado por Rodrigo Santoro, vive com seus pais e sua irmã mais velha, e frequenta o Ensino
Médio. É um adolescente comum, com as dificuldades de
relacionamento com os pais, dúvidas e conflitos, como outros de sua
fase. Usa maconha esporadicamente com seus colegas, por lazer (ou
falta dele!), embora mantenha conservados os vínculos familiares,
sociais, escolares, etc. Certo dia, Neto e seus amigos, num ato de
rebeldia, vandalizam e picham um prédio, somente ele é preso pela
polícia e solto mediante a presença de seus pais: ele, autoritário;
ela, passiva. A partir deste evento e da posterior descoberta, por
seu pai, de um cigarro de maconha no bolso de sua roupa, a vida de
Neto vira de cabeça para baixo, com sua internação compulsória
num hospital psiquiátrico, autorizado por sua família, para um
pretenso tratamento para dependência química - apesar de nenhum
exame laboratorial, avaliação psiquiátrica ou psicológica ou
sequer entrevista ser realizada durante sua internação – baseado
exclusivamente na administração de medicamentos e exposto à
realidade de pacientes dos mais variados problemas de saúde mental e
de graus de gravidade clínica. Após um período de
ressocialização malograda, acontece uma segunda internação noutra
instituição, com efeitos terapêuticos e sequelas psicológicas
igualmente desastrosas. A nova internação nem surte os “resultados
esperados” (por quem?) como, ainda por cima, desestabiliza ainda
mais a saúde mental de Neto, novamente entregue a um tratamento
desumano, irresponsável e ineficaz. O que não era, até então, um
grande problema, agora o é. Um bicho de sete cabeças.
O
filme Bicho de sete cabeças (direção de Laís Bodanzky, 2001 ) nos possibilita várias
reflexões. Numa esfera subjetiva - embora representativa da
realidade de muitos jovens, tomando Neto como seu representante -
pensamos nas experiências de descoberta e de rebeldia durante a
adolescência, os conflitos geracionais presentes nas dinâmicas
familiares, causados pelo autoritarismo, repressão, incompreensão e
falta de abertura, e os impactos destas relações na vida afetiva e
no comportamento dos adolescentes. Podemos refletir também na
dificuldade em aceitarmos o “diferente” (eufemismo para
“perturbador” ou “indesejável” tanto nos indivíduos de
conduta transgressora juvenil como naqueles acometidos por
psicopatologias, por apresentarem comportamentos “excêntricos”
(outro eufemismo, desta vez para “inadequado”, “incômodo” ou
“desagradável?). Ambos os “perfis” são frequentemente
rotulados como desviantes e, em consequência, estigmatizados e
marginalizados.
Entretanto,
há uma reflexão – senão uma crítica – imprescindível neste
filme: trata-se de um símbolo da luta antimanicomial no Brasil.
Bicho de sete cabeças é baseado no livro Canto dos malditos, de
Austregésilo Carrano Bueno, que conta suas experiências de
internação em hospitais psiquiátricos, similares às de Neto.
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Fernando de Souza é psicólogo em formação, mestre em Letras e bacharel em
Comunicação pela UFPE. Publicou artigos acadêmicos em Psicologia,
concorreu e recebeu alguns prêmios de poesia entre 1991 e 1995.
por
Taciana Oliveira___
Escrevo ainda
“sofrendo” o impacto de assistir Todas as coisas que brilham. Rapidamente faço uma busca para conhecer detalhes
da produção do filme e encontro uma matéria no The Washington
Times celebrando a estréia da peça em Nova York:
Every
Brilliant Thing no Barrow Street Theatre é talvez uma das peças
mais animadoras e alegres para ver neste inverno, mesmo que se
aprofunde sobre o tema suicídio e você seja solicitado a ler algo
em voz alta.
Explicando:
Todas as coisas que brilham é um documentário dirigido por
Fenton Bailey e Randy Barbato, que capta durante
dois dias, três apresentações, com platéias diferentes, de um
monólogo que tem como tema a depressão e o suicídio. A
dramatização é conduzida genialmente pelo o ator e músico inglês
Jonny Donahoe e pela platéia, que é convidada a atuar
em algumas trechos do espetáculo.
O
texto é baseado no conto de Duncan Macmillan. Donahoe
é o responsável por adaptá-lo para a versão teatral.
