por Quiercles Santana__
Estação São Bento no Porto/Portugal |
Rosenbud,
as coisas retornam, feito num filme. De algum lugar distante, dentro
da gente, arquivos velhos perdidos no HD, elas voltam com força,
como se tivessem sido registradas há pouco. Saltam de uma
fragrância, de um livro, de uma fotografia rasgada ao meio num
momento de fúria.
1. A
manhã em que desci na Estação São Bento no Porto/Portugal,
levando um espetáculo de teatro que ajudei a parir. Fazia frio e o
sol tingia de laranja as fachadas dos prédios antigos. Eu estava
feliz que só. Comprei um Henri Miller numa feira de livros usados,
ao pé da estação, como eles dizem por lá;
2. 1976.
Meu pai desolado com o assassinato de seu irmão Dudé, meu
padrinho, em Volta Redonda (nunca mais esqueci esse nome). As
pessoas convencendo-o a sair do carro por que só se podia agora
lamentar, o mal feito já tinha sido feito. Recostadas no volante,
suas mãos trêmulas e a cabeça fervendo de angústia e dor;
3. A
primeira vez que subi no palco de um teatro (1992) com direito a
refletores e cortina. Fazia o personagem mais estúpido da “Farsa
do Pathelin”. Teatro José Carlos Cavalcanti, no Derby. Minhas
pernas tremelicando no escuro da coxia pouco antes de entrar em
cena;
4. Eu
com 8 anos. Minha mãe com Vick Vaporub numa noite de tosse e febre
alta (sua mão cálida enxugando a minha testa, sua voz mansa
dizendo “tudo vai ficar bem, meu amor");
5. Minha
ex-sogra uma vez no inverno. Eu, molhado da cabeça aos pés, abro a
porta da sala, vindo frustrado da rua (tinha passado o dia a procura
de trabalho e recebido um não atrás do outro). Ela estava junto ao
fogo, mexendo a panela: “meu genro querido, fiz uma sopa adubada…
vai ou fica?” Logo depois, debaixo do chuveiro, sentindo um misto
de alegria e frustração, entalado, eu choro baixinho, agradecido
por não estar sozinho na tormenta. E, em seguida, eu todo animado,
rindo alto na mesa, o mesmo cara que chorava há pouco, sorriso de
canto a canto (por que a vida pode ser dura, irmão, mas pode ainda
assim guardar algum alento. E é preciso aprender a celebrar as
vitórias, por mais insignificantes que elas possam parecer, não é
isso?).
Entenda.
Nada disso diz muito. Mas ao mesmo tempo diz. Ainda não sei bem o
porquê, mas me ajudam a entender meu percurso, enquanto atravesso
esse confinamento sem fim. Agradeço mais uma vez o seu carinho e sua
boa vontade em me ouvir. Força aí na sua quarentena. Estamos
juntos.
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Quiercles
Santana é arte-educador, ator, encenador, dramaturgo e professor
de teatro, formado em Educação Artística com Habilitação em Artes
Cênicas pela UFPE Fez parte do corpo
docente de diversos projetos sociais, a exemplo do Projeto Santo
Amaro (da Escola Superior de Educação Física/ESEF-UPE), do Projeto
ReVersus (da UFPE), do Programa de Erradicação do Trabalho Infantil
(PETI/Projeto Teatro do Oprimido) e do Programa de Animação
Cultural (este último em parceria com o ex-Padre Reginaldo Veloso e
Fátima Pontes, na Secretaria de Educação da Prefeitura da Cidade
do Recife, durante a gestão de João Paulo). Foi diretor artístico
da Trupe Circos, da Escola Pernambucana de Circo (Circo Social).
Trabalhou seis anos na Diretoria de Políticas Culturais da Fundarpe.
Dirigiu diversos espetáculos entre eles: Olhos
de Café Quente, do Nútero de Criação Artística;
Alguém Pra Fugir Comigo, do Resta 1 Coletivo de Teatro;
e Espera o Outono, Alice, do Amaré Grupo de Teatro;
Berço Esplêndido, do Grupo Panorama de Teatro; e
Balbúrdia, da turma profissionalizante da Companhia
Fiandeiros de Teatro. Foi
gerente do Teatro de Santa Isabel de 2015 a 2017. Estreou como
documentarista em 2013, no filme “Contos
Ruas Casa & Quintais”, filme que registra fragmentos
de memórias de pessoas idosas, residentes em Recife. É analista de
projetos culturais.
