Mostrando postagens com marcador João Gomes. Mostrar todas as postagens
Mostrando postagens com marcador João Gomes. Mostrar todas as postagens

por João Gomes__

 

por Taciana Oliveira__

Plaquete com três poemas de João Gomes. Disponível para download. Clica aqui.


Por Mirada__



por João Gomes__

Fotografia; © Mauro Pimentel

por João Gomes__


Acácio Júnior
por João Gomes__


Fonte; Cecom UNICAMP


O coronavírus é um assunto que não se esgota porque é uma grande ameaça a tudo e a todos. Anunciado no último dia do ano passado num alerta da OMS após notificação de autoridades chinesas a respeito de casos de uma misteriosa pneumonia na cidade de Wuhan, infelizmente sendo impossível de firmar aqui um número de infectados e óbitos pela grande tomada da pandemia, pois já estaríamos desatualizados, segue vitimando descontroladamente. Apesar da tristeza e medo gerais, reproduzo a sugestão que encontrei num post no Facebook: “Alguém poderia desinstalar 2020 e instalar de novo? Essa versão veio com vírus.” Um vírus que entrou chutando governos de todo o mundo, fazendo um estrago já comparado ao da Peste Negra e das duas Grandes Guerras. Chegado a poucas semanas nas Américas, o pior ainda está por vir.

Nós brasileiros tivemos a chance que alguns países não tiveram de estabelecer o isolamento social o quanto antes para conter a disseminação do vírus, apesar de termos tido o Carnaval. Na Itália, por exemplo, no dia 23 de fevereiro, 45 mil torcedores foram a Milão assistir a uma partida de futebol pela Liga dos Campeões. Considerada como uma bomba biológica, Milão não parou, seguiu normal quando havia já 650 infectados. Um mês depois o prefeito da cidade reconheceu que errou em não ter aderido à quarentena horizontal (total e não apenas dos grupos de risco) quando hoje já passam de 1000 mortos no país. Não pretendo buscar culpados, mas a normalidade não pode insurgir quando o mundo todo segue as recomendações da OMS, que é a de ficar em casa.

Por aqui os números são baixos, mas sabemos que estamos no começo da pandemia. Justamente por isso e o que já era de se esperar, o discurso de políticos que não entendem nada de nada já vem deixando confusa a população, e a imprensa vem cada vez mais se defendendo e fazendo seu papel, o de informar. Não podemos totalmente chamar de ignorante o presidente, pois ele defende em primeiro lugar suas bases eleitorais. Quando ele desobedece as recomendações de quarentena, indo para manifestações que aglomeram seguidores, para firmar-se ainda mais como mito, ao lado de eleitores que dão suas vidas e de suas famílias pelo extermínio em massa, é tão óbvio que seja ele e não outro. Um governo que nunca fez pelo país não poderia ser diferente num momento de tamanha preocupação mundial.




Leio exaustivamente sobre o coronavírus, desde antes do momento em que se anunciava os vencedores das escolas de samba, e a vontade que sinto é só de chorar. Além da de poder ficar mais em casa, é claro, se eu pudesse e não precisasse fazer entregas de bicicleta por aplicativos para sobreviver. Não sinto vergonha por estar no quadro de pessoas em vulnerabilidade econômica, mas não é demais dizer que muitas outras classes trabalhadoras, como a dos artistas e do comércio também estão. O socorro emergencial é o mínimo que o Governo Federal pode fazer pela economia do país, não fossem os impostos que devolverão cada centavo do socorro que muitos acham que é bondade aos mais vulneráveis.

Os grandes empresários do país já cobram do presidente para reabertura do comércio, prometendo fechar vagas de emprego caso o isolamento não seja suspenso até meados de abril. Não é demais lembrar que o surto por aqui começará justamente neste mês. Teatros sem abrir ao público, salas de cinemas com lançamentos adiados, gravações de novelas interrompidas, escolas fechadas porque as crianças são as mais assintomáticas. Como a solução para os não especialistas em nada é sempre sacrificar a população em nome de uma economia que já não crescia mesmo sem a epidemia, a normalidade por meio sobretudo da reabertura do comércio assusta ainda mais a todos. Seria a quarentena vertical, não total, quando sabemos que pessoas de todas as idades podem vir a falecer por complicações da Covid-19.

