Por Taciana Oliveira__ 



por Rebeca Gadelha__



 por Adriano B. Espíndola Santos___



Levanta a cabeça, estropício!”, com os grossos e insistentes gritos que escutou ao longo da curta vida, mínima, por último, feito uma chibatada na moleira, catapultou-se da letargia.

Arfava o peito de medo, só medo. Era o sentimento que vinha, complementado pela dúvida cruenta do que poderia suceder. Negligenciava tudo ao redor, uma espécie de defesa instintiva, para escapar dos vultos que lhe afetavam o andar, o falar; os sensos de vida.

Cada impulso de seu pai, o cioso vaqueiro Raimundo, ou respeitabilíssimo Mundo, como era conhecido, na chegada das lidas, revoltado com o quadro que se alastrara, envolvendo até a mulher e os filhos, que não davam conta do serviço, rendia à Quitéria a confusão e o atropelo, com as palavras que ela tentava decifrar, emboladas. Pelo citado ímpeto voraz, Quitéria comprimia-se em tremenda aflição. Nem por isso conseguia mudar o fluxo.

Dona Valda, a mãe zelosa, suplicou auxílio ao padre, que, ocupado, atendendo a duas comunidades, relatara que não teria tempo de vê-la tão cedo; que, se tivesse aperreio, ela mesma puxasse a novena de Santa Rita, para as causas difíceis, que ele, de onde estivesse, daria a sua bênção; que isso já valia muito; que a sua presença seria um detalhe, que competia a eventos graves; e que, pelo que notara, não vinha ao caso.

Mundo defendia-se, com a rabugem que lhe era peculiar, que estas seriam medidas necessárias, para que a filha não caísse na lassidão, na vadiagem, próprias de gente desocupada; sendo ela moça de família, muito bem criada.

Quitéria, no entanto, ouvia e nada entendia, deixando transparecer a indefinição, como se houvesse de fato, acompanhada de um comprometimento sobrenatural, algo que rápido atribuíram à obra do mal.

Não se levantava da cama fazia, exatos, quinze dias. Valda, por isso, cria em possessão, quebranto; o pai não media palavras: “Safadeza!”; que a “mocinha”, se não se ajeitasse, por si só, levaria umas boas peias, para aprender e para largar mão de tanta frescura. “Tudo tem um limite! Tudo tem limite! Se avexe, sinhá mocinha; tome tento!”.

Quitéria amofinava, progressivamente. Valda e os filhos, na surdina, tentaram rezadeira, orações de todas as ordens, e lhe entupiram de chás. Nada – ou quase nada – solapava a indisposição encruada.

Prostrada, sem forças nas pernas, com dores por todo o corpo, dedicou-se exclusivamente a orar, porque era temente a Deus; participou da novena levada a cabo pela mãe; seguiu a cartilha de boa filha, obediente. Mas, quando o pai abordava, afogueado, o processo desandava; e a moça, para se ver livre dos arroubos de loucura, colocava as mãos no rosto, principiava um choro miado, e declarava-se – ou queria declarar – ser frágil; estar tremendamente doente.

Valda não tirava os joelhos do chão e, também, não aprontava a casa e não preparava o de-comer, atrevendo-se a ser condenada pelo marido. Os irmãos de Quitéria, Francisco e Aldo, trabalhavam dobrado, para não serem enleados na história; e ajudavam a mãe, inclusive nos afazeres domésticos. Porém, sempre restava um bocado, que depressa Mundo percebia, com olhos de carcará sequioso, e reclamava arrumação; que não teria casado com mulher preguiçosa; que não teria criado filhos para serem prontos na vida; que, da próxima vez, cada um ia sentir o gosto de sua mão, para todos da vizinhança alcançarem o desgosto que sofria.

Claro, uma artimanha das mais potentes, perniciosa, porque ser recriminado em público por um pai e marido diligente – como se pintava – seria o decreto do esquecimento e da desgraça eterna. O homem, nesses tempos, ainda ditava os destinos dos seus; sejam bens ou pessoas coisificadas, que, contrariando os seus quereres, facilmente ganhariam o degredo da vida social, do convívio com a população.

O amor da mãe, que se colocava em choros convulsivos em frente à Quitéria, para protegê-la de uma premente tormenta, quando o pai partia para cima; segurando-o, em tempo de ser arrastada, levou a moça, episodicamente e aos poucos, a refletir, a recobrar os parcos sentidos.

Até que, sem meios, aproveitando o sono alheio, na calada da noite, tomou o rumo do vento, aprumada na jumentinha Juma. Não deixou carta, bilhete algum; ainda assim, Valda se comprazia com a ideia de liberdade, querendo ela mesma se debandar; e esperando, num dia próximo, ser resgatada por sua menina.

Por isso, Mundo vomitou o decreto: “Deserdada!”, pois que, argumentava, cheio de provas conjecturadas, teria se amigado ou virado rapariga; que não se falasse mais nisso. Qualquer atrevimento, praguejava, seriam todos deserdados, inclusive a mulher, que tanto o servira. Assim sendo, batera o cajado: assunto encerrado. Restaram ele e a imensa amargura.