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por
Adri Aleixo
O pintassilgo
Eu,
tão mineira querendo falar sobre o mar
o
mar e a ideia do eterno retorno
dia
desses me perguntaram se lá em casa havia quintal
—
minha
mãe criava porcos
meu
pai plantava cana, eu disse
mas
esse fato também não é a garantia de uma boa história.
Há
uma forma indefinida pela qual passamos a pertencer a algo
assim
como pertencemos a certas histórias só de ouvir contar.
A
caçula chegou em casa e soube que o mais velho havia ganho um
prêmio
de redação
O
título. O pintassilgo.
Ela
mal conhecia os pássaros e de repente ouvia sobre voar no
pintassilgo
essa
ave que canta e dança a rodear o dia
algo
como pintar o céu com suas asas e assim
pertencer
ao céu de alguém
estar
livre e voltar a casa
ao
ninho
como
agora o espevitado pássaro fizera ali
no
meio da sala.
As
coisas aparecem sem a perspectiva de sua fugacidade
algumas,
retornam
Adri
Aleixo publicou Des.caminhos (2014) e Pés (2016),
ambos pela editora Patuá. Em 2019 publicou Das muitas
formas de dizer o tempo, com imagens de Lori Figueiró, pela
editora Ramalhete. É professora de Linguagens e mestranda em
Literatura Brasileira pelo CEFET-MG.
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por Rebeca Gadelha___
Curadoria: Taciana Oliveira
Esta zine surge da necessidade de movimento e da impossibilidade de continuarmos a ocupar as ruas, muros e repartições com arte, transportamos esta ocupação para o mundo digital. A proposta aqui é trazer a arte de isolamento para isolamento a fim de nos manter conectados não apenas com os outros, mas com nós mesmos. Dito isso, é traremos vários autores e autoras que, com seus versos, prosas, fotografias ou ilustrações nos falem sobre a poesia que (in)existe nesses dias em que quase esquecemos como é estar do lado de fora.
Rebeca Gadelha
Você
pode fazer o download desse arquivo: INTERNET ARCHIVES
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Tito
Leite (Cícero
Leilton) nasceu em Aurora/CE (1980). É autor do livro de poemas
Digitais do caos
(Edith,
2016) e Aurora de Cedro (Editora
7Letras,
2019). Poeta e
monge beneditino, é mestre em Filosofia pela Universidade Federal do
Rio Grande do Norte. Curador da Revista
Gueto.
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Rebeca
Gadelha nasceu
no Rio em agosto de 1992, cresceu em Fortaleza, na companhia dos
avós. Geógrafa sem senso de direção, artista digital, é
apaixonada por animes, mangás, games e chá gelado. Tem medo de
avião e a única coisa que consegue odiar de verdade é fígado. Foi
responsável pela diagramação, ilustrações e concepção visual
em Manifesto Balbúrdia
Poética: 80 tiros (CJA
Editora),
Coordenação,
Designer e ilustrações em
Laudelinas (Editora
Nada Estúdio Criativo),
participa
da coletânea Paginário,
publicada
pela Editora Aliás.
Atualmente
escreve para as revistas do Medium
Ensaios sobre a Loucura
e Fale com Elas sob
o pseudônimo de Jade
.
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Taciana Oliveira é mãe de JP, cineasta, torcedora do Sport Club do Recife, apaixonada por fotografia, café, cinema, música e literatura. Coleciona memórias e afetos. Acredita no poder do abraço. Canta pra quem quiser ouvir: Ter bondade é ter coragem.
por Taciana Oliveira __
Outro
mar é um ensaio fotográfico
produzido no ano de 2011, nos estados do Maranhão, Ceará e Piauí. O
fotógrafo mineiro, Patrick
Arley, nos oferece um registro
documental, um olhar poético sobre uma estrutura social e cultural
do sertão nordestino. Esta é a primeira série, de um total de
três, que iremos apresentar sobre o olhar etnográfico de
Patrick Arley.
