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por Ingrid Rodrigues__



Foto: Aaron Burden


 

por Dias Campos__

 

Ilustração: Jr Korpa

            Conversava, há pouco, com um amigo ao telefone. A certa altura, perguntei se ele teria alguma dica que me ajudasse a dormir, pois tive insônia na noite anterior e queria garantir uma noite revigorante.

Ele respondeu que bastava ir de carona com a sogra ao supermercado.

Eu ri, mas insisti no pedido.

E ele teimou na resposta; e pediu que prestasse atenção.

Esta indicação, faço questão de compartilhar com você, amigo leitor, sobretudo nestes tempos de confinamento, em que rir é o melhor dos medicamentos.

            Em um determinado sábado, sua sogra teve a ideia de ir visitá-lo pela manhã. Na realidade, o que ela pretendia era rever a filha e o neto, e pedir para que ele a levasse ao supermercado, quando, então, faria dele o seu carregador.

            Antes de responder, meu amigo resolveu consultar sua esposa com um simples golpe de vista.

            Mas como ela permanecia de braços cruzados, sobrancelhas levantadas, e com a cabeça levemente inclinada para frente, alternativa não teve senão a de aceitar o pedido, buscando encobrir o sorriso amarelo.

No entanto, como não digerisse o terrível ônus de mão beijada, aproveitou a oportunidade para economizar combustível, justificando que teriam que ir com o carro dela, pois o seu estava mais sujo que um utilitário recém-saído de um rali.

Partiram logo depois do almoço. Ele foi no assento do carona, pois sua sogra jamais admitiria que dirigisse a sua preciosidade.

Só que sua sogra nunca foi uma condutora exemplar. Daí que toda vez que ela cometia uma barbeiragem, além de ter que engolir as frases solidárias que vinham dos outros motoristas, ela ainda teve que aguentar os seus olhares que, vindos de esguelha e acompanhados de um levíssimo sorriso, incomodavam bem mais do que o linguajar alheio.

Por óbvio que a alegria se manteve durante as compras, pois sua sogra se esforçava para agir como se nada tivesse acontecido, e ele se desdobrava para não rir a cada vez que trocavam palavras.

O retorno não foi menos monótono que prazeroso.

Sua sogra se despediu em torno das dezenove horas. E se você acha que ela saiu muito tarde, bem mais tarde teria saído se tivesse ficado para o jantar!

Quando foi para a cama, ensaiou relatar para a esposa todas as imprudências, imperícias e violações que sua mãe tinha cometido, sobretudo as que foram registradas pelas câmeras do CET.

No entanto, como sua esposa estava exausta, e morrendo de sono, o jeito foi deixar o relato para o dia seguinte.

Mas como o sono não vinha, resolveu refazer mentalmente a ida e a volta até o supermercado.

E a cada vez que se lembrava dos votos de felicidade que sua sogra recebia dos outros condutores, que calculava os pontos que acumularia na carteira de motorista, e que estimava o valor que teria que desembolsar para pagar as multas de trânsito, mais sorridente ficava, mais seu corpo relaxava, e mais sua alma se preparava para uma noite de belos sonhos.

Daí foi só virar de lado, e dormir o sono dos justos.

Depois de rirmos, eu agradeci a sugestão, mas dela declinei, pois além de gostar muito da minha sogra, era obrigado a confessar que ela dirigia muito melhor do que eu. O jeito seria apelar para os barbitúricos, caso a insônia retornasse.

Aconselhou, então, que usasse esses venenos só em último caso, pois sempre ouviu dizer que diminuíam o tempo de vida.

Sendo assim, ouso abusar da sua paciência, leitor amigo, e peço uma indicação. Por acaso você sabe de alguma mezinha que me ajude a dormir?

 


Dias Campos - Destaque Literário 2020, concedido pela Mágico de Oz; Embaixador da Literatura, título concedido pela Corte Brasileira de Letras, Artes e Ciências - COBLAC, 2020; Ambassadeur Honneur et Reconnaissance aux Femmes et Hommes de Valeur, título concedido pelas Luminescence Académie Française des Arts, Lettres et Culture – Literarte, 2020; Destaque Cultural 2019; Destaque Social 2019; Embaixador da Paz; e Comendador da Justiça de Paz, com a Comenda Internacional Diplomata Ruy Barbosa “O Água de Haia”, os quatro títulos conferidos pela Organização Mundial dos Defensores dos Direitos Humanos – OMDDH, 2020; Prêmio Internet Coblac – Corte Brasileira de Letras, Artes e Ciências, 2020; Destaque Literário no 32º (2020) e no 28º (2018) Concurso Literário de Poesias, Contos e Crônicas, promovido pela Academia Internacional de Artes, Ciências e Letras a Palavra do Século 21 – ALPAS – 21; ganhador do Troféu Destaque na 7ª Edição do Sarau Musical Cultural, 2019; Menção Honrosa no Prêmio Nacional de Literatura dos Clubes – 2019; Selo Destaque do mês de agosto, conferido pelo site Vozes da Imaginação, 2017; autor do romance A promessa e a fantasia (Promise and fantasy), ambas as versões em Amazon.com.br, 2015; “Embajador de la Palabra”, título concedido pela Asociación de Amigos del Museo de la Palabra, 2014; 2010; autor do romance As vidas do chanceler de ferro, Lisboa: Chiado Editora; Colunista do Jornal ROL; do (atual) site Cultura & Cidadania; do Portal Show Vip; e do (atual) portal Pense! Numa notícia; autor de diversos textos literários; autor e coautor de livros e artigos jurídicos.

