Poemas de Paulo Rezende Ifakóládé

 por Paulo Rezende Ifakóládé__


Foto de Luis Alfonso Orellana na Unsplash

ENXOVIA 


As crianças já não mais falam 

Quem por elas fala,

São os muros altos e os portões de aço


Têm receio de ir para o lugar de coisa nenhuma 

Pois sabem que lá, não encontrarão coisa alguma


Andando se encontravam,

Paradas se perderam 


Não há mais tez de terra, 

Roupas molhadas,

Coração ensolarado…

Apenas cortinas de pó e fumaça, nas vidraças


Vigas, vigias 

Portas lacradas com lamentos 

Cadeados gélidos de solidões inquebráveis… 


Destarte aprisiona,

Uma melancólica infância

Calada, 

Sem horizonte 

A remoer muros, grades e portões. 



ENGAVETADOS 


Um protesto 

Preso em um grito na garganta

Porque somos 

Super-civilizados!

Engavetados em cimento e aridez

Elevados às alturas, sem termos asas 

Vivendo em pombais, sem sermos pombos

Esquecidos  

Do cheiro da terra molhada 

Do chilrear dos pássaros 

Da pele orvalhada

Do perfume da Magnólia 

Do brotar dos campos 

Do frescor das matas 

Dos amores, 

E de nós mesmos.



 



SEM CAPITAL 


 

Quando os vejo 

Em seu duro manejo 

Tentando a sorte 

Aguardando o transporte 

Olhos perdidos 

Corpos moídos, bradando: 

"- Este é o sistema que deu certo!"

Sussurra minha consciência:

"-Como pode isso ser certo?"

Essa máquina-sistema 

De moer gente em seu dilema 

Onde gente moída 

É gente substituída!

Que venha então o errado

Para que dele seja empanturrado

Aquele pelo sistema explorado

E que antes do dia da morte 

Conheça o que é sorte

De fato e de direito 

De outro jeito 

Que não esse 

De capitalista 

Sem capital.



PERMUTA 


Troquei te namorar por amar janelas 

Elas me dão tudo o que tu me negastes:

Me protegem

Me mostram o mundo

E não me traem.


BEATA 


De tanto amar 

Esperar 

E sonhar, em vão, com o amor 

Ela passou a sonhar com o céu

Ficou ranzinza, carola, maledicente 

A tudo e todos criticava 

Zombava 

Perdeu a meiguice do olhar 

Cultivou uma falsa doçura na voz 

Em orações e penitências se afundou

No fim da vida, confessou:

Teria trocado o céu 

Por um beijo de amor!



ANGÚSTIA


Sou a tristeza

Que existe em forma de canção

Deixando nos corações

A saudade de um momento

Sou o amor

Que nasceu para um novo dia 

Esperando por tudo

Uma palavra, um gesto

Sou a ilusão

Que habita na lembrança

Aguardando ansioso

Uma chamada, um olhar

Sou o fio da faca

Que dói fundo

Na alma dos amantes desprezados, 

a cada reencontro sem volta

Sinto uma angústia imensa

Em ser tudo isto

E neste tudo,

Não me encontrar.






Paulo Rezende Ifakóládé nasceu em Araxá–MG, no dia 1 de outubro de 1965. Desde cedo, já mostrava interesse por poesia e gosto por escrever, tendo sido premiado em concursos de redação no ensino fundamental e médio. Foi colunista dos jornais: O Tempo, Jornal das Geraes e Jornal Clarim. Além de poeta, escritor, é estilista, artista plástico e músico.