Malu Garcia transforma crônicas de viagem em manifesto pela liberdade feminina


 Livro de estreia da advogada mistura relatos afetivos, humor e descobertas culturais vividas em onze visitas à ilha caribenha

Com um passaporte carimbado como “Turista Controlada”, a advogada Malu Garcia estreia na literatura com Indomável — As descobertas de uma brasileira em Cuba (Editora Labrador, 180 págs.), um livro que reúne 28 crônicas sobre suas viagens à ilha caribenha. Entre o real e o fantástico, a obra cruza fronteiras geográficas e emocionais para narrar não apenas os encontros com a cultura cubana, mas também um percurso interior de autoconhecimento e afirmação da liberdade feminina.

Malu Olézia Garcia Leal Rodrigues de Arruda nasceu em Mariluz, interior do Paraná, em 1973, e vive há mais de três décadas em Itu (SP). Formada em Direito pela FADITU, com especialização em Tribunal do Júri, ela também tem uma trajetória na comunicação: foi radialista, repórter, apresentadora do programa Direito na TV e diretora regional da revista Aqui!.

Essa intimidade com a linguagem abriu caminho para a escrita literária. Indomável, como ela define, é resultado de um processo de cura: “A escrita organiza os sentimentos. Depois de escrever as minhas vivências fora da minha casa, eu organizo melhor a minha própria casa”, afirma. “Depois de viajar para um lugar com a cultura de Cuba, eu valorizo o lugar onde vivo e as minhas amizades de lá e daqui.

Mas transformar vivências em literatura exigiu mais do que talento. Exigiu coragem. “É algo que se faz absolutamente sozinha, com muitas dúvidas e nenhuma segurança de que o que está fazendo seja razoavelmente bom”, confidencia Malu. “Eu apenas confiava que as minhas vivências eram únicas e eu estava contando histórias que vivi que muita gente gostaria de ter vivido — nem que fosse só pelas risadas.”

Dividido em duas partes, o livro narra nove de suas onze visitas a Cuba. A primeira parte reúne histórias anteriores à pandemia, marcadas pelo encantamento inicial com a ilha e pelas memórias de infância que alimentaram o desejo de conhecê-la. Já a segunda revela os desafios de uma viagem realizada durante a pandemia da Covid-19, quando Malu acabou ficando presa no país, sem previsão de retorno.

Além das aventuras e reflexões, a obra se destaca pelo olhar afetuoso e atento ao cotidiano cubano. “Esse gênero literário [a crônica] traz a oportunidade de acessar o cotidiano e dar importância para isso”, afirma Malu. “Porque é no cotidiano que a vida acontece.

Ao longo do livro, a autora compartilha histórias inusitadas, como o encontro com a ex-mulher cubana do cineasta Glauber Rocha ou com a mãe do escritor Leonardo Padura. Essas passagens reforçam a vocação de Indomável para revelar o que está além dos cartões-postais: vielas, mercados, casas, calçadas e vínculos humanos, sempre narrados com humor, sensibilidade e uma dose de fantasia.

Mais do que um diário de bordo, Indomável é também um manifesto pela liberdade das mulheres que viajam sozinhas. “Viajar sozinha é a maior expressão de liberdade que uma mulher pode experimentar”, defende Malu. “Não ter que convencer ninguém que está com fome, que não quer sair à noite, que quer andar um dia inteiro de ônibus ou ficar um dia inteiro dentro de um museu; comprar o que quiser, sem julgamentos, e, sobretudo, estar consigo mesma para descobrir que é a sua própria melhor companhia.”

Essa travessia é tanto física quanto simbólica. No prefácio, o escritor Léo Tavares resume: “Por abordar muitos contrastes, a autora revela duas viagens: uma territorial, outra identitária. Ao fim, temos uma narradora diferente, e é bonito acompanhar essa delicada transformação.”

Malu Garcia convida o leitor a embarcar com ela não somente pelas ruas de Havana, mas por dentro de si. Indomável é, ao mesmo tempo, um mapa afetivo de Cuba e um espelho das possibilidades de liberdade feminina.

Confira um trecho do livro (pág. 57) : 


" (...) o Malecón é muito mais do que um ponto limítrofe do seu país ou, em especial, uma bela borda para sua venerada Havana. Muitas cidades no mundo têm seu paredão que impõe limite ao mar. Se, para quem é de fora da Ilha, o Malecón parece ser só mais um cartão-postal, para o cubano é o lugar do seu mais profundo e próprio sentimento de pertencimento. É uma sensação de que a própria existência tem seu lugar de conforto. É comum o turista mais desavisado, meio sem percepção das coisas verdadeiramente grandiosas de um lugar (como eu), demorar um pouco para perceber que aquela “serpente pétrea”, como descreve o Padura, é mais, muito mais do que o gigantesco muro que barra o mar. O Malecón faz parte da identidade do cubano. E, sim, me dei conta: estava na cena da folhinha do mês de fevereiro da minha infância. A calçada de cerca de cinco metros de largura, margeando as seis pistas da avenida, e o muro gigante visto de frente. Por trás dele, o inconfundível pôr do sol alaranjado que desejei com tanta força poder um dia ver ao vivo. E nós estávamos ali. Aquela brisa confirmava: eu consegui". 



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