Sendo um assunto inesgotável, que sacrifica hábitos, como o de poder mostrar afeto por não ser permitido nenhum tipo de contato, impõe recomendações técnicas contestadas por leigos. É realmente uma crise, e sem precedentes. Na etimologia latina crise significa momento de mudança súbita, enquanto na grega: ação ou faculdade de distinguir, decisão, momento difícil. Então não seria exagero, ou fantasia, chamarmos de crise do coronavírus, não considerando como gripezinha, ou algo que passa sem complicações. Você pode até não ter graves sintomas, mas contaminado pode levar a vida de pessoas ao fim, o que seria tão grave como sair dando disparos por aí.

O desgoverno atual defende o armamento, logo o extermínio da população por um vírus contagioso seria mais eficaz que qualquer tiro à queima roupa. Por isso o pior não se conta, tudo é levado com irresponsabilidade e o Estado não protege como deveria. Ou ao menos o Federal não faz isso, enquanto o regionais ainda tentam num diálogo com seus municípios. O mundo não está questionando quanto tempo será preciso ficar em quarentena, mas por aqui pessoas como a ministra da Cultura, atriz que ao aceitar o cargo afirmou estar se casando com o governo, não poderia fazer diferente. Em seu perfil do Instagram postou e já deletou um texto criticando a quarentena, com uma foto sua de guardanapo no rosto, ironizando a utilização de máscaras por pessoas com sintomas.

Você quer ficar em casa? Tá OK!”, como se fosse um pedido ou forma de agradar seu novo patrão. Em resumo, seu texto defende a ideia de que, para ficarmos em casa, alguém tem que estar na farmácia, no posto de gasolina e na padaria. Realmente, há certa comodidade, eu por exemplo não a ofereço completamente aos clientes me recusando a subir até seus andares quando entrego pedidos de restaurantes. Mas o argumento do seu texto não é o de ter compaixão de quem está trabalhando, é o interesse econômico de quem investiu na bolsa, de quem apoia a exploração em massa. Da forma criativa como foi escrito, com uma lista quase interminável, perdendo somente para o silêncio e a falta de bom senso ao confundir a população quando a solução já está estabelecida em tentativa da segurança de todos.



Para não terminar totalmente com uma energia ruim como o desserviço à humanidade de pessoas assim, trago aqui o álbum “Planeta Fome”, de Elza Soares, que se for escutado nessa quarentena pode fortalecer as paredes da mente e trazer luz aos dias de dor em que estamos vivendo. Na canção “Comportamento geral”, ouvimos: Você deve rezar pelo bem do patrão / E esquecer que está desempregado. Em “Não tá mais de graça”, temos a resposta à sua canção “A carne”: A carne mais barata do mercado não 'tá mais de graça / O que não valia nada agora vale uma tonelada / A carne mais barata do mercado não 'tá mais de graça / Não tem bala perdida, tem seu nome, é bala autografada. “País do sonho” e “Pequena memória de um tempo sem memória” são de um otimismo capaz de expandir a luta por um mundo melhor. E mais, a maioria destas letras aqui citadas são de Gonzaguinha, algumas da época da Ditadura. 

Ouçam Elza, não escutem declarações fascistas, apenas as recomendações médicas, como a do Presidente da Academia Nacional de Medicina, Dr. Rubens Belfort: “Saiba que o vírus se espalha como areia fina num vento forte para todos os lados. Portanto, fiquem em casa.” E com uma comparação que achei de uma eficiência imensa: “Não dá pra escapar de mil bolas de futebol todas elas vindo na sua direção. Você que tem de sair de campo agora, para mais tarde ganhar o jogo.”, completa. Não é o fim, há muita gente lutando ainda por um mundo melhor, mas pra isso cada um precisa fazer a sua parte e ser ainda mais responsável por si e por todos. 