O
filme e a peça nascem de uma lista elaborada por um filho para sua
mãe, que sofre de depressão crônica, Uma tentativa de
provar o valor de se viver cada instante da vida. Antes de começar o
espetáculo Donahoe distribui pedaços de papel e orienta o
público a ler alguns dos itens dessa lista, onde podemos encontrar coisas como: posso me vestir como
lutador mexicano, ficar acordado até tarde e poder ver TV, sorvete,
guerra de água, a cor amarela, coisas listradas, montanhas russas,
chocolates, usar capa, ter uma música perfeita, sexo, passar a
noite conversando com alguém, chá com biscoitos...
Confesso
que fiquei um pouco confusa ao determinar o gênero do filme como documentário. Fiz alguns questionamentos que divido com vocês:
A
narrativa teatral é o instrumento principal do filme?
O ato de apresentar os bastidores e a preparação da platéia
configura como um documentário observativo? A inserção
de imagens adicionais para complementar o roteiro é um
artifício de uma narrativa poética documental? Teatro filmado é
teatro?
Independente
de qualquer resposta, Todas as coisas que brilham é um
exercício artístico que bebe da fonte de várias linguagens e
suportes. Fiquem atentos na maravilhosa playlist, na fotografia em
preto e branco e na delicada montagem escolhida para o filme.
Jonny
Donahoe é um ator espetacular. Ele consegue expor um tema tão doloroso de uma maneira educativa e peculiar. Segundo dados da Organização Pan-Americana da
Saúde - OPAS, o suicídio é a segunda principal causa de morte
entre jovens com idade entre 15 e 29 anos.
Todas
as coisas que brilham nos convida a dançar, chorar e viver. O
filme transborda sentimento.Finalizo
o texto partilhando alguns itens da minha lista:
Nadar no mar em dia de sol com chuva (sempre tem um arco-íris no horizonte)
Conversar
bobagens com os amigos
Criar playlists com meu filho
Pudim
Café
Abraço
Ser
solidária
Ouvir
o silêncio
Cheiro
de livro novo
Amar
e mudar a coisas...
* Disponível na HBO GO
* Disponível na HBO GO
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Taciana
Oliveira é mãe de JP, cineasta, torcedora do Sport Club do
Recife, apaixonada por fotografia, café, cinema, música e
literatura. Coleciona memórias e afetos. Acredita no poder do
abraço. Canta pra quem quiser ouvir: Ter bondade é ter coragem
por
Taciana Oliveira__
Muitos
da minha geração só tomaram conhecimento sobre a existência de
Quincy Jones depois do sucesso estrondoso de Thiller,
de Michael Jackson. Produtor do célebre álbum que dominou as rádios na década de 1980, Quincy já era um nome de destaque no
cenário artístico. Conhecer seu itinerário na música é enveredar por acordes
e cenas históricas dos séculos 20 e 21, é descortinar o passado
recente da segregação racial nos EUA, é enaltecer a genialidade de um
homem, que mesmo em momentos cruciais descobriu o caminho para a
redenção.
Trompetista,
aos 14 anos já atuava em bandas de jazz. Aos 18 anos foi convidado
para fazer parte da banda de Lionel Hampton. Nos anos
seguintes se consagra como um dos principais arranjadores da música
americana. Ganhador de 27 Grammys, produtor e amigo de Ray
Charles, Frank Sinatra, Dinah Washington, Peggy
Lee e Sarah Vaughan, ele encontrou fôlego para
investir na indústria cinematográfica. A Cor Púrpura ,
dirigido por Steven Spielberg, nasceu da determinação e
ousadia de Quincy Jones em atuar na produção executiva e
musical do filme.
Sua trajetória é revista no documentário Quincy, dirigido por
sua filha Rashida Jones e por Alan Hicks. O filme traz
um rico acervo iconográfico e resgata não apenas a personagem do
produtor e arranjador. Quincy Jones expõe detalhes da
infância, fala dos seus casamentos, do amor incondicional pelos sete
filhos, da mãe com esquizofrenia e da rotina prolífica nos
estúdios de gravação. Um dos momentos geniais do documentário
é o reencontro de Quincy com os profissionais que participaram da
realização de Off the Wall, de MichaeL Jackson. O compositor Rod
Temperton, o engenheiro de som Bruce Swedien, o teladista Greg
Phillinganes, o baixista Louis Johnson , o baterista John Robinson, o
trompetista Jerry Hay, e o percussionista Paulinho da Costa tocam
algumas faixas do emblemático álbum produzido por Jones.
Vale
lembrar que o pai de Rashida (ela pode ser vista em algumas sequências do filme) também é produtor da série Um Maluco no Pedaço, e
organizou o evento de abertura do Museu Nacional de História e
Cultura Afro em Washington. O trecho em que Quincy Jones
retorna à casa de infância é talvez um dos mais significativos
momentos da narrativa do documentário. Contra todos os prognósticos o menino
Quincy se transformou em um ícone da música americana, em um pai
amoroso. Um homem de uma biografia apaixonante.
