Mulheres apagadas da literatura brasileira: Júlia Lopes de Almeida

 por Carol Engel e Ana Maria Leite Barbosa |




Mulheres apagadas da literatura brasileira: por que Julia Lopes de Almeida não é tão conhecida hoje pelos leitores como é a Jane Austen?


Será que não havia escritoras no Brasil no século XIX e início do XX? Conhecemos grandes romancistas inglesas e americanas, que são bestsellers até hoje em seus países, assim como no Brasil. Afinal, quem nunca ouviu falar em Jane Austen e no seu livro “Orgulho e Preconceito”? Pouquíssimas pessoas. No entanto, são raros aqueles que conhecem ou tiveram a oportunidade de ler os textos da escritora carioca Julia Lopes de Almeida.


Julia nasceu no Rio de Janeiro em 24 de setembro de 1862 e, ao longo dos seus 71 anos de vida, escreveu 25 obras, sendo 12 romances e os demais distribuídos entre contos, literatura infantil, jardinagem, comportamento e viagens, e ainda algumas peças de teatro. As tiragens de seus livros chegavam a alcançar 5.000 exemplares, com várias reedições. Suas obras são muito envolventes e escritas de forma direta e de fácil compreensão mesmo nos dias atuais. Em cada um de seus livros temos a oportunidade de conhecer épocas distintas de nossa história, como a escravidão, em “A Família Medeiros”, a implantação da República e a era da industrialização brasileira e, em todas elas, a transformação pela qual passaram as mulheres nestes períodos.


Não foi apenas como romancista que Julia se destacou — era também uma importante jornalista. Escreveu por mais de 30 anos nos principais jornais brasileiros, chegando a ter, por vários anos, uma coluna semanal no jornal “O Paiz”. São mais de 1.000 crônicas publicadas na imprensa, onde a escritora usou sua pena para defender a educação e a emancipação da mulher, o voto feminino, a melhoria da qualidade de vida das populações mais pobres, além de temas polêmicos como a derrubada do Morro de Santo Antônio, ao qual Julia se opunha ferrenhamente.


Julia nasceu e cresceu em uma família culta que incentivava as artes. Aos 19 publicou seu primeiro artigo no jornal Gazeta de Campinas e não parou mais. Casou-se com o poeta e jornalista Filinto de Almeida e criou seus quatro filhos sem abrir mão de sua profissão — o que era um fato inédito na época em que as mulheres não tinham voz e precisavam da autorização do pai ou do marido até mesmo para viajar.


Júlia Lopes de Almeida


Apesar de ter morado em Friburgo (RJ), Campinas (SP) e Paris, passou grande parte de sua vida no bairro de Santa Teresa, no Rio de Janeiro, onde reunia, no famoso Salão Verde de sua casa, a intelectualidade da época para saraus. Foi uma das idealizadoras da Academia Brasileira de Letras, mas não pôde ser empossada, porque o estatuto da época, inspirado na Academia Francesa, não permitia mulheres.


Julia não foi a única a ser apagada da literatura brasileira. Inúmeras outras mulheres que se destacaram no século XIX e início do século XX como escritoras, poetas, jornalistas, educadoras de grande prestígio e importância política em todo o país tiveram seus nomes e suas obras esquecidos. Só para citar algumas delas: as gaúchas Candida Fortes Brandão, Andradina de Oliveira, Delia (pseudônimo de Maria Benedicta Bormann), Maria Clara da Cunha Santos; a cearense Francisca Clotilde; a baiana Ignez Sabino; a potiguar Nisia Floresta; a piauiense Amelia de Freitas Bevilaqua; a maranhense Maria Firmina dos Reis; a paraibana Josephina Alvares de Azevedo; as cariocas Albertina Berta, Carmem Dolores (pseudônimo de Emilia Bandeira de Melo) e sua filha Chrysanthème (Maria Cecília Bandeira de Melo Vasconcelos).




Quando dizemos que elas foram apagadas da nossa literatura, não é “força de expressão” — é uma constatação real, comprovada pela dificuldade de encontrar os originais de suas obras tanto em bibliotecas brasileiras quanto em sebos. Algumas estão disponíveis apenas em bibliotecas no exterior.


De Julia Lopes de Almeida já conseguimos encontrar todos os originais, o que nos permitiu reeditar 17 de suas obras e continuar trabalhando para garantir que todas voltem a circular. Com a publicação dos romances “A Isca”, “A Intrusa” e “A Falência”, a Janela Amarela completa em seu catálogo todos os romances publicados pela autora. Até onde sabemos, nenhuma outra editora brasileira concentra tantos títulos da Julia em seu acervo.


Para assegurar que os livros estejam sempre disponíveis, optamos pela impressão sob demanda dos livros físicos e também por e-books, em um modelo de negócio que permite o acesso às obras em qualquer parte do Brasil e do exterior.


Alguns clubes de leitura já “descobriram” Julia. Alguns de seus livros já são usados como leitura obrigatória em vestibulares, mas isso é muito pouco para uma escritora como ela. Sua obra pode — e deve — ser consumida pelo público que gosta de ler romances e contos. É para que qualquer leitor possa ter acesso a essas autoras que editamos os livros. Além disso, incluímos notas de rodapé para as palavras e expressões fora de uso ou em língua estrangeira, para que até mesmo o leitor pouco habituado à escrita de época mantenha o interesse no livro.





Ana Maria Leite Barbosa é jornalista com mais de 50 anos de experiência, Carol Engel é formada em marketing e há nove anos atua no mercado editorial. Juntas, mãe e filha, criaram a Janela Amarela Editora e trabalham no resgate e reedição de obras esquecidas da literatura brasileira. A editora conta hoje com o maior catálogo de obras de Julia Lopes de Almeida publicado no país.


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