por Germana Accioly__

 

Foto de Kat Smith no Pexels



 por Yvonne Miller__


Fotografia: Nacho Rochon


 

por Marcela Güther/Divulgação__

 


por Marcela Güther/Divulgação__

 



 

por Marcela Güther/Divulgação__



 por Divulgação__

 


 

por Taciana Oliveira__

 


 por Taciana Oliveira __



 por Adriane Garcia__


 

por Marcela Güther/Divulgação__



 por Dias Campos__



Foto: Tai's Captures



                                                                                                                 Zadig



            Ontem tive que enfrentar uma situação muito arriscada.


Mas ao contrário do que se poderia imaginar, ela não ocorreu porque me esqueci de colocar a máscara quando fui ao supermercado, porque não passei álcool gel durante o período em que estive fora, ou porque fui obrigado, pelas circunstâncias, a enfrentar um ambiente aglomerado.


As minhas costeletas volumosas aliadas ao confinamento que nos foi imposto é que foram as causas de tamanho risco.


É compreensível, leitor amigo, que você tenha enrugado a testa.


O desenrolar desta crônica, todavia, fará com que você compreenda aquela afirmação.


            Éramos recém-casados. No apartamento faltavam ainda alguns móveis e globos nas luminárias. E como os nossos salários não admitiam esbanjamentos, por um bom tempo as únicas quatro cadeiras revezaram-se entre as salas de jantar e de estar, e as lâmpadas de 60 W irradiaram mais luz do que deveriam.


Filhos? Não passavam de hipóteses remotas.


            Mas vivíamos muito felizes, como era de se esperar.


            É claro que os gostos e os hábitos trazidos da vida de solteiro tiveram que sofrer as naturais adaptações.


Assim, se antes o guarda-roupa era só meu, depois de casado tive que abrir mão de (várias) gavetas; se antes eu usava a mesma faca para passar no pão o requeijão e a geleia, depois de trocadas as alianças tive que me acostumar com uma faca para cada pote. E por aí vai. – Aproveito a oportunidade para protestar, pois até hoje reivindico pelo menos mais um gaveta!


Só que existem certas práticas que são impossíveis de serem alteradas.


Por isso, mesmo indo morar em bairro distante de onde vivia, não deixei de ir ao barbeiro que frequento há mais de trinta anos.


Não vou negar que, por causa da distância, cheguei a pensar em procurar outro barbeiro. Até porque, há os que cobram menos, os que são mais rápidos, e os que servem desde cafezinho até champanhe (desde que pague).


Esse pensamento jamais se concretizou, pois como nunca mudei o penteado, nem preciso dizer a ele o que quero. É só me sentar, pôr os assuntos em dia, e aguardar o resultado, que sempre me agradou.


Certo dia, porém, um presente que ganhei foi suficiente para que outras mãos substituíssem as do meu barbeiro.


 Minha mãe acabara de chegar de viagem do exterior. Ao passar pelo free shop, viu um cortador de cabelo recarregável, e se lembrou deste cronista.


O presente vinha bem a calhar, pois o momento por que passávamos pedia que apertássemos um pouco os cintos.


Por conta disso, perguntei para minha esposa se ela toparia dar uma de barbeiro.


Essa ideia a deixou um pouco receosa. Afinal, ela nunca manejara tal engenhoca.


Mas como enfatizei que faríamos uma boa economia, o receio se foi, e ela aceitou o desafio.


Sentei, então, de costas, inclinei a cabeça, e pedi para que começasse a aparar de baixo para cima, como sempre fez o meu barbeiro.


Ocorre que a maquininha tinha mais beleza do que potência, pois longe estava de ser um cortador profissional.


Apesar desse mero detalhe, insisti para que prosseguisse.


Entretanto, o aparelho não deslizava como supunha, o que obrigava minha esposa a aumentar a pressão contra a minha cabeça.


E de pressão em pressão, o terreno foi sendo vencido.


Devido à falta de prática, que impunha lentidão no cortar, as baterias logo gastaram, e o cortador perdeu a serventia.


E a experiência teve que ser suspensa.


Só que uma área razoável já tinha sido cortada. Nada mais natural, portanto, que quisesse conferir o seu trabalho; mesmo que, para isto, tivesse que me contorcer na frente do espelho.


Quando me virei para falar com minha esposa, notei que seu semblante não refletia a felicidade dos que se sentem orgulhosos.


E gelei!...


Levantei e fui ao espelho. E o que consegui identificar foi de partir o coração...