*Pra
viajar, dançar e se embriagar nessa celebração a Quincy
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Taciana Oliveira é mãe de JP, cineasta, torcedora do Sport Club do Recife, apaixonada por fotografia, café, cinema, música e literatura. Coleciona memórias e afetos. Acredita no poder do abraço. Canta pra quem quiser ouvir: Ter bondade é ter coragem.
por Taciana Oliveira___
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O
documentário Virando a mesa do Poder, (Knock Down The House, Direção
de Rachel Lears), revela os bastidores da campanha de Alexandria
Ocasio-Cortez, fenômeno político que obteve vitória esmagadora nas
primárias do Partido Democrata, no 4º Distrito Congressional de
Nova York. Alexandria é descendente
de latinos, com formação em relações internacionais, mas trabalhava como garçonete para ajudar a família depois da morte
do seu pai: "Ser garçonete me ajuda nesta corrida porque sei como é
trabalhar sob pressão 14 horas por dia."
O
filme conta com a participação de outras três candidatas:
Paula Jean Swearingen pela Virgínia Ocidental, Cori Bush, pelo
Missouri e Amy Vilela, por Nevada. Todas romperam a mola que
impulsiona o establishment nas eleições legislativas de 2018. Recusaram a contribuição de empresas nas suas campanhas, a participação de velhos nomes do Partido
Democrata e a atuação da mídia tradicional. Optaram por financiamento coletivo e doações de eleitores. Essas mulheres ousaram levantar pautas como a da gratuidade do ensino superior e da prestação
de serviços de saúde, além de sugerir a criação de políticas ambientais
de combate à mudanças climáticas e a construção de uma economia justa para os mais
pobres.
Alexandria
Ocasio-Cortez foi eleita para uma das cadeiras do Congresso, se transformou em sucesso espontâneo nas redes sociais
e foi capa da revista Rolling Stone. É importante conhecer o
antes e depois de cada candidata. As suas histórias se conectam em
trajetórias de perdas e lutas. Cada uma em sua geografia afetiva e
no dia a dia da sua realidade social.
O
documentário venceu o prêmio da audiência no Festival Sundance. A
produção também é cria de uma campanha na plataforma de microfinanciamento Kickstarter. Virando
a mesa do Poder resgata em nós a crença que é possível e
necessário realizar mudanças. Agora mais do que nunca é urgente
perseverar .
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Taciana
Oliveira é mãe de JP, cineasta, torcedora do Sport Club do
Recife, apaixonada por fotografia, café, cinema, música e
literatura. Coleciona memórias e afetos. Acredita no poder do
abraço. Canta pra quem quiser ouvir: Ter bondade é ter coragem.
por
Cristina Huggins___
De
tanto olhar as grades, seu olhar
esmoreceu
e nada mais aferra.
Como
se houvesse só grades na Terra:
grades,
apenas grades para olhar.
Rilke,
A pantera
Os
versos do poeta expõem o triste fim de uma pantera, cerceada de seu
ambiente natural. Para o felino, a liberdade é pretérita; seu
presente, a jaula de um zoológico. Contrastes entre uma cidade do
passado, mais generosa e hospitaleira, refúgio e conforto de seus
habitantes, e outra, atual, inóspita e tirana com os cidadãos,
permeiam a memória dos mortais que residem na urbe registrada por
Taciana Oliveira.
Quantos
gritos cabem no silêncio dessa cidade? O média-metragem da
diretora é também uma pergunta que rouba o sossego. No
filme, a cidade é melancólica, assombrada pelo descaso e pela
incerteza. Suas personagens, “panteras-bípedes”, aprisionadas
nessa urbe nada gentil, deambulam pelas ruas, atormentadas em meio à
nostalgia e à angústia. Uma delas vagueia até esbarrar na
mesma porta. Confere a residência, velha conhecida, e tomba o corpo
fatigado na mesma cama. É noite. É dia. É noite. É dia. É noite.
É dia... Desperta, sufocada por um cotidiano linear.
“Uma
cidade é um corpo de pedra com um rosto”, escreveu Machado de
Assis. Taciana mostra o rosto de sua cidade. Ousada, evita
obviedades. Escolhe uma vereda tortuosa para dialogar com o
espectador. Dispensa a narrativa esperada, conduzida pela palavra, e
constrói uma crônica imagética que flerta com a música. Na tela,
passeiam tipos insones, alucinados, atordoados, perdidos; mas
igualmente solidários, generosos, puros e, às vezes, confiantes.
Ela incorpora cada um deles como alter egos e convoca a
sociedade à reflexão.