Ensaio Outro Mar/Fotografia: Patrick Arley |
por João Gomes_
Hoje
se comemora os 77 anos do lançamento do livro "O
Pequeno Príncipe", de
Antoine de Saint-Exupéry,
para comemorar com um capítulo a mais, o escritor e cineasta Wilson
Freire lançou hoje um documentário sobre um dos colecionadores da
obra, o pernambucano Jaime Junior. Segue um trecho do depoimento do
diretor do filme, Wilson Freire, para o Mirada: “Fui
com a equipe de um cineasta só. Eu, tripé, uma steadicam manual,
para smartphone e um rebatedor. Esse equipamento, o smartphone, nos
dá essa possibilidade de sermos independentes, de não precisarmos,
para esse tipo de filme, em lugares pequenos, com luz ambiente, som
captado direto com um microfone lapela, também específico para o
aparelho, com um só personagem, principalmente sem nenhum recurso
financeiro de patrocínio, para pagar a outros profissionais.
Treinei, aprendi e pus em prática. Em uma manhã fizemos as
gravações e, logo em seguida, a edição. Tudo no smartphone.”
Wilson Freire, em um trecho da entrevista ao poeta João Gomes.
*A
entrevista completa você acessa aqui: João Gomes entrevista Wilson Freire e Jaime Junior
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João
Gomes
(Recife, 1996) é poeta, escritor, editor criador da revista de
literatura e publicadora Vida Secreta. Participou de antologias
impressas e digitais, e mantém no prelo seu livro de poesia.
por João Gomes__
O coronavírus é um assunto que não se esgota porque é uma grande ameaça a tudo e a todos. Anunciado no último dia do ano passado num alerta da OMS após notificação de autoridades chinesas a respeito de casos de uma misteriosa pneumonia na cidade de Wuhan, infelizmente sendo impossível de firmar aqui um número de infectados e óbitos pela grande tomada da pandemia, pois já estaríamos desatualizados, segue vitimando descontroladamente. Apesar da tristeza e medo gerais, reproduzo a sugestão que encontrei num post no Facebook: “Alguém poderia desinstalar 2020 e instalar de novo? Essa versão veio com vírus.” Um vírus que entrou chutando governos de todo o mundo, fazendo um estrago já comparado ao da Peste Negra e das duas Grandes Guerras. Chegado a poucas semanas nas Américas, o pior ainda está por vir.
Fonte; Cecom UNICAMP |
O coronavírus é um assunto que não se esgota porque é uma grande ameaça a tudo e a todos. Anunciado no último dia do ano passado num alerta da OMS após notificação de autoridades chinesas a respeito de casos de uma misteriosa pneumonia na cidade de Wuhan, infelizmente sendo impossível de firmar aqui um número de infectados e óbitos pela grande tomada da pandemia, pois já estaríamos desatualizados, segue vitimando descontroladamente. Apesar da tristeza e medo gerais, reproduzo a sugestão que encontrei num post no Facebook: “Alguém poderia desinstalar 2020 e instalar de novo? Essa versão veio com vírus.” Um vírus que entrou chutando governos de todo o mundo, fazendo um estrago já comparado ao da Peste Negra e das duas Grandes Guerras. Chegado a poucas semanas nas Américas, o pior ainda está por vir.
Nós brasileiros tivemos a chance que alguns países não tiveram de estabelecer o isolamento social o quanto antes para conter a disseminação do vírus, apesar de termos tido o Carnaval. Na Itália, por exemplo, no dia 23 de fevereiro, 45 mil torcedores foram a Milão assistir a uma partida de futebol pela Liga dos Campeões. Considerada como uma bomba biológica, Milão não parou, seguiu normal quando havia já 650 infectados. Um mês depois o prefeito da cidade reconheceu que errou em não ter aderido à quarentena horizontal (total e não apenas dos grupos de risco) quando hoje já passam de 1000 mortos no país. Não pretendo buscar culpados, mas a normalidade não pode insurgir quando o mundo todo segue as recomendações da OMS, que é a de ficar em casa.
Por aqui os números são baixos, mas sabemos que estamos no começo da pandemia. Justamente por isso e o que já era de se esperar, o discurso de políticos que não entendem nada de nada já vem deixando confusa a população, e a imprensa vem cada vez mais se defendendo e fazendo seu papel, o de informar. Não podemos totalmente chamar de ignorante o presidente, pois ele defende em primeiro lugar suas bases eleitorais. Quando ele desobedece as recomendações de quarentena, indo para manifestações que aglomeram seguidores, para firmar-se ainda mais como mito, ao lado de eleitores que dão suas vidas e de suas famílias pelo extermínio em massa, é tão óbvio que seja ele e não outro. Um governo que nunca fez pelo país não poderia ser diferente num momento de tamanha preocupação mundial.