P.S.: E aos fascistas bolsonaristas, saibam que quarentena não é achismo. Vocês odeiam a mídia e consideram tudo como politicagem porque suas passeatas não atravessam sequer a esquina. 
_____________________________________




João Gomes (Recife, 1996) é poeta, escritor, editor criador da revista de literatura e publicadora Vida Secreta. Participou de antologias impressas e digitais, e mantém no prelo seu livro de poesia. 




Grafite; Banksy


por João Gomes__



por João Gomes__
Charge da exposição "Independência em Risco" 
por João Gomes__

Enquanto o ódio deveria ser combatido, por meio da educação, ele vem à tona por perseguição às minorias. Não quero falar a notícia, só cravar minha ira sobre Dorias, Crivellas e toda trupe treinada ao absurdo tão sem ordem e progresso. Mas só relembro que um recolheu apostilas do ensino público de São Paulo por uma página tratar de identidade de gênero e o outro fez perseguição às obras de temática LGBTI comercializadas na Bienal do Rio de Janeiro. O ódio disfarçado de política pública quando desperta a exclusão guiado na violência ao próximo. O que excita os fascistas é mesmo uma arma na mão. E livro é uma arma, ferramenta das mais poderosas. Mais amor em SP e RJ e em todo o Brasil é pedir o mínimo diante desses vendavais.




por Rebeca Gadelha__

Link para download da edição completa do Manifesto: Manifesto Balbúrdia Poética: 80 tiros




por João Gomes__

O nosso entrevistado  do  mês é o poeta, músico e produtor cultural David Biriguy.


David Biriguy.
Seu livro Submarino fala sobretudo de amar ou ter sido amado por alguém. Para você, a poesia vem com alguma facilidade, o amor é mais difícil e o que seria um poema pronto? A citar um poema desse seu livro, “Quantas interrogações integram o teu silêncio?”.

A temática do Submarino é o amor, mas o sentimento que se expõe ao longo do livro é o arrependimento. É uma queda. Um declínio. Um mergulho dentro de si para se reconstruir depois da queda.

Acredito que há fluxos de escrita. Não diria que a poesia vem com facilidade, mas que tenho facilidade para escrever e isso facilita a escrita dos poemas. O amor é um lugar comum na literatura, talvez isso o torne mais difícil de abordar de uma forma diferente do que já se tem. O Submarino foi nascendo despretensiosamente. Eu estava em um processo de desapego e estava escrevendo. Quando me dei conta os poemas estavam todos ali. Fiz uma seleção dos melhores textos e reuni neste livro.

por João Gomes___

Obra de Leonilson
Nunca me senti tão lembrado, a contragosto dos héteros, por ser o que sou. Junho é o mês LGBTQ, essa sigla que só cresce, arrastando multidões e adere quase tudo pela diversidade em si. Nunca também fui à Paradas, metrópoles, saunas e cinemas pornô. Mas não é por isso que desejo lembrar nossas conquistas, mas há quem ache que uma Parada da Diversidade do Orgulho LGBTQ é apenas um Carnaval fora de época, um golden shower em becos ou mesmo que cirurgia de vasectomia é a causa de ser homossexual.

Não haveria necessidade de uma sigla se as pessoas não gostassem tanto do rótulo, do estar identificado e agrupado para lutar por direitos óbvios. Com a modernidade, depois da Revolução Sexual, não deveríamos estar batendo nisso. Mas como o óbvio é ululante, como sugere Nelson Rodrigues, persistimos em garantir nosso espaço a um preço caro às vezes. Médicos aclamados por sua atuação, como Drauzio Varella, pesquisador do tema HIV/Aids, atenta para a questão biológica citando inclusive a homossexualidade entre animais. Até o Papa Francisco pede que tudo isso seja esclarecido no julgamento final e que não cabe a ninguém julgar no mesmo plano, todos merecem respeito. Mas há quem acuse que toda a cúria é homossexual, as freiras são bissexuais ou lésbicas e tudo é coberto pela manta divina.

