Cinco poemas inéditos de Manoel Tavares Rodrigues-Leal

 por Manoel Tavares Rodrigues-Leal





I

da água. o cantante fogo.

se nomeio o nome. o mundo. o rosto.

como. em amor. afago ou afogo

o fogo. o desastre. o mosto.

como. em nome. fornica

o fogo se desejo. distância tecida e antiga.


Lx. 14–2–75


II

e há a escassez do olhar.

que mergulha. e não vence

os degraus da combustão.

e as escamas das coisas. (em uma manhã de verão. linear)

e inerte. inerte. o chão. que se lê e tece. em vão.


Lx. 17–2–75


III

é intemporal a leitura.

e múltipla. como flores inocentes. inscritas.

agudo pranto. se descrentes.

no que lês. no que suspendes.

no que ouves. no que teces.

de temporal. de nascente. voz nascitura.

na arquitectura como aves. te moves.

se morrendo nos instantes. como morres.


Lx. 27-2-75


IV

às flores. mútuas. me refiro.

perfume antigo.

do teu corpo seios rosto.

mãos de mármore. se mar.

e se digo.

asas de ausência. hera de amor.

e. se amando. a nudez amar.


Lx. 1-3-75


V

colhei as rosas recentes.

com seu brilho. sua alvura.

com seu halo. sua aventura.

contentes as rosas rubras. e tangentes.


Lx. 29-3-75


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*  Coligidos do caderno Voz Equívoca (As Flor
es Eloquentes) por Luís de Barreiros Tavares










Manoel Tavares Rodrigues-Leal (Lisboa, 1941-2016) foi aluno das Faculdades de Direito de Lisboa e de Coimbra, frequentando até ao 5.º e último ano, mas não concluindo. Em jovem conviveu com Herberto Helder no café Monte Carlo frequentando com ele “as festas meio clandestinas, as parties de Lisboa dos anos 60 e princípios de 70”. Nesses anos conviveu também com Gastão Cruz, Maria Velho da Costa, José Sebag, entre outros. O seu último emprego foi na Biblioteca Nacional, onde trabalhou durante longos anos (“a minha chefe deixava-me sair mais cedo para acabar o meu primeiro livro, A Duração da Eternidade”). Publicou, a partir de 2007, cinco livros de poesia de edição de autor. As suas últimas semanas de vida foram muito trágicas, morrendo absolutamente só.