Trechos do livro Amor de Manjericão, de Ana Paula Couto

 por Ana Paula Couto__



Trecho 01


Na altura dos meus quarenta, recém-separada, e diga-se de passagem, bem desorientada, tive um encontro que marcaria meu coração para sempre de uma forma única e pura. Como feminista que sempre fui, vivi um casamento de anos de forma independente, mas, para dizer a verdade, ninguém está preparada para uma separação. Eu pelo menos não estava.


Pesaram na minha balança emocional conceitos como fidelidade, lealdade, solidão, desamor e muito mais. Pesaram tantas coisas que ora minha balança pendia para um lado, ora para o outro. Foi um desarranjo total, pelo menos para mim, foi assim.


Parecia que minha vida era uma prateleira de livros toda arrumadinha (eu achava que era, mas estava totalmente enganada) e, de repente, minha prateleira despencou e tudo caiu no chão. Cabia a mim arrumar tudo de novo, mas eu não sabia por onde começar.


A separação se deu por uma simples constatação: fui traída. E imagino que por muitos anos. Até aí, fato corriqueiro que muitas mulheres já viveram. Corriqueiro? Corriqueiro uma ova! Ser traído é muito mais do que ter seu parceiro ou parceira envolvido com outro alguém. A traição vai além disso. Vão por terra a lealdade, a confiança no outro e a sua autoconfiança, o amor pelo outro e o seu próprio e muito mais. 




Trecho 02



Sabe aquela história de que foi bom enquanto durou? Então, o namoro com o engomadinho durou pouco. Se eu falar que não foi bom estarei mentindo, porque eu estava tão aniquilada emocionalmente que o “mais ou menos” para mim foi considerado bom. Pois bem, não virei o ano namorando. Pelo contrário, virei o ano sozinha de novo. “Começar de novo e contar comigo.” Vinha-me à mente a música de Ivan Lins. Vai valer a pena? Naquele momento eu não sabia a resposta. De novo eu me sentindo o “ó”!


Na verdade, eu não me dei o tempo do luto pelo término do meu casamento. E tampouco sei se realmente eu deveria ter me dado esse tempo. Sabe aquele tempo em que nos dizem ser saudável ficar sozinha? Eu estava vivendo meio que à deriva, estilo Zeca Pagodinho “deixa a vida me levar” quando comecei esse namoro prematuro.


E o ano novo chegou! Com ele veio o verão. Calor no coração. O meu não estava na onda desse axé, estava mais para o freezer. Onde estavam as expectativas? No pé. Eu tentava me animar formulando pensamentos do tipo:


Poxa, você se jogou em um relacionamento depois de tanto tempo casada, foi corajosa. Foi legal, bacana, bom enquanto durou.


Ou ainda tentava me animar com:


Você nem gostava tanto dele assim... 


Enfim, eu tentava buscar toda a positividade que habitava o meu ser. De fato, eu não estava apaixonada quando comecei a namorar depois da separação. Esse cara foi a pessoa que trouxe à tona a mulher que habitava em mim e estava escondida e acabrunhada. Gosto de dizer que esse episódio foi um rito de passagem, talvez tenha existido para tirar o ranço. A questão era que eu estava carente, cansada daquela sensação de derrota e brigava com minhas emoções.




Ana Paula Couto nasceu em Nova Friburgo (RJ), onde ainda reside. Professora de língua inglesa por mais de duas décadas, redescobriu na pandemia sua paixão pela escrita, publicando contos e crônicas em antologias antes de estrear na literatura solo com “Amor de Manjericão”, publicado em 2022. Participou de eventos como Flip e Bienais do Rio, São Paulo e de Pernambuco,  além de integrar coletivos de escritoras. Casada, mãe e avó, divide seu tempo entre as salas de aula e a criação de novas histórias.