por Taciana Oliveira__
Agora, minha terra é o Leme" Clarice Lispector
Agora, minha terra é o Leme" Clarice Lispector
O
livro
O Rio de Clarice - Passeio afetivo pela cidade (Editora
Autêntica, 2018)
de Teresa
Montero,
resgata muito mais que um roteiro clariciano no Rio de Janeiro. A
obra traz um rico apanhado de informações históricas sobre os
bairros cariocas e personalidades que transitaram em épocas
distintas no universo de Clarice
Lispector.
É sobretudo um mergulho fundamental na geografia afetiva da
escritora, desde sua chegada no bairro da Tijuca, passando por
caminhos referenciais da sua biografia, além do mapeamento de suas
obras nesse percurso. Para o leitor, fã de Clarice
Lispector,
é a oportunidade de conhecer cenários escolhidos por ela para a
criação de alguns das suas personagens: Ana (do conto Amor),
Macabéa (da novela
A Hora da Estrela),
Lori (de
Uma Aprendizagem ou o Livro dos Prazeres),
as prostitutas da Praça Mauá (do conto Praça
Mauá)...
Todos circularam e ainda "circulam" por esses espaços.
Impossível não "sentir" Clarice ao visitar o Jardim
Botânico ou ao respirar a maresia da Praia do Leme.
Professora
e biógrafa de Clarice Lispector, Teresa
Montero
sempre comprometida com o resgate cultural de sua cidade, criou os
Caminhos
da Arte no Rio de Janeiro,
em 2008, após conhecer os Caminhos
Drummondianos
em Itabira, cidade do poeta Carlos Drummond de Andrade. O passeio O
Rio de Clarice
é resultado dessa experiência . Por esse motivo registramos no
livro a presença de figuras emblemáticas que respondem pela
construção de uma identidade intelectual e artística do Rio
Janeiro, e pelo encantamento nostálgico da obra. A publicação nos
remete algumas vezes a um almanaque, um mapa de afetos ou o registro
iconográfico sentimental de uma metrópole.
Com
um belo projeto gráfico, suas páginas são ilustradas por mapas e
por um raro acervo fotográfico cedido pela família de Clarice e
pela Fundação
Casa de Rui Barbosa, Arquivo-Museu de Literatura Brasileira.
Complementa ainda um ensaio exclusivo do fotógrafo Daniel
Ramalho.
A narrativa, costurada por comentários de amigos, familiares e
trechos das obras de Clarice, também é o regaste da memória de uma
cidade. O livro não se furta em receber o acolhimento de outros
leitores distantes do universo clariciano. Teresa sempre pensou no
envolvimento maior da população com o Rio de Janeiro: O
passeio não é só a propósito da Clarice – é a propósito da
cidade. (...) Porque o passeio propicia isso: você entra em contato
com a cidade de uma forma muito direta, você sente os cheiros, você
escuta os sons. É uma espécie de pedagogia dos sentidos. Leva a
olhar o Rio de outra maneira, desperta o desejo de cuidar da cidade.
Confesso
a emoção ao encontrar nomes como o da bailarina Gilda
Murray
e do artista plástico pernambucano Augusto
Rodrigues.
Ambos, amigos próximos de Clarice
Lispector,
figuras profundamente envolvidas em suas áreas de atuação. Teresa
acerta na transposição da narrativa oral do passeio para a
narrativa escrita. Ela abre portas, ruas e possibilita a sensação
para o leitor, que não conhece o itinerário, de caminhar pela
cidade ou até mesmo de que “comprou” uma cápsula do tempo.
Testemunhei a criação desse projeto, acompanhei alguns dos passeios
programados e guiados por Teresa Montero no Leme. Assisti de perto o
esforço e determinação para que a publicação chegasse ao leitor
com o máximo nível de qualidade. E chegou! No lançamento do livro
em Recife comentei com Teresa: Dona Clarice ficaria orgulhosa!