Hora Antes de Dormir - por Alessandro Caldeira

por Alessandro Caldeira___

Durante toda a minha juventude brinquei só. Fingi ter amigos, amigos da espécie mais rara que só criança consegue presenciar: os imaginários. No entanto, a presença deles nunca foi capaz de sanar a minha infelicidade. Depois de horas brincando, até eles voltavam para a casa e, assim, eu voltava a ficar só. Desde então, descobri que a solidão era a casa onde eu morava e por isso que ninguém sobrevive quando peço para entrar.

Me é estranho que a infância ainda me seja um desejo porque não lembro muito bem dela. Mesmo tendo 15 anos, a minha infância é um passado distante. Mas quando perguntam meu nome, eu respondo: Rafael, mas na infância eu sei que só atendia às vozes do vazio que se aproximava e me perguntava: você tem nome, garoto? E eu respondia, com os olhos assustados, só que cheios de esperança dessa pessoa desconhecida que habita no escuro dos meus dias ser meu novo amigo: tenho sim! Me chamo solidão. 

Hoje, no auge da minha pré-adolescência, onde a pele não queima no sol e nem enruga na chuva, portanto, com boa saúde, não escapo da minha insanidade que habita em mim constantemente e dos meus pensamentos  que me tornam criança novamente, como diria Graciliano, eu misturo coisas atuais a coisas antigas.

É por isso que muitos me pegam de surpresa por lugares que nem são mais meus ou que se quer existiram, e numa atitude desesperadora e impaciente, me acudam, “acorda”. A minha vida é reduzida em alguém sempre me pedindo para eu acordar. Não as culpo. Elas querem que eu esteja perto, mas quando “acordo” nego que estivesse dormindo.

Estava sim!”, afirma de forma veemente e irritante a Lari. Ela é a minha amiga, sei que é; principalmente quando ela diz que “se preocupa com as coisas que eu tenho na cabeça”, mas quando ela fala desse jeito me sinto aborrecido porque tenho a impressão de que faço parte de uma espécie diferente. É legal ser diferente, porém só quando as pessoas percebem que você é diferente, caso contrário, você só fica sozinho.

Por que têm tanto medo da solidão, Rafa?”, a Lari me pergunta isso todos os dias (irritante!), mas eu minto que “não sei”, em parte porque eu quero que a Lari pare de ser chata e não se intrometa onde não é chamada, mas é porque, também, não quero entrar em assuntos que me doem.
Só que mais uma vez me ponho distraído e volto a viver coisas antigas...

Continua...


____________________________

Alessandro Caldeira é jornalista, santista e nas horas vagas prefere postergar qualquer um desses títulos para se dedicar à literatura, música e cinema.