Filhinho do brazil, um conto de Adriano Espíndola Santos

 por Adriano Espíndola Santos__




“Nada mais adequado à consciência do que estar com a verdade”, é o que minha mãe sempre fala nas nossas conversas nos fins de tarde, com um bom cafezinho e biscoitos franceses, ao pé da mesa de jantar. Herdei o senso pelo correto da minha família materna. Meu pai, coitado, era um esbanjador contumaz: pródigo. Nossa vida “melhorou” financeiramente, de fato, quando ele morreu. Foram vendidos cinco carros, quatro motos e dois quadriciclos, que ele usava na nossa casa de praia – esta também vendida. O dinheiro, em parte, serviu para pagar as dívidas, que somavam meio milhão de reais. Dizem que, por ele não ter nada na infância e juventude, adquiriu a síndrome da luxúria, para descontar o tempo ($) perdido. Dona Lourdes Fuentes, minha querida mãe, é muito prudente; vive ainda de reservas. Foi professora universitária e, com isso, complementa a renda, que serviria facilmente para uma prole bem numerosa, se fosse o caso. Como sou autônomo, ou profissional liberal – uma designação mais chique –, dependo, invariavelmente, de sua bondade. Recebi de herança dois imóveis, que não suprem os meus gastos; portanto, mamãezinha me confere uma quantia mensal, como mesada, no patamar de sete mil reais. Raramente uso o dinheiro para aventuras. O máximo que faço, para desopilar, é viajar para os Estados Unidos, mais precisamente Miami, para comprar umas bugigangas e/ou participar de conferências sobre o conservadorismo/liberalismo. Tenho me aprofundado no tema, para, quem sabe, me candidatar a um cargo público, porque tenho muito boas ideias – e ideia é poder. Quero fazer mais para a população que labuta na iniciativa privada, principalmente para os empresários, massacrados com tantos impostos. O governo comunista está aí. Inimaginável foi ter alcançado o poder. Ainda hoje me dói a forma pela qual nossa nação foi assaltada por esses corruptos. Mamãe pediu para que não fosse ao evento do dia oito de janeiro, mas fui, descumprindo a sua determinação, pelo bem da nação. Sofro um processo capitaneado por um figurão associado ao comunismo – não posso revelar o nome, sob pena de ser ainda mais penalizado. Tendo receio de uma possível prisão, faremos, eu e mamãe, uma viagem alongada para a Itália, país que nos concedeu a nacionalidade; terra de um grande político injustiçado, morto em praça pública: pelos comunistas. Falo a verdade, como bem aprendi, doa a quem doer; tenho princípios: em breve venderemos os nossos bens, doze, e aplicaremos o dinheiro, que ficará nas nuvens, dourando à luz do sol, para que possamos curtir a nossa merecida liberdade na terra prometida, apartados das desgraças do Brasil, como sendo um primo pobre esquecido; amparados pelo
Sir Trump – ainda detentor de um poder mundial –, meu mui amigo, que conheci numa dessas conferências. A verdade prevalecerá.




Adriano Espíndola Santos
 é natural de Fortaleza, Ceará. Em 2018 lançou seu primeiro livro, o romance “Flor no caos”, pela Desconcertos Editora; em 2020 os livros de contos, “Contículos de dores refratárias” e “o ano em que tudo começou”, e em 2021 o romance “Em mim, a clausura e o motim”, estes pela Editora Penalux. Colabora mensalmente com as Revistas Mirada, Samizdat e Vício Velho. Tem textos publicados em revistas literárias nacionais e internacionais. É advogado civilista-humanista, desejoso de conseguir evoluir – sempre. Mestre em Direito. Especialista em Escrita Literária e em Revisão de Textos. Membro do Coletivo de Escritoras e Escritores Delirantes. É dor e amor; e o que puder ser para se sentir vivo: o coração inquieto. instagram:@adrianoespindolasantos | Facebok:adriano.espindola.3 email: adrianoespindolasantos@gmail.com