Eram degraus! Sim, o que minha esposa conseguiu foi esculpir vários degraus na parte de trás da minha cabeça!


Em um primeiro momento, meus olhos se arregalaram, e minha voz simplesmente sumiu.


Em seguida, levei a mão direita até aquela escada, na intenção de comprovar com o tato aquilo que minha visão já tinha constatado.


Com o passar dos segundos, contudo, meus olhos retornaram às órbitas, e minha voz reapareceu; se bem que ainda trêmula.


Minha esposa até quis se explicar.


Não precisou. Deixei claro que ninguém tinha culpa.


E o que se há de fazer quando nada mais pode ser feito? Chorar ou rir.


E preferimos a segunda opção.


Mas o estrago aí estava, e precisava ser contornado.


Pois tomei coragem, retornei ao meu barbeiro, e dei uma desculpa tão esfarrapada que nem um tolo acreditaria.


É claro que ele, experiente que só, em nenhum momento acreditou na minha justificativa; tanto que percebi a sutileza com que levantou o canto esquerdo da boca.


Mesmo assim, arrumou o quanto pôde.


E o que tudo isso teve a ver com o que afirmei no início deste texto?


Ora, por força da quarentena, todos sabemos que só deveremos sair de casa por motivos imperiosos – os ligados às atividades essenciais.


E pelo que sei, cortar cabelo não faz parte desse rol.


Daí que, não apenas o meu cabelo já estava para lá de comprido, como, também, faltava muito pouco para que as minhas costeletas fossem confundidas com suíças.


Pois adivinha, amigo leitor, qual foi a situação arriscada que tive que encarar ontem? Sabedora de que fico bastante incomodado quando as costeletas se avolumam, minha esposa se ofereceu para apará-las.


E gelei mais uma vez!...


            Não obstante o tremendo arrepio, o jeito foi aceitar que ela se aventurasse de novo. Só que desta vez, manuseando uma tesoura para unhas, pois me livrei daquele cortador tão logo surgiu ocasião.


            Depois de alguns minutos, e de muita tensão, o saldo até que foi satisfatório. – Ufa!


            De outra parte, tudo indica que a vacina contra a covid-19 demorará, em que pese já divisarmos luz no fim do túnel.


Por consequência, o isolamento social provavelmente será mantido, mesmo que flexibilizado.


Disso resulta que a barbearia, que já estava com as portas fechadas, talvez nunca mais reabra. – espero esteja enganado!


Seja como for, o meu cabelo continuará a crescer.


            Diante desse quadro, prevejo mais um risco, e por certo muitíssimo maior que o anterior: E se minha esposa ficar empolgada com o sucesso obtido com as costeletas e decidir estender o seu pequeno triunfo?


Bem, se isso acontecer, de duas, uma: Ou submeterei a minha basta cabeleira à sua tesourinha, ou terei que me acostumar a ir dormir no sofá. – Conhecendo-a como a conheço, não há uma terceira hipótese.


No entanto, por medida de precaução, antecipo que preces envolverão cada uma de suas tesouradas. É que seria terrível descobrir ao final uma escadaria serpenteando minha cabeça.





Dias Campos, paulistano da gema, é romancista, contista e cronista. Entre outros títulos, destacam-se o de Embaixador da Paz, pela Organização Mundial dos Defensores dos Direitos Humanos - OMDDH, o de Embaixador da Literatura, pela Corte Brasileira de Letras, Artes e Ciência - COBLAC, o de Ambassadeur Honneur et Reconnaissance aux Femmes et Hommes de Valeur, pela Luminescence Académie Française des Arts, Lettres et Culture-Literarte, e o de Embajador de la Palabra, pela Asociación de Amigos del Museo de la Palabra. É vencedor de muitos Prêmios Literários, membro de diversas Academias Literárias e Colunista e Colaborador de várias Revistas, Jornais e Blogs Literários.


 por João Gomes__

 


 

por Émerson Cardoso__




 

por Germana Accioly__


Fotografia:Germana Accioly

 por Divulgação___

 


 por Yvonne Miller__

 

Foto: Mikhail Vasilyev

 

por Divulgação__



 por Adriano B. Espíndola Santos__

 


Fotografia: Dan Farrell


 

por Taciana Oliveira __


Oswaldo Goeldi


Santa Catarina

 

Um operário espirra algumas vezes, seu nariz coça,

Ele reluta, tenta conter o incômodo.

Na câmara fria uma parte do teto desaba,

O gelo trincado fere a cabeça do trabalhador.

Soam o alarme, a porta é aberta.

