por Taciana Oliveira___

Naná Sodré em cena
Carioca de nascimento, radicada em Pernambuco, produtora e atriz, Naná Sodré é uma figura imprescindível na cena cultural do Estado. Uma das idealizadoras da Mostra Luz Negra – O Negro em estado de representação, iniciou sua trajetória trabalhando com luz cênica. Mas no ano de 2009 começa a se dedicar aos estudos da interpretação e atuar como atriz. Para Naná era “algo incontrolável” criar um novo percurso profissional. A partir da aprovação de um projeto em um edital, e a realização de um espetáculo, os efeitos do racismo institucional se fez presente até mesmo na própria comunidade teatral. Uma atriz negra em cena, para alguns, era um “devaneio”

por Taciana Oliveira___


Não sei mais o que dizer de autoria de Jéssica Gabrielle Lima, uma publicação da Aliás Editora, é um desabafo poético  sobre perdas, afetos e possíveis recomeços. As ilustrações de Jéssica revelam com delicadeza o caos emocional de uma solidão feminina. Tudo dói, é intenso, frágil e absurdamente sincero. Tudo grita e se cala na mesma proporção. Não sei mais o que dizer cria atalhos para conexões visuais onde o amor reverbera além de toda ausência.

*Jéssica Gabrielle Lima é editora e ilustradora da Aliás. Formada em Letras, dona de um gosto musical mais-que-perfeito, criada no Modubim, Fortaleza, atua como professora, revisora de textos e mediadora de leitura. 



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Publish at Calameo




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Taciana Oliveira é cineasta, torcedora do Sport Club do Recife, apaixonada por fotografia, café, música e literatura. Coleciona memórias e afetos. Acredita no poder do abraço. Canta pra quem quiser ouvir: Ter bondade é ter coragem.


por Juliana Berlim__

Selva Almada esteve no Brasil em 2018 para o lançamento nacional de seu livro Garotas mortas (Editora Todavia), tradução do original argentino "Chicas muertas" de 2014. A obra pretende acompanhar os desdobramentos de três assassinatos de jovens argentinas entre as décadas de 80 e 90 (Andrea Danne, Maria Luísa Quevedo e Sarita Mundin). Nenhuma delas era portenha e todas provinham de famílias da classe trabalhadora e/ou dirigidas por mulheres. Todas com idades entre quinze e vinte anos. O alijamento socioeconômico contribui, infere -se, na irresolução dos crimes. Almada, ela mesma uma jovem do interior do país, criada em uma cidade vizinha à da família de uma das vítimas, persegue essas histórias e refaz as pegadas deixadas pelas investigações conduzidas. Vasculhando os detalhes dos inquéritos, entrevista familiares, ex-namorados, amigos, vizinhos, conhecidos, qualquer um que permita a elucidação dos crimes ou lance nova luz ao obscurantismo dos acontecimentos de antanho.
Como técnica narrativa, Almada emprega a autoficção em conjunto com uma forma sincopada de jornalismo literário, já que a autora recusa sistematicamente a seus interlocutores a alcunha de "jornalista". Ela é sim uma escritora atormentada pelos fantasmas dos assassinatos de mulheres que, por serem tão próximas, poderiam ser qualquer conhecida, qualquer uma de nós. Este efeito aproximativo cria a vinculação pretendida pela autora para nos fazer perceber que os crimes contra o gênero afetam-nos mais diretamente do que a imagem plasmada, fria de uma notícia de jornal possa fazer perceber. Ela observa igualmente a inexistência, à época das mortes das jovens, do termo "feminicidio". O neologismo aponta para novos modelos de sociedade em que se entende a urgência do cuidado quanto à condição feminina, a qual, como Almada apresenta diversas vezes em seu livro, é ainda entendida como terreno livre para a consumação dos desejos e das perversões masculinas. O corpo da mulher é, em suma, um eterno campo de batalha.