Custa pensar como seria se não houvesse esse embate, essa troca de forças, de olhares, de repressões e ataques homofóbicos. É um salve-se quem puder, só deixe que seus amigos saibam, não dê a entender nada para não morrer. Mas tudo é uma questão cultural, do modo de agir e pensar, e biológica do modo natural de desejar. Negar a si mesmo é algo religioso, por isso há os curiosos, os ativos na homossexualidade e negadores da passividade, donos de uma meta corporativa de homofobia que os encubra. Há um pensamento bem verdadeiro que se encaixa a isso: você pode ser gay e não ser homossexual, e homossexual sem ser gay.


por João Gomes__


Wilson Freire


por João Gomes__


No meu aniversário passado, recebi de presente um livro de uma amiga tão apaixonada por livros quanto eu. Na dedicatória, Ecilda aproveitou o título de uma só palavra para escrever: “Querido João, espero que este livro te tire o Sono e te leve para o mundo dos sonhos.” Após uma afetuosa visita sua, mexendo nos livros da estante da sala, chegamos no volume de capa dura, de cor azul noturno, publicado pela Alfaguara à altura da qualidade literária do autor com tradução do japonês de Lica Hashimoto e ilustrações de Kat Menschik. Perdemos muito tempo não lendo ao menos os livros que ganhamos de presente, uma vez que os que compramos passa pelo desejo de ter às vezes muito maior do que o de ler, já que não precisamos comentar com alguém o que achamos.

Então li Sono, de Haruki Murakami, obra que fica entre o conto e a novela pela sua concisão característica do gênero e tão genial na prosa limpa do autor. Em resumo, podemos dizer que a protagonista cujo nome não sabemos não dorme há dezessete dias. “É o décimo sétimo dia em que não consigo dormir.” Quando passamos dessa oração em um parágrafo de abertura, iniciamos o desespero de uma mulher que perdeu a capacidade de dormir. E é com muita empatia já de cara e nenhuma cura, que passamos a viver a rotina tão monótona da protagonista junto com seu marido, um dentista dono de uma clínica próximo ao edifício em que moram, e seu filho pequeno a quem sempre se despede da mesma maneira ao levá-lo à escola. Falando assim, mais parece que o enredo é um Japão que já conhecemos, todo certinho, que não fossem os tremores de terra nada tira do lugar.

Mas não, a prosa de Murakami não é para fazer dormir. Até poderia ler um capítulo de cada antes mesmo de me recolher no escuro do quarto. Mas não, é impossível ficar apenas com uma fatia, como a banda de um Rivotril, e deixar mais do que está sozinha a narradora que nos confessa seu sofrimento sem vitimismo algum. Então ela decide não contar nada para ninguém, tomando proveito que o sono do marido e do filho é tão pesado quanto o de uma pedra. E quando falamos aqui em 17 dias sem dormir, é 17 sem dias sem dormir mesmo, sem pregar os olhos um segundo sequer, sem soneca no meio da tarde, ou o trocar o dia pela noite tão comum entre os insones. Mas pode também ter sido um surto psicótico, fazendo-a perder a contagem exata, podendo também ter sido algumas horas. Falando assim, é assombroso, kafkiano, como se tivesse se transformado num outro tipo de ser, uma barata, ou alguém que vegeta ou um mineral.

À medida que a narradora vai avançando, podemos pensar que o fato de não dormir foi apenas o mote para que ela compartilhe sua experiência, como fazem os comediantes em algum stand up temático. Não que seja humorada, ela é a típica estudante de Letras que desde criança teve uma vida voltada para a leitura, a ponto de gastar toda a mesada com livros. Isso me fez lembrar o público leitor de Murakami, que é mesmo um genial best-seller, e não somente por essas identificações banais, mas pela abordagem diante da vida num realismo repleto de cenas estranhas. Assim como eu não resenharia este livro da forma comum como é feito por autoras de blogs que me maravilho lendo após a leitura do livro pesquisado, também Murakami não se limita a nenhum tipo de clichê. Como costuma acontecer em grandes obras de arte, é possível nos ver dentro da história, fosse também a nossa sendo nós feitos da mesma essência, quer aqui no Brasil ou no Japão. Mas falava que a protagonista é formada em letras, com monografia de conclusão sobre Katherine Mansfield, escritora neozelandesa de contos, e que me fez pensar o quanto a grande literatura ultrapassa qualquer língua e país.

