Viajante
(primeira
parte)
No
finalzinho dos anos 1970 e nos idos entre os anos 1980 e 1990, quando estava à
frente da área de comunicação de um player do segmento têxtil, viajava muito
país afora. Passava a semana fora retornando às sextas-feiras. Para ‘ganhar
tempo’, usava uma tática simples: chegar à capital do estado visitado e de lá percorria
as cidades e os respectivos clientes. Eram muitos, de diferentes portes, com
realidades absolutamente díspares, anseios específicos e sazonalidades ímpares.
Fazia o que, à época, chamava-se fell the merchandising como forma de
agregar a ‘voz’, da comunicação corporativa, como um todo.
Nessa
trajetória, privei de pessoas incríveis, lugares encantadores, estradas
paradisíacas. A natureza esplendorosa do Brasil aflorando a cada curva das estradas.
Situações absolutamente curiosas como a fonte, na então, não pavimentada
Rodovia do Aço, próximo a Santa Rita do Jacutinga, divisa de Minas Gerais com o
Rio de Janeiro, em que havia uma torneira.
Conheci
o seu João Boquinha, em Bom Jardim de Minas, cidade cativante, obviamente,
mineira. Ele, naquele período, era o único carteiro de lá. Dividia seu tempo
entre as entregas de correspondências e um pequeno restaurante, em parceria com
sua esposa. Comida tipicamente mineira com um detalhe significativo: todos os
insumos utilizados vinham de seu vasto quintal. Tudo colhido ali na hora, sem
agrotóxicos, orgânicos, num momento em que essa palavra existia somente no
Aurélio e no Houaiss. Nosssinhora!! Uma gostosura. Sempre marcava pouso na
cidade para desfrutar da prosa com este ilustre cidadão, apreciar uma ‘marvada’
sob a luz das estrelas, com trilha sonora de moda de viola. Dormia sob o coaxar
que vinha do brejo e o despertar dos sabiás-laranjeira aboletados num
marmeleiro contíguo à janela da estalagem. Ano retrasado estive por lá
visitando o velho amigo. Com a diferença de estarmos mais velhos e o João ter
se aposentado, nos Correios, após 40 anos, como missivista, tudo estava como
dantes no quartel-restaurante do João. Noite regada a Abacatinho, guaraná Mantiqueira e, é claro, uma pinga de
primeiríssima, preparada em alambique próprio, envelhecida após várias filtragens.
Uma fartura!
O
canto dessa cidade é meu. Em Paraty — mar branco ou jazida do mar em tupi –,
confesso; esta é minha terceira maior paixão cidadela. Paraty tem um quê de
amor, um quê muito especial é musa-mulher fotográfica. Tem alma encantada, em
ruas de pedras desalinhadas, casario ornado por eiras e beiras, maré alta,
festas e mais festas — Flip, Festival de Bordadeiras, Fogaréu, Santos-Reis...
Paraty-Mirim, Cepilho, Cachoeira do Escorrega, Vamos Nessa, Paratiana,
Corisco... Uma festa!
(continua...)
Carlos Monteiro é fotógrafo, cronista e publicitário desde 1975, tendo trabalhado em alguns dos principais veículos nacionais. Atualmente escreve ‘Fotocrônicas’, misto de ensaio fotográfico e crônicas do cotidiano e vem realizando resenhas fotográficas do efêmero das cidades. Atua como freelancer para diversos veículos nacionais. Tem três fotolivros retratando a Cidade Maravilhosa.
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