Nunca mais eu digo: eu te amo


por  Luana Braga__

O sexo me rasgou foi no por-entre:
mordidas indecentes;
gozos emolientes;
línguas… e pequenas maldades
-- tu me quis tua enquanto eu lia pra ti:
comia a minha poesia.


Medo.
Pedi pra deixar a porta aberta:
caso precisasse sair dali.
Duro.
Tentou me segurar no banheiro.
Cárcere.
Empunhei minha bandeira. Não me toque.
Tenho em mim o número da lei: de cabeça.
Exaspero.
Bateu a porta, bateu no peito. E gritou.
E me perguntou o que fui fazer ali.


Teve ânsia:
por ser agora, por ser dessa vez;
teve sofreguidão:
pra ser já, pra ser logo, mas devagar.
Mas amor:
não teve.
Teve o amor:
que nunca foi nosso.
Teve o nosso:
que nunca foi amor.



Desde que aprendi a ler e a escrever, nunca mais parei. Como se escrever fosse respirar. Ou estar. Ou me colocar. Ou me expressar. Ou me posicionar.
Como se escrever fosse ser o que sou. Como se escrever fosse ser para que outros pudessem ver quem acho que sou. Como se fosse ser o que acho que sou para que outros pudessem também ser o que acham que são. Como se só pudesse ser quem sou quando outros também pudessem ser quem são. Como se fosse necessário ser quem sou enquanto outros são quem são. Como se fosse importante sermos quem somos. E sermos sãos.

Aos nove anos de idade, ganhei minha primeira câmera fotográfica. Era uma Kodak instantânea, antiga e usada. E já veio com o filme encaixado. Aprendi a usá-la rapidamente. Quando empurrado para baixo, um pino na lateral acionava o obturador.

E a minha primeira fotografia que fiz foi a de uma amiga. Ela estava de pé, ao lado da piscina. Estávamos no clube e, dias depois, a imagem revelou-se torta e desfocada. Havia vazamentos de luz pelos quais sempre tive um carinho especial. Como se vazamentos de luz acontecessem para serem especiais. Como se houvesse algo especial na luz.

Então, quando recebi o convite dos amigos do Coletivo Vestigium Art Gallery para participar de uma próxima exposição coletiva, paralisei-me. Senti-me imensamente honrada; e aceitei. E só depois fui pensar no trabalho que teria. A abertura estava programada para o dia 17 de maio de 2019, uma sexta-feira, às 19h. Eu tinha pouco mais de um mês. Mas quando esclareceram-me o tema, relaxei. Soube que o teria. Só precisava organizar meu material. Como se isso fosse pouco.

A II Mostra Donas de Si, para a qual fui convidada, homenageou Maria da Penha, cearense emblemática, que chegou a ser indicada ao Prêmio Nobel da Paz, e é símbolo de luta por uma vida livre de violência. A Mostra teve, assim, as mulheres e suas lutas como tema. O material aqui apresentado, "Nunca mais eu digo: eu te amo" segue o espectro proposto no tema da Mostra.

A mulher apresentada neste material expõe-se ao mundo de maneira assertiva. De maneira real. E com desejos palpáveis: estudar, trabalhar, rir, gozar, apaixonar-se, amar. E sofrer. Sofrer a vida. Sofrer frustrações genuínas, também. E, infelizmente, tão comuns.

Para compor o presente trabalho, passei dias encaixando fotos e palavras. Revendo poemas. Tentando entender as cores que me vinham. As luzes que me tinham. Deixei o som das palavras se achegarem. Deixei os sons me pedirem pelas palavras que devia compor. Deixei os sons, as luzes e as palavras me levarem.

Como se escrever fosse um ato de submissão à arte. Como se fosse um ato de me deixar ser possuída por um espírito da arte. Como se, sendo possuída, o espírito da arte pudesse fazer o que tem de ser feito. Como se eu fosse um repositório de intuições artísticas de um espírito maior. O da arte. Como se houvesse pessoas-repositório de atos de espíritos. Como se houvesse espíritos. Como se houvesse arte. Como se houvesse algo maior.



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Luana Braga é escritora, fotógrafa, ilustradora e compositora. Autora dos vídeos-poema “Carnaval em mim”, "Saudade", “Viagens Insólitas” e “Simples quando”, todos disponíveis no seu canal no YouTube (https://www.youtube.com/user/insolitaviagem/). Também, fez músicas em parceria com Joyce Custódio, Jord Guedes, Guilherme Cunha, Charles Wellington e Pedro Falcão. A cada quinze dias produz, em Fortaleza, o sarau itinerante Casa de Poesia junto às produtoras e poetisas Carolina Capasso e Marta Pinheiro.
Às quartas-feiras, publica seus poemas no blog literário ‘Leituras da Bel’, do Jornal O Povo (http://blogs.opovo.com.br/leiturasdabel/). Ainda, teve poemas seus publicados na Revista Maracajá, suplemento literário do Jornal O Povo.Em maio de 2019, teve seu material literário-fotográfico "Nunca mais eu digo: eu te amo" exposto na Galeria de Arte do IBEU.

Atualmente, o mesmo material encontra-se disponível para visitação, na Livraria Lamarca, na Av. da Universidade, 2475, Benfica, Fortaleza, até o final de Agosto. Ainda, este trabalho encontra-se disponível para download, em PDF, no link https://is.gd/JAXs1A; e para leitura online no Issuu pelo link https://is.gd/NuncaMais. É de sua autoria a galeria @insolitaviagem, no Instagram (https://www.instagram.com/insolitaviagem/).