Leio exaustivamente sobre o coronavírus, desde antes do momento em que se anunciava os vencedores das escolas de samba, e a vontade que sinto é só de chorar. Além da de poder ficar mais em casa, é claro, se eu pudesse e não precisasse fazer entregas de bicicleta por aplicativos para sobreviver. Não sinto vergonha por estar no quadro de pessoas em vulnerabilidade econômica, mas não é demais dizer que muitas outras classes trabalhadoras, como a dos artistas e do comércio também estão. O socorro emergencial é o mínimo que o Governo Federal pode fazer pela economia do país, não fossem os impostos que devolverão cada centavo do socorro que muitos acham que é bondade aos mais vulneráveis.
Os grandes empresários do país já cobram do presidente para reabertura do comércio, prometendo fechar vagas de emprego caso o isolamento não seja suspenso até meados de abril. Não é demais lembrar que o surto por aqui começará justamente neste mês. Teatros sem abrir ao público, salas de cinemas com lançamentos adiados, gravações de novelas interrompidas, escolas fechadas porque as crianças são as mais assintomáticas. Como a solução para os não especialistas em nada é sempre sacrificar a população em nome de uma economia que já não crescia mesmo sem a epidemia, a normalidade por meio sobretudo da reabertura do comércio assusta ainda mais a todos. Seria a quarentena vertical, não total, quando sabemos que pessoas de todas as idades podem vir a falecer por complicações da Covid-19.
Sendo um assunto inesgotável, que sacrifica hábitos, como o de poder mostrar afeto por não ser permitido nenhum tipo de contato, impõe recomendações técnicas contestadas por leigos. É realmente uma crise, e sem precedentes. Na etimologia latina crise significa momento de mudança súbita, enquanto na grega: ação ou faculdade de distinguir, decisão, momento difícil. Então não seria exagero, ou fantasia, chamarmos de crise do coronavírus, não considerando como gripezinha, ou algo que passa sem complicações. Você pode até não ter graves sintomas, mas contaminado pode levar a vida de pessoas ao fim, o que seria tão grave como sair dando disparos por aí.
O desgoverno atual defende o armamento, logo o extermínio da população por um vírus contagioso seria mais eficaz que qualquer tiro à queima roupa. Por isso o pior não se conta, tudo é levado com irresponsabilidade e o Estado não protege como deveria. Ou ao menos o Federal não faz isso, enquanto o regionais ainda tentam num diálogo com seus municípios. O mundo não está questionando quanto tempo será preciso ficar em quarentena, mas por aqui pessoas como a ministra da Cultura, atriz que ao aceitar o cargo afirmou estar se casando com o governo, não poderia fazer diferente. Em seu perfil do Instagram postou e já deletou um texto criticando a quarentena, com uma foto sua de guardanapo no rosto, ironizando a utilização de máscaras por pessoas com sintomas.
“Você quer ficar em casa? Tá OK!”, como se fosse um pedido ou forma de agradar seu novo patrão. Em resumo, seu texto defende a ideia de que, para ficarmos em casa, alguém tem que estar na farmácia, no posto de gasolina e na padaria. Realmente, há certa comodidade, eu por exemplo não a ofereço completamente aos clientes me recusando a subir até seus andares quando entrego pedidos de restaurantes. Mas o argumento do seu texto não é o de ter compaixão de quem está trabalhando, é o interesse econômico de quem investiu na bolsa, de quem apoia a exploração em massa. Da forma criativa como foi escrito, com uma lista quase interminável, perdendo somente para o silêncio e a falta de bom senso ao confundir a população quando a solução já está estabelecida em tentativa da segurança de todos.
Para não terminar totalmente com uma energia ruim como o desserviço à humanidade de pessoas assim, trago aqui o álbum “Planeta Fome”, de Elza Soares, que se for escutado nessa quarentena pode fortalecer as paredes da mente e trazer luz aos dias de dor em que estamos vivendo. Na canção “Comportamento geral”, ouvimos: Você deve rezar pelo bem do patrão / E esquecer que está desempregado. Em “Não tá mais de graça”, temos a resposta à sua canção “A carne”: A carne mais barata do mercado não 'tá mais de graça / O que não valia nada agora vale uma tonelada / A carne mais barata do mercado não 'tá mais de graça / Não tem bala perdida, tem seu nome, é bala autografada. “País do sonho” e “Pequena memória de um tempo sem memória” são de um otimismo capaz de expandir a luta por um mundo melhor. E mais, a maioria destas letras aqui citadas são de Gonzaguinha, algumas da época da Ditadura.