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Juliana Belim é professora de Língua Portuguesa e Literatura do Colégio Pedro II. Conduz no mesmo colégio, o projeto de iniciação científica Neuromancers, de leitura e pesquisa sobre romances de ficção científica, bem como faz parte do corpo docente da pós-graduação Lato Sensu Ererebá – Educação Étnico-Raciais no Ensino Básico. Participou de três edições da FLUP – Festa Literária das Periferias, com a publicação de quatro contos no total.



por Juliana Berlim__


Zerstörung einer Illusion,’ 1977 © Karin Mack / SAMMLUNG VERBUND.


O brasileiro médio acorda, escova os dentes, toma café, sabe de uma tragédia e vai trabalhar. Mas se o brasileiro médio fosse uma brasileira média e tomasse conhecimento de uma tragédia logo de manhã, é bem provável que engolisse seu café a frio: desde o começo de 2019, não houve um único dia sem a notícia de uma morte de mulher.


por Henrique Wagner__


No ano em que os brasileiros elegeram um presidente machista e misógino, e em que uma ministra declarou que “mulher nasceu para ser mãe”, e ainda: “me preocupo com a ausência da mulher de casa, hoje a mulher tem estado muito fora de casa”, a editora Objetiva lançou a biografia “Maria Bonita: sexo, violência e mulheres no cangaço”, de autoria da jornalista nascida em São Paulo, Adriana Negreiros. A sociedade civil resiste.

Curadoria de Adriane Garcia___



por Raimundo de Moraes__
Em homenagem ao 8 de março, o Mirada traz cinco entrevistas realizadas pelo escritor e jornalista Raimundo de Moraes, que fez das perguntas não só uma breve coletânea de opiniões, mas também um eclético painel sobre o universo feminino e suas múltiplas manifestações – seja na arte, no dia a dia e nos desafios do combate à violência contra as mulheres. 

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Gerusa Leal
O que te levou (e leva) a escrever?
Na base de tudo, a leitura. Fui uma criança muito introversiva, que sempre adorou ler, vício que adquiri com um pai também leitor inveterado, e escritor tão autocrítico que acabou pouco publicando. Até hoje prefiro ler. Escrever foi uma descoberta feita outro dia, há uns vinte anos quando, aposentada precocemente, me valendo da legislação previdenciária da época, e abrindo mão de quase um terço do salário, comecei a prcurar algo interessante para fazer.






por João Gomes__


Líria, como é ser poeta depois dos 70? E a idade contribui ou atrapalha ser escritor num país que dá tão pouca importância ao trabalho artístico? “a morte não chega / a vida não basta” é o que lemos no seu poema limitações.


por Thaís DSR __


                                                      
Quando caminho pelas ruas sempre me deparo com seu nome: Marielle Vive.
Está pichado no muro em letras garrafais.
Quem será que decora a cidade?
Quem está construindo essas paredes?
Seja lá quem for não se esqueceu de você,
Marielle Franco.
Nenhuma de nós jamais irá.
Em outras paredes ainda em ato transgressor:
Quem mandou matar Marielle e Anderson?”
Também não esqueceremos.

por Taciana Oliveira_____


por Taciana Oliveira__

O clipe de Revólver acaba de sair do forno e já provoca múltiplas reverberações. Flaira Ferro  vem com uma visceralidade que contagia, ultrapassa os limites da cidade. A letra da canção é antes de tudo um manifesto, uma ode ao frevo e a resistência artística de Pernambuco. Impossível você não se conectar a cada acorde, ao discurso poético-corporal de Flaira. Nesse passo regido pela ancestralidade nordestina a mensagem que fica não é apenas para os dias de Momo: A covardia impera sob a ignorância / Mas a esperança /é substância pra mudar