Vale ressaltar também que este não foi o primeiro livro do Murakami que li. Comecei com Após o anoitecer, e foi a certidão de cartório da emissão da carteirinha de fã pelo Haruki Murakami. Ele é daqueles autores que nos dá o medo de terminar a vida sem nunca ter lido uma obra dele, e é daqueles que basta uma obra que o canto da sereia nos leva para dentro de suas páginas. É o que acontece em Sono, e é o que acontece em qualquer livro seu, todos publicados aqui no Brasil pela Alfaguara. Quando descobri que o magnífico é triatleta, pronto, enlouqueci de paixão, tendo inclusive que pedir desculpa a sua conje, ops, cônjuge. Em meu interesse gratuito e reflexivo pelo autor, li o seu Do que eu falo quando eu falo de corrida e Romancista como vocação. Esses dois de não ficção me permitiram compreender como sua obra se realiza, como pode alcançar tanta gente, de qualquer idade, mas sobretudo os jovens. E aqui não sei se é fácil ou difícil, em tempos como os de hoje, tumultuados de outras opções de entretenimento, conseguir segurar um leitor em suas páginas.

Minha interrogação existencial paira no porquê demorei tanto para ler este livro tão curto, com ilustrações tão conectadas com o desenrolar da história. Quando o desembrulhei lembro que não passei da página da dedicatória, vendo no miolo apenas que a diagramação era muito agradável, a fonte graúda como que para ser lida por leitores que usam mas ali sem a necessidade de óculos. Sabia que era do Haruki, o mesmo por quem já tinha uma paixão revelada publicamente, e por isso o presente. Apesar do título ser Sono, não era sobre dormir, ou estar de olhos fechados que o livro tratava. Ao mesmo tempo, pensei: nossa, o Murakami querido escreveu livro infantojuvenil também, que esperto, não deixa passar ninguém… e desprezei por isso, guardando na estante por quase um ano. Dizer que tudo tem sua hora é clichê, mas dizer que no momento certo seremos arrebatados pelo prazer de uma obra genial, isso pode acontecer a qualquer momento da vida.

E é isso o que acontece em Sono, quando a protagonista percebe que não consegue dormir. Ela começa a ler por horas a fio, sobretudo nas madrugadas, mas também à tarde, no sofá da sala, depois que o marido volta pro consultório ou quando ela retorna da natação. Num momento acontece um estalo em sua mente atordoada, e se questiona quando foi que leu pela última vez um livro e para onde foi sua paixão pela leitura. “Mas, naquela noite, consegui me concentrar na leitura de Anna Karenina. Consegui avançar as páginas totalmente absorta na leitura, sem me distrair.” Acompanhada de uma garrafa de conhaque, de barra de chocolate ao leite e cookies, lia Tostói com a paciência de só encontrar a heroína da história, Anna, no capítulo 18, assim como esperamos pela cama, pelo descansar da protagonista numa referência direta ao título. “Ao deixar de dormir, ampliei o meu ser. O importante é o poder da concentração. Viver e não conseguir se concentrar é o mesmo que estar de olhos abertos sem poder enxergar”.

Sono, para quem puder ler, é um achado da literatura contemporânea e, por meio da edição brasileira, uma obra de arte digna de triunfal entrada no mundo dos que sonham acordados. E falando em literatura contemporânea, em concisão, o guatemalteco Augusto Monterroso é apontado como autor do mais famoso miniconto, escrito com apenas trinta e sete letras: “Quando acordou o dinossauro ainda estava lá.” Nunca mais fico sem ler aquilo que pode me modificar, aquilo que, mesmo dormindo noite após noite, vai continuar como uma tristeza necessária e pregada em sonhos ou pesadelos, a depender da experiência e maneira de observar a si mesmo e os que estão a nosso redor. “Será que eu poderia me considerar um exemplar único, uma precursora da espécie humana, que deu um salto na cadeia evolutiva? Uma mulher que não dorme. Uma consciência expandida.”