Adriano B. Espíndola Santos é natural de Fortaleza, Ceará. Em 2018 lançou seu primeiro livro, o romance Flor no caos, pela Desconcertos Editora; e em 2020 o livro de contos, Contículos de dores refratárias, pela Editora Penalux. Colabora mensalmente com a Revista Samizdat. Tem textos publicados em diversas revistas literárias nacionais e internacionais. É advogado civilista-humanista, desejoso de conseguir evoluir - sempre. Mestre em Direito pela Universidade de Coimbra. Especialista em Escrita Literária, pelo Centro Universitário Farias Brito. Atualmente cursa doutorado, também em Direito, pela Universidade de Salamanca. É, sobretudo, dor e amor; e o que puder ser para se sentir vivo: o coração inquieto.


por Taciana Oliveira__



Por Adriane Garcia__


 por Taciana Oliveira__





 por Taciana Oliveira__


Plaquete do poema Após o pó, de Emerson Sarmento.



 

Por Taciana Oliveira__

Bozonazireptliano, arte-colagem por Caio Lucas


por João Gomes__

por Taciana Oliveira__


 

Por Adriane Garcia__




Nesse livro imperdível sobre a história das mulheres, a historiadora Silvia Federici registra o resultado de três décadas de suas vastas pesquisas sobre a caça às bruxas, ocorrida desde o final do século XV e ocupando os primeiros séculos da Era Moderna. Com ápice no século XVI – e não na Idade Média – a caça às bruxas, argumenta a historiadora, foi primordial para a acumulação primitiva, que permitiu o acúmulo de riquezas para a Europa e o desenvolvimento industrial, assim como o próprio sistema capitalista.

 por Edner Morellior




 por Thiago Noronha__



 por Taciana Oliveira__


por Jorge Ventura__


Introdução

       Airon Galindo, de Caruaru-PE, é protético. Também é construtor de rabecas.

      A destreza no trato dos materiais na sua atividade profissional como protético – exercida há vários anos – certamente influencia seu trato das madeiras quando da construção de rabecas.

      Galindo, dado o contexto cultural e musical de Caruaru, cedo se interessou por música. Disto resultou, por curiosidade, o desejo de aprender a tocar um instrumento: apaixonou-se por um violino de um seu conhecido. Experimentou-o sem saber tocá-lo. Daí, foi um “salto” para o interesse pela rabeca.

     Em sua cidade natal, Galindo teve dificuldades de encontrar rabecas. Decidiu construir uma. Tendo visto um programa na TV sobre a construção deste instrumento, desenhou um modelo, a partir de sua própria intuição, em termos de medidas, pelo método de tentativa e erro. Seu primeiro instrumento foi feito com madeiras de um velho e imprestável guarda-roupas. Esta primeira rabeca não produziu som, mas a característica de aproveitamento de materiais recicláveis tem acompanhado a trajetória de Airon na construção deste instrumento tão icônico da nossa cultura popular.

      Galindo tem uma preocupação clara: produzir instrumentos baratos e acessíveis aos que se interessam pela rabeca. Assim sendo, tem realizado um interessante trabalho de aproveitamento de madeiras descartadas que tornam seus instrumentos relativamente baratos se comparados aos de outros luthiers.


Materiais Recicláveis

     Como bem se sabe, muitos eletrodomésticos são transportados das fábricas para os pontos de venda embalados em caixas de madeiras. A madeira usada nestas caixas é de uma espécie de pinho. Quando esses produtos são desembalados, toda essa madeira tem o lixo como destino.

      Porém, boa parte desse material descartado encontra outro destino: a fabricação de rabecas, pois é aí que Airon Galindo recolhe a matéria-prima para a construção de seus instrumentos.

   Há várias espécies de pinho. Os mais nobres – abeto, por exemplo – são utilizados na construção de instrumentos de alta performance: violões de concerto, violas, violinos, cellos e até mesmo rabecas de luthiers famosos.

   No entanto, na produção popular, como a de Galindo, utiliza-se o pinho mais simples e comum, o mais barato, que pode ser adquirido, sem tratamento, em qualquer madeireira. A diferença deste construtor com relação a outros é que ele não compra as madeiras que utiliza, mas as recolhe do descarte.

    Na construção de rabecas, utilizam-se diferentes madeiras para as suas diferentes partes: pinho para o tampo e fundo, praíba para o braço, jenipapo para as cravelhas etc. Galindo, por sua vez, utiliza “o que achar no lixo”, conforme declarou em entrevista.

  Além do uso de madeiras descartadas, este luthier também utiliza material reciclável para outras partes da rabeca a exemplo do aço galvanizado para a feitura do estandarte ou lacraia, conforme figura 1, abaixo. Antes, ele já havia utilizado casca de coco endurecida, que também encontrava em descartes. Porém terminou optando pelo uso do de metal pelo “som sujo”, segundo ele, que tal material permite.

    Esta é a primeira vez em que testemunhei um estandarte feito de metal, pois o padrão absoluto é o uso de jenipapo, como no caso do luthier Zé de Nininha, de Ferreiros-PE, tratado em artigo anterior.



 por Adriane Garcia__


 

por Taciana Oliveira__

Plaquete com três poemas de João Gomes. Disponível para download. Clica aqui.


 por Divulgação__


 por Ticiana Werneck__




 por Divulgação__