O meu revólver é um estado de espírito e o pessimismo é luxo de quem tem dinheiro A covardia impera sob a ignorância Mas a esperança é substância pra mudar Mudar as coisas de lugar Uma cidade triste é fácil de ser corrompida uma cidade triste é fácil ser manipulada No contra-ataque da guerra, arte! pra não viver dando murro em ponta de faca. No contra-ataque da guerra, arte! ninguém nessa terra vai comer farinata Eu quero ver você dizer que não vai ter mais frevo Eu quero ver você dizer que não tem frevo mais O frevo é um ser humano O frevo é o nosso Rock O frevo é a luta armada de Zenaide, de Capiba e de Spok Meu corpo é uma cidade com pernadas de aço pra furar um buraco na rocha do egoísmo A revolta do passo Ferrolho, tramela Rojão, abre alas Tesoura, martelo Espalhando brasa No contra-ataque da guerra, arte! pra não viver dando murro em ponta de faca. No contra-ataque da guerra, arte! Um corpo liberto deixa a mente afiada.

Revólver - Flaira Ferro






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Taciana Oliveira é cineasta, torcedora do Sport Club do Recife, apaixonada por fotografia, café, cinema, música e literatura. Coleciona memórias e afetos. Acredita no poder do abraço. Canta pra quem quiser ouvir: Ter bondade é ter coragem.





por João Gomes_____

Quem passeia pela literatura feita por escritores independentes sem dúvida sabe o que é um zine. Pode ser e ter qualquer formato, guardar textos de um autor apenas, de vários, ilustrações, o que se desejar sendo autoral ou editorial. Pra ser zine tem que ser impresso, sim. Mas o projeto gráfico pode também ser disponibilizado na rede, o pdf pode ser encaminhado por e-mail e etc. Venho aqui falar então do zine Bellzebuuu, do estado de Minas Gerais, que em seu primeiro número em agosto de 2017 circulou por Belo Horizonte após a curadoria e realização de Adriane Garcia e Sérgio Fantini. Finalzinho do ano passado, fui convidado por Adriane para transformar o zine numa publicação de Vida Secreta, onde sou editor. Da minha leitura do material fiz a editoração eletrônica que segue. É para ser lido de uma vez, numa sentada. A temática proposta aos autores paira sobre como a religião pode corromper o estado laico com seus retrocessos e doutrinas.

por João Gomes__


Trecho da tela  "Eu vi o mundo...Ele começava no Recife" de Cícero Dias



       Nasci no Recife, capital do frevo, patrimônio imaterial da humanidade. Digo mais: cresci no Recife Antigo, ou Bairro do Recife, onde acontece o Carnaval de rua mais inclusivo e multicultural do país. Mas só de alguns anos pra cá passei a perceber como a festa de Momo acontece, ofertando todo o período como palco do espetáculo, suas ornamentações e tradições contendo tanta historicidade. O frevo, que nas palavras de Câmara Cascudo é “a grande alucinação do Carnaval pernambucano”, o maracatu da Rua da Moeda, os trios elétricos que arrastam multidões no tão aguardado Sábado de Zé Pereira com o maior bloco de rua do mundo, o Galo da Madrugada e etc. Isso sem falar nas ladeiras de Olinda, com prévias todos os finais de semana muito antes e blocos passando a todo instante. Eis nossa riqueza cultural que impulsiona a economia antes e durante a festa.



por Taciana Oliveira___


O zine A dor do agora é mais uma publicação do Aliás Selo Editorial, e está disponível apenas para leitura na plataforma Calameo. Conversei com a Thaís DSR que responde pela autoria do texto. O resultado dessa conversa rendeu uma entrevista pocket para o Mirada.
É a tua segunda colaboração com o Aliás Selo Editorial. A primeira foi a participação no e-book As Cidades e o Desejo. Como foi produzir o zine? Era um formato novo para você?
Eu já tinha visto muitas mulheres escreverem no formato de zine. Até já tinha comprado alguns em feiras feministas e os da editora Aliás (comprei todos). De alguma maneira parece que esse formato é utilizado como ferramenta de luta das mulheres, já que as editoras nem sempre nos publicam e foge de outros formatos mais institucionalizados. Mas nunca tinha produzido um. Durante o processo me senti conectada com essas outras mulheres que utilizam o zine para se expressar.
Juliana por Thaís DSR
Você e a Juliana DSR assinam a publicação. Fala um pouco do processo criativo dessa parceria.
Aqui em casa somos três irmãs muito unidas e conectadas. Parecia um caminho natural a gente fazer as coisas juntas. Nós três temos uma ligação diferente no mundo das artes, a Ju desenha, eu escrevo e a minha irmã Carol é da área dos instrumentos musicais. Toda vez que escrevo algo novo é para elas que mostro primeiro. E, em contrapartida, a Ju sempre mostra seus desenhos e a Carol suas canções. Acho que isso une a gente. Alguns desenhos já estavam prontos e eu achei que cabiam no zine. Como o da Marielle e o da Matheusa, que a Juliana fez na época em que tudo isso doía ardentemente. Na época eu escrevi o texto da Marielle e ela fez o desenho, eles já se encaixavam. Outros a gente pensou juntas. Nós relemos os textos e pensamos o que poderia simbolizá-los. Foi tudo muito compartilhado, por isso assinamos juntas. É uma criação de irmãs.
Thaís por Juliana DSR

