O Redemoinho | Wilson Freire

por Wilson Freire__

 

 


Pintura Mistureba: caneta esferográfica, giz de plástico e pastel sobre papel machê reutilizável - 20 X 30 cm 


(Da série Memória Secas)

 

Pingo do meio-dia. O Sol tinha bafo e calor das bocas das caieiras. Nem um pé-de-vento. Fervia, abrasava  pedras, esturricava matos, espantava  águas, engolia  bichos. Lá longe vi. Como um funil ligando céu e terra. Mexia-se como cobra em zigue-zague. Visagem minha? Reparei mais. Aproximava-se. Alargava a base e estreitava em cima. Dedos em cruz. Cruz credo. Nunca vi nada igual. Colossal. Arrastava garranchos, folhas secas, basculho, cruz credo, zunia, poeira nos olhos, credo em cruz, fechei as pálpebras. Quem pode mais do que Deus? Não estava mais no chão: rodopiava, cabeça pra baixo e pra cima, zonzo. Abri os olhos, entre eles: pintados, coloridos, redemoinho de penas, bicos, cores e cantos. Enganchei-me entre galhos de Braúnas e ele seguiu bailando, levando sonhos no eito, colorindo e bulindo, fertilizando minha imaginachã de árida existência.

 

 





Wilson Freire é natural de São José do Egito (PE), é médico formado pela Universidade Federal de Pernambuco, pós-graduado em endoscopia digestiva e gastroenterologia, pela Universidade de Münster, Alemanha, produtor cultural, poeta, cordelista, roteirista, cineasta e compositor. Participou das coletâneas: “Novo Conto Português Brasileiro” PUTAS, Quasi Edições – Vila Nova de Famalicão/Portugal (2002), “Os Cem Menores Contos Brasileiros do Século”, Coleção Cinco Minutinhos Ateliê Editorial – São Paulo (2004). Ecreveu: “A Mulher que queria ser Micheliny Verunschk”, Edith (2011), “Haikaiando”, Candiero Produções (2012) e “A Última Voz”, Mariposa Cartonera (2015). Dirigiu os filmes: “Miró: Preto, Pobre, Poeta e Periférico” (2008), “Zé Monteiro, O Homem que venceu as Cinco Mortes” e o longa metragem “Nelson Barbalho, o imortal do País de Caruaru.” – 2014.