 por Valdocir Trevisan__


 

por Argentina Castro__

Intervenção na fotografia: Priscilla Du Preez

 

por Valdocir Trevisan__

 


 por João Gomes__

 

Ilustração: JR Korpa

 por Luiz Antônio Gusmão___


 por Adriano B. Espíndola Santos__

Fotografia: Daniel Tafjord

 por Kelly Leones__



 por Manu Bezerra de Melo__

Fotografia: Raisa Milova


Tinha um gato às mãos que miava sem parar. Tentava acalmá-lo sem sucesso. Repentinamente, o felino avança em direção ao seu peito, adentra seu corpo, possui-o, acomoda-se no seu interior de modo que ela começa a miar. Tenta dizer umas palavras, soa engasgada. Angustiada, rebate-se e acorda deitada de bruços na cama, gofa uma água azeda quase sufocada. A porta está fechada, é o gato, quer sair. Tem fome. Mia alto enquanto observa ela se levantar lentamente, quase tonta. Abre a porta, volta pra cama, apoia-se com os braços na janela. Abre as cortinas e olha o céu. Está azul e brilhante. É domingo, um domingo de verão. Seus cabelos então dançam o ritmo do vento que bate e ela deita em forma de brisa. Há um copo com água na mesa lateral à cama. Alcança-o, bebe dois, três goles curtos. Não tem pressa, nem precisa. Hoje não vai sair, nem vai trabalhar, nem vai ao mercado, não vai ao ginásio, nem a biblioteca. Hoje vai ficar em casa, assim tem sido. Pode se recuperar do seu pesadelo felino, pode lamber suas feridas. Ficar em casa tem suas vantagens. Está cansada das máscaras que precisa usar pra esquecer-se de si mesma, e pra proteger a si, deseja outras novas mais condizentes com sua figura. Ficar em casa não deixa de ser privilégio. Há comida na tigela, há uma manta, há uma janela pra ver o céu, há vento.


Setenta dias podem passar rápido, a depender. Ou podem ser lentos como um jabuti de apartamento. Neles consegue estar atenta a coisas dantes nunca reparadas. O movimento das nuvens de segunda a sexta-feira, e suas mudanças de direções aos finais de semana. O caminho das formigas até o buraco no móvel de madeira da cozinha, seu esforço pra carregar no lombo a comida da semana tal qual carregar seis sacolas cheias do mercado, três em cada mão. Os movimentos contínuos do gato; cochila de manhã, dorme a tarde, diverte-se a noite com ruídos assombrosos. Em trinta dias repara melhor a crosta de poeira que se forma sob os móveis, dia a dia crescente. E ignora a crosta mais vezes enquanto alterna os olhos a tomar conta da menina que, às cinco em ponto, desce com sua bicicleta e dá dezoito ou vinte voltas em torno da fonte do seu quintal. Depois deixa pousada por cima das roseiras mantando ali as cores múltiplas, promovendo uma emboscada contra si mesma.


Esta manhã viu mais pombos que o normal. O alpendre está imundo. O gato salta pra cima do vidro e arranha-o com as patas em tom de ameaça. Os pombos desdenham do ridículo, depois voam rasantes em desorientação pra pousarem de volta no mesmo alpendre, pra cagarem de volta no mesmo alpendre enquanto ameaçam espelhos que revertem o sol, pinos de repelência, discos velhos em cd-rooms pendurados à janela. Enquanto se arriscam no céu que todos desejam, mas só eles o têm, e sorriem pra o despeito dos que os chamam de ratos.


Setenta dias podem ser proveitosos. A ordem dos livros na estante já não é a mesma e foi garantida a descoberta de um novo trapo liso pra limpar prateleiras que já não engancha nas farpas. A louça suja acomoda-se mais do que nunca ao formato da pia, a pia, no entanto, luta contra o peso e o incômodo das panelas anti-aderentes. A comida podre dos restos do almoço de ontem escorrega lentamente pela parte interna do saco preto da lixeira, cujo odor é possível sentir tão logo a porta da cozinha é aberta. Seu corpo se toma em pelos. Não há lâminas, não há ninguém pra ver este corpo. É inverno, está felino agora, nem mesmo é possível saber qual o dia deixará de sê-lo. É possível deitar-se novamente, e deita-se, embola-se de um lado ao outro, abraça as pernas como um feto, debate-se por dentro tudo aquilo que pousa por fora, deixa o corpo dorido tomar a forma do impossível. No teto há uma projeção de si, mas a imagem não condiz com a de costume. Indeterminável, indetectável, incompreensível. Soa seu alarme, um som estridente. Sente o estado de emergência e pode, então, ser o que quiser. Até segunda ordem.


 



Manuella Bezerra de Melo
é recifense, autora de Pés Pequenos pra Tanto Corpo (Urutau, 2019) e Pra que roam os cães nessa hecatombe (Macabéa, 2020), tem mestrado em Teoria da Literatura e atualmente cursa o Doutoramento em Modernidades Comparadas: Literaturas, Artes e Culturas na Universidade do Minho, em Portugal, onde reside.

 por Yvonne Miller__

Jr Korpa

por Wilson Freire__

 

 


Pintura Mistureba: caneta esferográfica, giz de plástico e pastel sobre papel machê reutilizável - 20 X 30 cm 

  

por Taciana Oliveira__



por Valdocir Trevisan__



 

por Mike Sullivan__


Fotografia: Andrik Langfield

 por Valdocir Trevisan__




 

por Valdocir Trevisan__




 

por Adriano B. Espíndola Santos__


JR Korpa

 

por Rosa Morena__


JR. Korpa


por Dias Campos