O
destemor e a singularidade da cineasta chamam a atenção. É preciso
valentia para fazer perguntas lancinantes e cortar o próprio
músculo. Ela tem essa coragem. Não receia sangrar. Como Saramago,
brada aos sete ventos: “Se tens um coração de ferro, bom
proveito. O meu, fizeram-no de carne, e sangra todo dia”. Seu
trabalho é faca amolada. Fere, mas também emancipa. As cores
incidentais, a generosidade de pessoas de uma comunidade humilde e a
inocência de uma criança-anjo — punctum de uma cena hostil
—, entremeadas no cenário sombrio do filme, acenam para respostas
e uma esperança de cidade harmônica possível.
Neste
e-book, estão reunidos frames e fotografias da
diretora, textos de convidados, e de escritores selecionados por ela
para integrar a edição. Apreciar esse material é empreender uma
jornada pela visão de Taciana sobre viver e conviver nas metrópoles
de hoje. O e-book e o média-metragem fazem parte dos trabalhos
levados ao público pela Galeria do Meio-dia, projeto da Garagem 94,
em 2018.
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Cristina
Huggins é especialista em Linguística aplicada(UFPE). Tem
formação em Estudos Hispânicos (Salamanca, Espanha). Sua
experiência inclui ensino, pesquisa, produção de textos e
tradução.
__________________________Abaixo você pode assistir o trailer do filme e visualizar o catálogo da exposição.
Sociedade
dos Poetas Mortos, Direção de Peter Weir, 1990
por
Erica Guerra e Ronney Diniz
Sociedade
dos Poetas Mortos é um drama dirigido por Peter Weir e estrelado por
Robin Williams. Foi um dos filmes mais marcantes do cinema
norte-americano da década de noventa e faz uma crítica ao sistema
de ensino tradicional.
A
história se passa nos Estados Unidos, no ano de 1959, numa
instituição de ensino tradicional chamada Academia Welton,
considerada um das melhores escolas da época. O drama gira em torno
de John Keating (Robin Williams), um professor e ex-aluno da
instituição que lecionava na Chester School, em Londres, e é
chamado para substituir o agora aposentado professor de Literatura.
A
escola para rapazes de ensino médio tem cem anos de história e
possui como ideal didático um ensino rígido e inflexível como o
que se vê no universo militar. A filosofia de ensino está baseada
em quatro pilares: a tradição, a honra, a disciplina e a
excelência. Inclusive no próprio uniforme dos alunos que utilizam
ternos com vários brasões.
por Taciana Oliveira___
No
último mês de março o Centro Cultural Banco do Nordeste em
Fortaleza promoveu A Imagem da Palavra: Oficina Criativa de
Narrativas Visuais. Na programação conceitos básicos sobre as afinidades das narrativas literárias e cinematográficas. Foram três
dias de conversas, atividades teóricas e práticas relativas à concepção de roteiros para a produção de quatro
videopoemas.
por Taciana Oliveira___
"Que época maravilhosa!" Ditadura de esquerda ou de direita é ditadura. Torturador não é herói, não merece homenagens. Quem legitima ódio, violência e preconceito não me representa.
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"Que época maravilhosa!" Ditadura de esquerda ou de direita é ditadura. Torturador não é herói, não merece homenagens. Quem legitima ódio, violência e preconceito não me representa.
Taciana Oliveira é cineasta, torcedora do Sport Club do Recife, apaixonada por fotografia, café, música e literatura. Coleciona memórias e afetos. Acredita no poder do abraço. Canta pra quem quiser ouvir: Ter bondade é ter coragem
por Taciana Oliveira__
Jane Fonda em cinco atos é um documentário que aborda a trajetória da atriz a partir do resgate de suas memórias e relacionamentos afetivos. Filha do ator Henry Fonda, refém emocional da trágica morte de sua mãe, Jane relembra seus três casamentos, escancara suas fragilidades e reconstrói o período significativo de sua militância. Feminista desde sempre, a narrativa do documentário revela uma mulher ainda profundamente conectada com o futuro.
por Taciana Oliveira__
As Duas Mortes de Sam Cooke é um documentário que aborda a trajetória do cantor e compositor considerado por muitos o pai da Soul Music ou o Rei do Soul. Sam Cooke foi um dos primeiros e mais importantes artistas militantes dos direitos civis americanos. Filho de um pastor evangélico, criado em Chicago, começou sua carreira musical cantando em igrejas até tornar-se vocalista de uma banda gospel. Anos depois foi contratado por uma grande gravadora e sua voz ganhou as rádios americanas. Por sua elegância e suavidade na interpretação, no início da carreira passou a ser comparado a Frank Sinatra.
