Contra a Metafísica, José Londe

 por José Londe__


 

Simon Lee

 

Uma pessoa foi aprisionada em razão de uma acusação falsa feita pelos moralistas dentro de um buraco profundamente escuro e lá ficou por mais de sete décadas. Sendo que enquanto estava livre nunca havia visto algo que pudesse refletir seu rosto. Nem mesmo a água que outrora bebera, quando gozava de sua liberdade, a confrontara como um reflexo.  No poço não havia o que comer tampouco o que beber, de modo que para se alimentar ele tinha que subir até a entrada do buraco que era fechada quase que totalmente, isso porque por meio de uma pequeníssima fresta ele colocava a língua para fora a alcançar a água dentro de uma pequena concha que o carcereiro, proibido de chegar até a entrado do poço, e sob tal condição o prisioneiro jamais viu seu rosto, lhe trazia para matar dia a dia sua sede como também restos de comida. Ao que lhe trazia bebida e comida, como ordem, não era possível vê-lo. De longe, com água no recipiente côncavo ligado ao uma vara longa, à distância, executava o seu trabalho. Durante todo esse tempo dentro do buraco viveu.


Uma certa feita o carcereiro ao levar água e comida, acabou esquecendo um objeto que sempre esteve com ele, depois de ter dado ao prisioneiro o que lhe era necessário à sua vontade não de conservação, de sobrevivência, mas de poder, não era à toa que o cativo escalava as paredes escarpadas para se saciar mediante a minúscula brecha em vontade de poder, de querer crescer ante a monstruosa situação, de vencer sua oposição, numa luta dos contrários. O objeto deixado ali, caiu exatamente em cima da fresta, empurrado pelos fortes ventos áridos por todo o dia, da manhã à noite com o seu lado semelhante à água límpida e parada de frente para a entrada do poço, o que permitiu ao prisioneiro, de pronto, a se deparar com uma imagem que de antemão se assustou, mesmo que o objeto em seu tamanho diminuto tenha exibido ela toda distorcida, mas que o possibilitou ver uma figura humana.


Diante daquela silhueta, o prisioneiro acreditou estar ante uma outra pessoa que, desobedecendo à lei procurara lhe libertar e, até o dia seguinte, o cativo, pensando que estava com um homem livre, suplicava àquela imagem que o libertasse da prisão, então, chegou o carcereiro e o ouviu gritar para alguém que ele não via. Aproximando-se mais da entrada do poço pela primeira vez, viu o objeto sobre a fresta e notou que o prisioneiro em razão de não saber o que era falava com ele mesmo acreditando que se tratava de uma outra pessoa. Foi quando o carcereiro disse ao cativo:


— Estás a falar contigo mesmo homem — no que o prisioneiro lhe retrucou:


— Tu estás louco homem! Ele está comigo desde ontem, só não me diz nada — o carcereiro lhe disse:


— Tu nunca viste um espelho em tua vida miserável, mesmo quando estavas livre? — O prisioneiro respondeu:


— Do que tu falas? O que poderia ser o que tu chamas de espelho? Não vejo outra coisa a não ser um outro homem que poderia me libertar se me desse ouvido. O carcereiro disse:


— Tu vês a tua imagem e a ela reclamas ajuda.


O prisioneiro continuou relutando até que o carcereiro disse:


— Te mostrarei que estás só nesse buraco. Vou apanhar o espelho e verás que não há ninguém além de ti.


Quando o carcereiro apanhou o espelho, a imagem que até então estava ali sumiu, pois o que o prisioneiro via era tão somente ele.


Vendo que estava enganado, o prisioneiro, frente ao instante, percebeu que havia dado existência a uma ilusão, duplicado a vida, acreditando que a imagem externa o salvaria do poço, em outras palavras, que o ideal o tiraria do real, que o outro mundo o salvaria desse.


À satisfação do egoísmo do querer amar, o querer amar a si mesmo é satisfação também, os afetos e, em tal monta o amor, põem em marcha uma luta para se satisfazerem, no caso do amor a si mesmo sua satisfação é encerrar-se em si, por ora, porquanto a luta é contínua — os afetos criam ideais, a metafísica.






 


José Londe da Silva, nascido em 1974 no município de Canapi, em Alagoas. Sou prof° de história do ensino fundamental maior do município de Delmiro Gouveia, estado de Alagoas. Sou graduado em história pela Universidade Federal de Alagoas, pós-graduado em filosofia da religião pela Faculdade Futura. Sou estudante de Filosofia Antiga e Helenística, especialmente Homero, Hesíodo, Plotino, Zenão de Cítio, Epicuro, Cícero. Ouço U2, Tim Maia e Funkadelic. Inspiro-me em Malcom X, James Brown e Bono Vox. Quanto ao livro, os poemas são inspirados no trágico grego, sobretudo, Antígona, mas tenho em Homero uma profunda paixão, dele extraí muito à construção dos poemas.