Tio | Luana Braga

 por Luana Braga





tio,

o que é isso?

tio,

pra onde a gente tá indo?

tio,

a mãe tá sabendo?

tio,

porque é que cê tá rindo?


tio,

porque cê tá tirando a roupa?

tio,

o que é isso que cê tá fazendo?

ai, tio,

isso me machuca!

tio,

eu quero sair daqui correndo!


tio,

porque tá fazendo isso de novo?

pai,

como você pode gostar disso?

vô,

quem ama também maltrata?

primo,

me solta!, eu não brincar de ser sua namorada…


tio,

hoje eu pensei em desaparecer

queria só acabar

com toda a minha dor…

(levar pra bem longe)


tio,

ouvi dizer que não pode, que é pecado

então, alguém me acode!

eu só quero brincar

e receber amor...


vô,

cadê a sua fé?

seu amor? sua empatia?

pai,

cadê a alegria da poesia?


assassina, assassina

me chamam de assassina

mas eu não sou assassina

eu não sou assassina


tio,

eu já quis muito que você sumisse..

agora, eu só quero que você apareça!

tio,

você precisa pagar pelo seu crime

é que, tio,

eu não mereço tanta tristeza...


assassina, assassina

me chamam de assassina

mas eu não sou assassina

eu não sou assassina


não interessa que tio que é

não interessa o tio de quem

isso acontece todos os dias

isso acontece na casa de alguém





O texto do poema "tio" invadiu a alma e a escrita da autora, Luana Braga. O assunto delicado, estampado nas manchetes dos principais jornais do país, a impactou instantaneamente, assim como a suas amigas, parceiras de trabalho artístico e de luta, lá de Fortaleza, no Ceará, para um mundo mais justo.


Em 2020, em plena pandemia, a luta de uma menina de dez anos que engravida após uma série de abusos ocorridos no ambiente familiar invade os lares do país. Durante a chegada da menina na clínica onde faria o aborto legal, previsto pela lei máxima do país, extremistas chocam a todos ao a chamarem de assassina.


O vídeo-poema conta com participações riquíssimas de atrizes, cantoras, dançarinas, artistas e amigas de Luana, nessa caminhada árdua, cheia de tristezas respiros de esperanças, que é a vida.


O presente trabalho tem o singelo objetivo de dar voz a assuntos que acometem a todes, enquanto sociedade: o abuso sexual na infância, o estupro de um incapaz, a gravidez e o aborto, decorrentes de tais abusos. Assuntos que, infelizmente, não se esgotam com a projeção desse caso; mas estão muito próximos de nós, em nossos lares.


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Ficha Técnica:

Texto: Luana Braga

Participações: Adna Oliveira, Alda Pessoa, Ana Bernardo, Anna Karina Cavalcante, Camila Santino, Danielle Lima, Débora Ingrid, Ercília Lima, Géssyka Sousa, Jord Guedes, Juliana Tavares, Luana Braga e Luana Florentino.

Edição de Vídeo: Mirante Cine -- @projetomirante




Luana é escritora, compositora e percussionista. Faz parte do Maracatu Solar, da Caravana Cultural e da Banda Sinfônica da UFC, Universidade Federal do Ceará. Ainda, é integrante da fanfarra carnavalesca Hospício Cultural. Fez músicas em parceria com vários músicos da cidade, tais como Calé Alencar, Joyce Custódio, Jord Guedes, Guilherme Cunha, Charles Wellington, Pedro Falcão, Zé Rodrigues e João Pirambu. Colaborou na produção do sarau itinerante “Casa de Poesia”, “Sarau da Lamarca” e “Sarau Mandinga”. Tem poemas publicados no blog literário “Leituras da Bel” e na “Revista Maracajá”, ambos do Jornal “O Povo”. Seu poema “Quem é tu” faz parte da vídeo-performance “Estar Só”, da artista e produtora cultural Juliana Tavares, fazendo parte do edital “Cultura Dendicasa”, SECULT/CE. Atualmente, publica seus escritos na revista online “A Confraria”. Seu material literário-fotográfico “Nunca mais eu digo: eu te amo” foi exposto em galerias e livrarias, em Fortaleza e no IFCE-Acaraú. O seu mais recente trabalho, o poema 'Tio”, está disponível em seu canal de Youtube. O catálogo de todo o seu material encontra-se disponível no seu LinkTree (https://linktr.ee/insolitaviagem). É de sua autoria a galeria fotopoética 'Insólita Viagem', no instagram.