Ouçam Elza, não escutem declarações fascistas, apenas as recomendações médicas, como a do Presidente da Academia Nacional de Medicina, Dr. Rubens Belfort: “Saiba que o vírus se espalha como areia fina num vento forte para todos os lados. Portanto, fiquem em casa.” E com uma comparação que achei de uma eficiência imensa: “Não dá pra escapar de mil bolas de futebol todas elas vindo na sua direção. Você que tem de sair de campo agora, para mais tarde ganhar o jogo.”, completa. Não é o fim, há muita gente lutando ainda por um mundo melhor, mas pra isso cada um precisa fazer a sua parte e ser ainda mais responsável por si e por todos.
P.S.: E aos fascistas bolsonaristas, saibam que quarentena não é achismo. Vocês odeiam a mídia e consideram tudo como politicagem porque suas passeatas não atravessam sequer a esquina.
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João
Gomes
(Recife, 1996) é poeta, escritor, editor criador da revista de
literatura e publicadora Vida
Secreta.
Participou de antologias impressas e digitais, e mantém no prelo seu
livro de poesia.
por Ângelo Fábio__
Estamos focados no combate à pandemia do coronavírus
(COVID-19) e assistimos aos constantes absurdos, que também
considero como uma pandemia mental, do então Presidente da República
Jair Messias Bolsonaro. Além da incapacidade administrativa, da
falta de diálogo e da ausência de um real posicionamento como líder,
tudo que sai da boca deste indivíduo beira a estupidez, a insensatez
e ao desrespeito humano. Sobre vários aspectos em jogo, pontuo a
falta de recursos para saúde pública, o enfraquecimento do
desenvolvimento econômico do país, a estagnação de políticas de
fomento à cultura e o enfraquecimento de medidas pontuais para a
defesa do meio ambiente. Estes e outros temas afetam diretamente a
autoestima da nossa população. E mais uma vez o setor cultural sofre
perdas. As alternativas para contenção dos problemas para a
categoria são cada vez mais escassas. É
importante frisar que, em 19/03/2020, uma conferência online reuniu
gestores e secretários estaduais de cultura. Foram apresentadas
propostas emergenciais para a Secretaria Especial de Cultura do
Governo Federal, através de um documento formulado pelo do Fórum de
Secretários e dirigentes estaduais.
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Alvim e Goelbbes |
Da
unção ao discurso Nazista. Uma cortina de fumaça até a chegada do
pum produzido pelo palhaço.
Um
assunto que repercutiu bastante no cenário cultural, em janeiro deste
ano, foi o vídeo divulgado pela Secretaria Especial da Cultura, em 17/01/2020, onde o até então Secretário Especial da Cultura,
Roberto Alvim, copiou e adaptou trechos do discurso nazista,
proferido pelo ministro da propaganda Joseph Goelbbes (1897 -
1945+).
“A arte brasileira da próxima década será heroica e será
nacional, será dotada de grande capacidade de envolvimento
emocional, e será igualmente imperativa, posto que profundamente
vinculada às aspirações urgentes do nosso povo – ou então não
será nada”.
Tal
discurso gerou uma onda de indignação e rejeição por parte de
vários setores no Brasil e no exterior, inclusive pela Embaixada da
Alemanha, que publicou uma nota de repúdio. Um dia antes do fatídico
pronunciamento, Alvim apresentava ao presidente Bolsonaro as novas
diretrizes do programa de incentivo à cultura, um projeto criado
dentro de um perfil conservador e segregador. Após seu polêmico pronunciamento, Roberto Alvim é exonerado
da Secretaria Especial da Cultura.
Regina Duarte e Roberto Alvim |
Em
04 de março, de 2020, a pasta é assumida pela “Viúva
Porcina ou a “Namoradinha
do Brasil”, Regina
Duarte. Ela, uma efusiva lutadora
pelos interesses do agronegócio, é contra a demarcação de terras
indígenas, além de se posicionar a favor dos cortes na cultura. No programa Conversa com
Bial (29.mai.2019) na Rede Globo o
apresentador e jornalista comenta: “Regina,
eu tô me coçando pra dizer uma coisa… Se ainda tivesse ministério
da cultura, você podia ser ministra da cultura. Não tem mais
Minc*...”.