Quando li o zine lembrei muito de uma texto da Clarice Lispector: Eu não aguento a resignação. Ah, como devoro com fome e prazer a revolta. Lembrei também da força dos versos de Maya Angelou em Still I Rise. A dor do agora é um "manifesto", um texto urgente que grita por resistência, uma porrada para acordar os que estão na apatia?

Acho que a A dor do agora trabalha com dois movimentos. Tem essa chamada pública de que é preciso levantar, que o mundo nos exige coragem, que ficar parada não é uma opção. Mas também são processos muito pessoais das dores que lutar e resistir nos causa. Então também é um texto que pode tocar as pessoas que já estão lá, que já tiveram seu despertar político, que já estão nas trincheiras. Porque fala do quantas vezes estamos cansadas, no quantas vezes pensamos em desistir, fala sobre perder batalhas. A morte da Marielle foi uma dessas perdas irreparáveis, que nos destruiu em vários níveis. Ela era a primeira vereadora lésbica e negra que eu conheci. Era mágico saber que ela existia. Nós chegamos a estar juntas na construção do movimento de mulheres lésbicas do Rio de Janeiro. E quando a assassinaram... Nossa! Nada poderia reparar isso! Nós perdemos e sabíamos disso. Mas também sabíamos que Marielle não iria querer ver a gente se conformando com a derrota. Então levantamos em meio a dor. Por ela e por todas as mulheres. Outros textos falam muito sobre a lesbianidade e esse processo de sair do armário, mas não só de sair, mas também de sentir orgulho de quem é (o texto da Cidade e os desejos também fala disso). Todo militante homossexual por mais que levante suas bandeiras com orgulho no presente carrega consigo um passado de dúvidas, muitas vezes de vergonha de si, um processo doloroso de autoaceitação. A dor do agora também é pra elas/eles. A dor do agora mas que a gente sabe que não é pra sempre.


Thaís DRS é professora de Geografia, Mestre em Educação, lésbica e feminista.
*Juliana DRS tem essa sensibilidade no traço que parece se refletir na vida.

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Copio aqui o texto do lançamento do zine, escrito por Anna K de Lima, integrante do Aliás Selo Editorial, uma das escritoras mais porretas do Estado do Ceará, quiça do Brasil! As mulheres do Aliás não se cansam em multiplicar afetos . Elas reverberam o mundo:

A gente se empenha em impulsionar mulheres pelo mundo, Aliás! Uma força revolucionária, essa, de estar de mãos dadas — umas às outras. Daí apresentamos a zine da Thaís e Juliana DSR que nos toca imensamente sobre as formas de nos posicionarmos e sermos resistência nesse mundo. Não tá fácil, a gente sabe (e sofre!), mas é importante que estejamos juntas.



Publish at Calameo


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Taciana Oliveira é cineasta, torcedora do Sport Club do Recife, apaixonada por fotografia, café, música e literatura. Coleciona memórias e afetos. Acredita no poder do abraço. Canta pra quem quiser ouvir: Ter bondade é ter coragem.