Distimia #2 ocupa a Casa Lontra e reúne nomes da música experimental do Nordeste


Distimia #2 ocupa a Casa Lontra e reúne nomes da música experimental do Nordeste


A Casa Lontra recebe, no dia 23 de agosto, a segunda edição do Distimia, encontro dedicado à música experimental que propõe experiências fora dos formatos tradicionais de shows. A partir das 20h, o espaço abre as portas para uma noite em que improviso, risco e criação coletiva serão os protagonistas. A entrada é colaborativa, no modelo “pague quanto quiser”. O evento traz ao Recife quatro artistas de diferentes trajetórias: Renê Freire (PE), CH Malves (SE), Túlio Falcão (PE) e Marcelo Cabral (SP). A programação será dividida em quatro atos: solos individuais de Renê e CH Malves, seguido do duo entre Túlio e Marcelo Cabral — conhecido pelo trabalho ao lado de Juçara Marçal e do grupo Metá Metá. O encerramento une todos os músicos em uma performance conjunta e inédita. Segundo Renê Freire, também organizador da iniciativa, o Distimia se conecta a uma rede de artistas que vêm fortalecendo a cena experimental no Nordeste. “A ideia é tirar o som da prateleira e trazer para a experiência real, onde ele pode falhar, incomodar, surpreender”, afirma o pianista, que transita entre o piano contemporâneo e referências da produção experimental brasileira dos anos 2000.


Ele destaca ainda que o evento é parte de um movimento que articula artistas independentes em redes colaborativas, inspiradas em projetos como Rumor, Muído, Entre Lugares Sonoros (BA) e Artesanato Furioso (PB). “É como uma teia viva tecida a partir da troca, da confiança e da vontade de oferecer um espaço de expressão”, diz. O baterista sergipano CH Malves, cuja pesquisa atravessa jazz, hip hop e experimental, reforça o caráter de investigação sonora que marca o encontro. “Sempre vi a bateria sendo usada como apoio. Aqui, ela é o ponto de partida: rítmica, sensorial e física, buscando outros usos e sentidos”, explica.





Já o pernambucano Túlio Falcão explora combinações entre guitarra, computador e softwares de síntese sonora, numa proposta que mistura eletrônico, eletroacústico e improviso. Ele se apresenta em duo com o baixista paulista Marcelo Cabral. “O Distimia é um espaço de criação fora da lógica da indústria. Um movimento feito por quem não espera por editais ou curadorias externas, mas se organiza por conta própria. É libertário, aberto, realmente independente”, reforça. Com solos, colaborações e encontros sonoros únicos, o Distimia #2 aposta na liberdade criativa e na experimentação como força motriz de uma cena musical que se articula para além do mercado e das regras de formato, firmando-se como espaço de resistência e invenção artística.


SOBRE OS ARTISTAS


Renê Freire (PE) | Pianista, compositor nascido em Caruaru e radicado no Recife, pesquisa relações entre piano contemporâneo, improvisação livre e arte sonora. Mestre em Composição pela UFPB, integrou o trio Adamante e lançou os álbuns Nevroses (2020) e Átrio (2022). Atua em redes e selos experimentais no Nordeste e Sudeste.

Túlio Falcão (PE) |  Guitarrista com atuação solo e em grupos como a Camerata dos Pés Juntos. Trabalha com guitarra processada ao vivo, síntese sonora e colagem eletroacústica desde os anos 2000. Explora o som como gesto e investigação estética, além de criar trilhas e performances ao vivo.

CH Malves (SE) | Baterista com formação entre jazz, hip hop e música experimental. Pesquisa a bateria como linguagem central e criativa, rompendo com o papel tradicional de acompanhamento.

Marcelo Cabral (SP) |  Baixista, produtor musical, arranjador e compositor. Trabalhou com Juçara Marçal, Criolo, Elza Soares, Daniel Ganjaman e as bandas Metá Metá e Passo Torto, entre outros.




carta-manifesto distímica #2


(pra quem escuta com o osso e com o peito)

Recife é uma cidade que chia.


Chiado de poste, freio de busão, rádio torto na calçada, maré batendo na estiva. Aqui, o som sempre veio atravessado — nunca limpo, nunca fácil, nunca dentro da caixinha. E ainda bem.


No dia 23 de agosto, a Casa Lontra — esse canto de respiro no meio da cidade agitada e fedida — abre as portas pra mais uma noite de rasura e entrega com o Distimia #2.


Mas vá com calma: isso aqui não é um show, nem festivalzinho de nicho.


É uma escuta coletiva. 


Ruído em estado de partilha.


Fresta de som onde a ordem é o desvio.


Não espere palco. Nem espetáculo.

É o som bruto, do corpo, da tentativa, da pesquisa que não pede permissão.


A tal música experimental — que já foi tida como marginal, depois gourmetizada, agora volta como urgência — é onde a arte vira ensaio, onde o ruído diz mais que a melodia.


É pesquisa com o ouvido.

Afinação com o corpo.

Composição da dúvida.


Som como gesto político, como tentativa de vida fora da performance e dos conceitos reciclados que já perderam a graça antes mesmo de serem ditos.


Porque esse movimento não brotou ontem.

Desde os anos 2000, uma rede subterrânea vem se formando no país — discreta, autônoma, atravessando as brechas.


Artistas, selos, espaços autogeridos, encontros, oficinas, coletivos.

Gente que decidiu pensar o som fora da lógica de mercado, fora do hype, fora da playlist.


Só que aqui a coisa tem cor de barro, sotaque de esquina,


improviso com cheiro de suor e mangue.


Calor abafado.

Caos civilizado.


Distimia é aquela cutucada no ouvido de quem ainda sente quando o chão treme.

Uma fissura na escuta.


Para quem acha que já viu (ou ouviu) de tudo, é a chance de se perder. Ou talvez encontrar outro tipo de sentido, além do que o ouvido entende.


Se você leu até aqui e não entendeu nada, está tudo bem.

A ideia nem era explicar.


Porque o som, quando é verdadeiro, a gente não entende: a gente sente.


E se for para buscar um significado, que seja do seu jeito. 

Aqui ninguém quer impor nada.


Arte que se preza não é pra agradar.

É deslocamento. Pulso. Inquietação.

Desentendimento produtivo.

E provocação das multi perspectivas possíveis.


Que assim seja.


DISTIMIA #2


SERVIÇO: 

Distimia #2 

Casa Lontra (Rua Bispo Cardoso Ayres, 72, Boa Vista, Recife-PE) 

Sexta-feira, 23 de agosto de 2025, às 20h  

Entrada colaborativa \ Pague quanto quiser

Mais informações: @casalontra