por Patrícia Baldez__
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por Marcello Quintanilha / @marcelloquintanilha / @l.delula |
“Foi tão rápido, brutal e incompreensível que precisei de algumas horas, das testemunhas e das imagens das câmeras de segurança para entender o que de fato aconteceu. Quer dizer, acho que nem isso. Sigo sem entender” - afirmou JC, 12 horas depois, no hospital, ainda em choque.
Exatamente uma semana antes do primeiro turno das eleições de 2022, ocorreu o fato que escancara nosso tempo histórico. Nesse mesmo final de semana, por todo país, aconteceram eventos que podem ser qualificados como violência política - alguns inclusive resultando em morte. Mas esta narrativa que aqui relato tem algumas alegorias importantes para análise do presente.
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Domingo, 23h30, capital cearense, drive-thru de uma grande rede de lanchonetes estrangeira. Por lá, um rapaz com adesivo de seu candidato a presidente afixado na camisa passava a pé para comprar o lanche que evitaria a ressaca de uma segunda-feira cheia de compromissos. Andava acompanhado de um pedinte, a quem tinha prometido aplacar a fome que avassala nosso país. De repente, um homem forte desce do carro à sua frente (desses sedans que sequestraram nossa bandeira), arranca-lhe o adesivo, olha em seus olhos e com um só soco o nocauteia.
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Alguns dizem que a bandeira não será vermelha. Estão certos. Já está. Já é.
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JC estava feliz com o domingo que teve muitos eventos pela cidade em apoio a candidaturas de esquerda, o espectro político de sua preferência. Foram cheios, amorosos, divertidos, daqueles de renovar esperanças e fazer voltar a crer - inclusive nas pesquisas e, em consequência, na ciência.
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Hoje em dia, parece que ser feliz, brilhar uma estrela, incomoda a alguns. Pena que esses alguns não são poucos.
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Ao chegar em casa, talvez uma hora depois, JC lembrava-se de quase nada: da dor que sentiu ao caminhar, do rosto do agressor, de que uma mulher desceu do carro e falou com o homem que lhe batia. Tinha tentado ajudar, certamente, pensava. No dia seguinte soube, pelas imagens e testemunhas, que, ao contrário, a moça bela e do lar gritava: bate mais, ele merece!
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JC - que representativamente é gay - foi defendido pelo morador de rua que o acompanhava. Se não fosse ele, e só ele, a se levantar contra a violência e atirar uma pedra no precioso carro do homem de bens, a história que aqui conto poderia ter desfecho ainda pior. O troglodita cessou o espancamento para proteger seu veículo, não sem antes desferir um soco no destemido mendigo.
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A dupla, contam os entregadores da região, ainda esperou pelo alvo de seu ódio numa esquina próxima. Esses mesmos entregadores os teriam abordado e os feito fugir. O que mais se esperar de covardes, não é mesmo?
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Por falar em covardia, gostaria de destacar que a grande empresa em cujo estacionamento os fatos ocorreram, em cujas câmeras foi registrado, essa nada fez: nem na hora, com uso dos seguranças de que dispõe; nem depois, buscando ativamente denunciar. Mas seria injusta. Soube-se, depois, que toda a equipe se escondeu no interior da loja, deitada ao chão, porque o agressor ameaçou quem ousasse ajudar com tiros. Sendo justa, a verdade é que, passado o susto, o gerente daquela noite é a principal testemunha, voluntária, do caso.
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Ainda domingo, em casa, atordoado, decidindo entre ir prestar queixa ou ir ao médico, JC apagou. No dia seguinte, a dor decidiu que seria hospital antes de delegacia. Como era possível imaginar pelo inchaço, o tornozelo estava fraturado. Teve de passar por uma cirurgia. Está com placa e pinos. Está bem.
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O truculento casal servirá de exemplo a seus pares. Acredito que queriam forçar o contrário, que desejavam causar medo, mas o tiro saiu pela culatra. Como diz O Rappa, “também morre quem atira”.
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Se quiserem conversar, venham!
Se só tem punho, saibam: nós não temos medo!
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Uma semana após o ocorrido, saberão que de nada adiantou o arroubo irracional. Aliás, nenhum dos vários que provavelmente se autorizaram nos últimos quatro anos. Não vai ser no tapa que vão tirar nossos sonhos.
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Se pareceu que JC estava só e indefeso, perceberão o erro da análise que a ausência de razão geralmente acarreta: ele não estava só; ele nunca esteve!
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E aquele domingo não terminou ali.