Confusões.com | Carlos Monteiro

 por Carlos Monteiro__




Foi-se o tempo em que as confusões sociais ficavam restritas às comadres da vizinhança, à boca pequena ou ao suprassumo da tecnologia que eram as trocas de telefonemas, por aparelhos fixos, o que levava a se ter uma enorme paciência para esperar ‘dar linha’, completar a ligação e torcer para que, o ruído de fundo do mar, não atrapalhasse a conversa. Isso quando a ligação não caia no melhor da narrativa. Bom, na verdade, de lá para cá, não mudou muito a não ser pela ‘espera do sinal’, continuamos a enfrentar, por ora, os mesmos problemas de comunicação telefônica nos tempos dos aparelhos de baquelite.


Hoje elas, as barafundas, se propagam como rastilho de pólvora. Um parece que ‘caiu na rede, é peixe’ inumerável. As senhorinhas de outrora, migraram para os aplicativos de mensagens, para as mídias sociais e portais de internet.


Os ‘barracos’, aliás, que nome preconceituoso – por que não palácios ou desentendimentos? – sempre existiram, sempre foram comentados, às vezes de forma mais silenciosa, quando as senhorinhas baixavam a voz e diziam ao pé do ouvido: “—Fulana de Deus, você viu a sicrana? Está saindo, às escondidas, com beltrano; dizem que ele é desquitado... (aqui quase em sussurro)!!! Agora vê se pode uma coisa dessas?! No que era retrucada: “— Pior é a sirigaita da fulaninha que, já deve dois meses de aluguel, mas todo fim de semana está aboletada, numa das mesas do bar do seu Zé das Couves, gastando rios de dinheiro com bebida, agora pagar as contas que é bom...?” Na sociedade elitista, também não era diferente, apenas os canais eram outros. “Em sociedade tudo se sabe” já escrevia o saudoso e querido Ibrahim Sued.


A fofoqueira até ganhou nome: Candinha, em letra de música com autoria de Erasmo e Roberto Carlos, cantada pelo Rei. “...A Candinha gosta de falar de toda gente/Mas as garotas gostam de me ver bem diferente/A Candinha fala mas no fundo me quer bem/E eu não vou ligar ‘pra’ mexerico de ninguém...”. Virou sinônimo de mexeriqueira.


Tudo vem à tona, tudo devidamente registrado pelas câmeras, frenéticas, de algum espectador ocular, através das lentes do seu celular.


As Candinhas atuais são tecnológicas, são rápidas no ‘enter’, em imagens ou áudios descritivos. A proporção de disseminação passou a ser geométrica, exponencial. Em poucas horas o estrago está feito, o ‘cancelamento’ iniciando, numa espécie de justiça 𝘩𝘪𝘨𝘩-𝘵𝘦𝘤𝘩, que não escolhe alvo para atacar.


Os ‘analistas comportamentais’ entram em ação com pareceres ‘técnicos-filosóficos-científicos’. Assuntos relevantes dão lugar a diagnósticos, observações e conclusões. Nada escapa, até os figurinos usados na meada, são ratificados, ou não, por consultoras de moda.


‘À boca pequena’ e a ‘rádio corredor’, ganharam a nuvem. Alçaram voos mais altos e rasantes mais ousados.






Fotocrônica de Carlos Monteiro 












Carlos Monteiro
é fotógrafo, cronista e publicitário desde 1975, tendo trabalhado em alguns dos principais veículos nacionais. Atualmente escreve ‘Fotocrônicas’, misto de ensaio fotográfico e crônicas do cotidiano e vem realizando resenhas fotográficas do efêmero das cidades. Atua como freelancer para diversos veículos nacionais. Tem três fotolivros retratando a Cidade Maravilhosa.