Visionário, em uma época que as grandes gravadoras dominavam o mercado, investiu na criação de um estúdio de gravação voltado exclusivamente na valorização e contratação de músicos negros. Era amigo de Muhammad Ali, Malcolm X, Smokey Robinson e de tantos outros nomes que contestavam a política segregacionista do governo americano. Cooke era o segundo maior nome em vendas da gravadora RCA, ficando atrás apenas de Elvis Presley. Talento incontestável, morreu aos trinta e três anos em circunstâncias até hoje não devidamente esclarecidas. Seu legado musical inspirou gente como Marvin Gaye, All Green e Michael Jackson. Inspirado em Bob Dylan, que escreveu Blowin' in the Wind, Cooke compôs Change is gonna come, canção que virou o hino dos direitos civis nos Estados Unidos. Seus versos foram citados no discurso de posse do presidente americano Barack Obama em 2014.
A direção do documentário é de Kelly Duane . O filme é costurado por depoimentos de familiares, amigos e fãs, e ainda conta com as participações de Quincy Jones e Dionne Warwick. Abaixo uma playlist de grandes sucessos de Sam Cooke e o trailer do filme.
I
was born by the river in a little tent
Oh
and just like the river I've been running ever since
It's
been a long, a long time coming
But
I know a change gonna come, oh yes it will
It's
been too hard living but I'm afraid to die
Cause
I don't know what's up there beyond the sky
It's
been a long, a long time coming
But
I know a change gonna come, oh yes it will
I
go to the movie and I go downtown
Somebody
keep telling me don't hang around
It's
been a long, a long time coming
But
I know a change gonna come, oh yes it will
Then
I go to my brother
And
I say brother help me please
But
he winds up knockin' me
Back
down on my knees
There
been times that I thought I couldn't last for long
But
now I think I'm able to carry on
It's
been a long, a long time coming
But
I know a change gonna come, oh yes it will
A Change Is Gonna Come, Sam Cooke
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Taciana Oliveira é cineasta, torcedora do Sport Club do Recife, apaixonada por fotografia, café, música e literatura. Coleciona memórias e afetos. Acredita no poder do abraço. Canta pra quem quiser ouvir: Ter bondade é ter coragem.
por Taciana Oliveira___
A
história começa na comemoração do aniversário de Nadia
(Natasha Lyonne),
que após um acidente “fatal” mergulha em uma espiral de
repetições diárias com efeitos diferentes para determinadas
situações de sua existência. Nessa viagem é possível vislumbrar
passagens determinantes na formação de sua personalidade, e
perceber que o seu envolvimento com o mundo estabelece consequências
inevitáveis para quem a cerca. Com um elenco extremamente afinado,
uma montagem ágil e uma trilha sonora que te pega no primeiro verso
de Gotta Get Up,
de Harry Nilsson,
a série é uma caixa de referências pop que vão desde a citação
do filme Vidas em
Jogo
de David Fincher
até o nome da empresa onde Nadia trabalha, Rock
and Roll Games,
uma homenagem explícita a produtora Rockstar
Games,
das séries Grand
Theft Auto
e Red Dead
Redemption.
Sim,
Boneca Russa
merece uma maratona. Assisti de um fôlego só. A série tem um
roteiro inteligente, uma narrativa enxuta construída por diálogos
hilários. A ironia e o loop atemporal que permeia os oito episódios
são a fonte de sustentação para o desenvolvimento dos conflitos
psicológicos das personagens. Porém, nem tudo na série é motivo
pra gargalhada. Rir de tudo em Boneca Russa é sinal de desespero.
Natasha Lyonne |
Fuja
do clichê “mais
um roteiro parecido com o filme Feitiço do Tempo.”
A produção em questão não é o primeira a utilizar do mesmo
recurso narrativo. La
jetée,
um curta-metragem de ficção científica, dirigido pelo francês
Chris Marker
em 1962, já apostava na fórmula. Há dezenas de outros títulos que
utilizam dessa ferramenta criativa para criar histórias que
transcendem além do loop atemporal e da viagem no tempo. Boneca
Russa
não é uma simples comédia de costumes. A proposta das roteiristas
Natasha Lyonne,
Leslye Headland
e Amy Poehler,
extrapola comparações simplistas com o filme de Harold Ramis.
Fuja dessa premissa e dê o play no primeiro episódio.
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Taciana
Oliveira é cineasta, torcedora do Sport Club do Recife, apaixonada
por fotografia, café, música e literatura. Coleciona memórias e
afetos. Acredita no poder do abraço. Canta pra quem quiser ouvir:
Ter bondade é ter coragem.