Regina completa: “Isso aqui não é meu não. Não é uma ideia
minha, mas é uma ideia que eu compro inteiramente, eu endosso. ME
CHAMA PRO CONSELHO TÁ!?...”.
Desde então tínhamos o prenúncio de sua possível entrada no
extinto Minc, que hoje se resume a uma mera secretaria sem rumo.
Em
momento prévio, antes do anúncio da sua nomeação, em rede social
Regina sinaliza que “estar de corpo e alma com o governo e vai dar
o melhor pela causa.” Não é nenhuma novidade que governos
radicais findam ações ou qualquer proposta de melhoria no setor
artístico. A pasta da cultura já havia sofrido uma tentativa de
extinção no governo golpista de Michel
Temer (MDB-SP). Na ocasião se
discutia uma reforma ministerial, sendo o Ministério da Cultura o
primeiro da lista para ser extinto. O Minc
apenas sobreviveu por conta da pressão de diversos movimentos
culturais e sociais. Artistas de todo o país lutavam e ocupavam
espaços em atos de resistência. Atuamos para que o Ministério
da Cultura se mantivesse de pé,
mesmo com diversos problemas.
Mas
aos poucos os movimento de resistência perderam a força. Por outro
lado um [grupo de artistas
brasileiros cria no ano de 2019, o Movimento Artigo 5º em defesa da
liberdade de expressão e contra qualquer ameaça de volta à censura
no Brasil. É um movimento coletivo espontâneo e suprapartidário do
qual participam cineastas, atores, grupos artísticos, diretores,
escritores, profissionais da moda, gestores culturais, jornalistas e
advogados de todo o país que trabalham voluntariamente pelo respeito
à Constituição Brasileira, nascida em berço democrático, vital
para existência das atividades criativas e para a preservação do
direito de ir e vir, ser e existir e da liberdade de pensar e se
expressar.] - Fonte:
https://www.artigoquinto.art.br/
Em
2019, com a chegada do governo da “Pátria
A(R)mada Brasil”, o fim do
Ministério da Cultura
é oficializado. Sobra a categoria a criação de uma secretaria,
medida semelhante a do governo Collor,
que em represália a classe artística impôs o autoritarismo.
Nasce
então a Secretaria Especial da
Cultura sob a gestão de Roberto
Alvim, ex-artista(?), ungido pelo
apóstolo e “profeta” Kevin Leal,
da Igreja Bola de Neve Church,
no bairro da Lapa, em São Paulo. Alvim apresenta uma “máquina de
guerra cultural”, talvez a partir daquele momento já servindo como
uma cortina de fumaça para abrir as portas a tantos descasos e
quiçá, a própria Regina Duarte.
O
pronunciamento “nazista” de
Roberto Alvim não foi gratuito, e
sim orquestrado. A entrada da Regina talvez seja um aporte à
barbárie da cultura. No discurso da oficial da sua posse, ela diz que:
“Cultura é aquele pum produzido
com talco espirrando do traseiro do palhaço”. A partir daí já conseguimos visualizar o tanto que ainda está por
vir.
Colaborou: Taciana Oliveira
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*Acesse a entrevista do programa Conversa com Bial: Globoplay: https://globoplay.globo.com/v/7653765/)
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Ângelo
Fábio, 1981.
Artista interdisciplinar e produtor cultural que trabalha com o
cruzamento das linguagens cênicas. Fundador do
Pós–Traumático,
Hemisférios Itinerantes
(AR/BR) e
Caosmo Cia. Experimental.
Estudou jornalismo de
investigação na Universidade
Popular Madres de la Plaza de Mayo
e Licenciatura Direção Cênica (UNA), Argentina, porém
não concluiu os estudos universitários. É
idealizador do Cineclube
Universo Paralelo e co-idealizador da
Mostra Periférica,
em Camaragibe.
Também já foi diretor do Cine
Teatro Bianor Mendonça Monteiro (2017/2018),
produziu o livro Bianor – Trajetórias e Memórias
e promove o Encontro das
Artes Cênicas de Camaragibe
(2017/2019). Como ator e diretor, integrou diversas companhias
artísticas no Brasil e outros países.