___________________________


Haruki Murakami nasceu em Kyoto, no Japão, em janeiro de 1949. É considerado um dos autores mais importantes da atual literatura japonesa. Sua obra foi traduzida para 42 idiomas e recebeu importantes prêmios, como o Yomiuri e o Franz Kafka.









________________________________________________





João Gomes (Recife, 1996) é poeta, escritor, editor criador da revista de literatura e publicadora Vida Secreta. Participou de antologias impressas e digitais, e mantém no prelo seu livro de poesia. 


por João Gomes__

          
Fotografia de Evandro Teixeira

por João Gomes__

Líria Porto (Araxá/MG), a quem entrevistei para esta janela, me concedeu a oportunidade de editar mais um trabalho seu a partir de duas seletas de poemas. Mesclando de um e outro, cheguei ao volume em formato de e-book A sede do rio não cede publicado para ser lido gratuitamente por Vida Secreta Publicações(http://vidasecreta.weebly.com). Líria se chega para estar no mesmo catálogo que participam Adriane Garcia (MG), Gerusa Leal (PE), Wilson Freire (PE) e Marcelino Freire (SP). 

Com versos contundentes, diz muito em poucas palavras, conseguindo ora ser trágica, ora ser humorada, dando novos sentidos ao que acreditamos estar fechado em si mesmo. É uma poesia que penetra como a água em qualquer superfície, nem que seja para deixar úmido a matéria dura ou sugadora de afeto, encantamento e deleite. A sede do rio não cede, título que carrega sonoridade, ritmo e muito o que se dizer sobre a poesia que produzimos no deserto catedrático que atravessamos. 

torrão

o rio caminha caminha
alcança o destino mas fica onde estava

um rio não larga as origens
embora se perca nas águas salgadas

a sede do rio não cede

Sua poesia é um aprendizado imagético, sintático, rico em todos os sentidos, quando clareza e concisão vão de mãos dadas num amor pela língua portuguesa capaz de emocionar e se fazer entender por qualquer leitor. Líria é, como no seu nome, o porto onde se entrega poesia num embarque e desembarque, porque ela sabe e escreve: “o poeta tem ideia fixa”. 

E essa sua e nossa sede de rio nunca cederá à censura, à perseguição de liberdades individuais ou mesmo festejo do que matou e nunca se responsabilizou pelo que se fez. Que o poeta e o leitor tenha ideia fixa, mas que seja naquilo que humaniza e possibilite a vida em sua beleza mais real. Porque só a poesia pode humanizar o homem, só a poesia pode humanizar o homem, só a poesia… é e sempre será o meu mantra no rio de ressignificados onde tento nado/nada. 



por João Gomes__


Líria, como é ser poeta depois dos 70? E a idade contribui ou atrapalha ser escritor num país que dá tão pouca importância ao trabalho artístico? “a morte não chega / a vida não basta” é o que lemos no seu poema limitações.


por João Gomes_____

Quem passeia pela literatura feita por escritores independentes sem dúvida sabe o que é um zine. Pode ser e ter qualquer formato, guardar textos de um autor apenas, de vários, ilustrações, o que se desejar sendo autoral ou editorial. Pra ser zine tem que ser impresso, sim. Mas o projeto gráfico pode também ser disponibilizado na rede, o pdf pode ser encaminhado por e-mail e etc. Venho aqui falar então do zine Bellzebuuu, do estado de Minas Gerais, que em seu primeiro número em agosto de 2017 circulou por Belo Horizonte após a curadoria e realização de Adriane Garcia e Sérgio Fantini. Finalzinho do ano passado, fui convidado por Adriane para transformar o zine numa publicação de Vida Secreta, onde sou editor. Da minha leitura do material fiz a editoração eletrônica que segue. É para ser lido de uma vez, numa sentada. A temática proposta aos autores paira sobre como a religião pode corromper o estado laico com seus retrocessos e doutrinas.