- Querem morrer? Por que não tentam trabalhar direito?

O jovem ferido é arrastado para fora, convulsiona.

A ambulância vem buscá-lo.

Ele retorna ao expediente após três dias de atestado médico;

Uma semana depois é chamado a comparecer no Departamento Pessoal.

Voltará mais cedo para casa.

Nas fazendas de soja o imigrante é útil,

Não há lirismo algum em suas frases curtas.

Pronúncia precária.

- manman, papa, frè...

- Zanmi! Zanmi!

O supervisor o manda calar a boca.

- fatige soti

- Dívida! DI VI DA, PA TRÃO! VO CÊ TEM DÍ VI DA! Entendeu?

Marrom é a cor da luta e do preconceito no Vale Europeu.

 

 

Alzheimer

 

O Senhor Geraldo segue seu caminho com uma boneca ao colo.

Seus passos são lentos e largos, parece intrigado e tenta pisar no centro de sua sombra.

Súbitos emocionais de sua infância se confundem com a realidade presente.

Como dói amanhecer órfão em sua velhice!

Num impulso, ele abre os braços;

Alícia cai de costas. Ele se apavora, uma vizinha se apressa para ajudá-lo.

Ele chora, precisa socorrer sua bebê, não permite que a vizinha se aproxime.

Está desesperado, implora o perdão de Alícia. 

- Sua mãe vai ficar furiosa, minha criança!

Ampara-a e retorna correndo para casa. A filha o encontra, estava a sua procura.

- Paizinho! O Senhor saiu sem avisar.

- Zema, veja! Ela caiu! Ela caiu do meu colo. Foi o velho no chão! Eu estava tentando acertar sua barriga, mas ele continuava, Zema! Ele continuava...

- Pai, eu sou Alícia, estou aqui, estou bem. Vem, paizinho!

- Não, Zema!  Ela está tão calada, não diz nada, e nem chorou ao cair... A nossa menina bateu a cabeça, bateu forte no cimento. Havia a sombra de um homem no chão, a nossa frente, era a imagem escura de um velho, e ele a levava abraçada contra seu peito. Eu quis salvá-la! Vamos! Vamos! Precisamos de um médico!

Alícia chora e o abraça:

- Ela está bem, não precisamos de um médico.

Não! Não, Zema! Não somos nós. É a menina, a menina precisa. É para ela...

Será crueldade da noite devolvê-lo com aparente sarcasmo aos seus dias de sol?

Todos esperamos o milagre de uma morte calma, sem sustos.

Sem sustos!

O Senhor Geraldo divaga nos fragmentos de sua essência.

Riso a riso, dor a dor, pedra a pedra...

Abandona-se sem limitações ao passado.

O esquecimento é um antídoto transgressor, atua muito além da névoa fria da decomposição física.

Que os nuncas de suas memórias jamais o abandonem!

Adeus às tristes verdades!

Bem-vindas as adoráveis ilusões!

 

 

Insciência

 

Floresce o lodaçal.

Quem de lá vem?

Duas idosas de mãos dadas.

Acompanho a lentidão de seus passos diante de meu portão.

Quem conduz quem?

Um carro de som anuncia: "Adorados Irmãos, é amanhã às 20 horas. Venha e receba a unção do livramento! Convide seus familiares para a Campanha da Redenção com o Pastor sergipano Malaquias de Cristo, na Igreja Amantes do Altíssimo".

"Malaquias do Diabo?". Penso. "Malaquias fdp!". Penso.

- Amém e aleluia! Grita a vizinha erguendo os braços e aplaudindo a vinda do impostor. "EEEEE... O Pastor Malaquias de Cristo vem! Glória ao Pai!".

Minha boca espuma.

Estou louca?

Sairei e seguirei em direção ao lago,

Quero ver sua película verde mais espessa do que na semana passada.

Desde que espalhei o boato da maldição do lago, ganhei-o da ignorância comunitária.

Está sempre mais, e mais, e mais belo. Há um ciclo perfeito em sua vitalidade.

Ninguém mais perturba a paz de suas criaturas, a vegetação o circunda autoritária.

Se cheirar adoece!

Se tocar adoece!

Se entrar morre!

Joaquim morreu por tentar se exibir: afundou, prendeu a respiração, morreu.

Que bom que Joaquim morreu! Estava matando seus filhos, sua esposa, antecipando mortes outras.

Tantas!

Mas, muito bem, Seu Joaquim! O senhor morreu.

E não é que choraram sua morte? A própria Edra foi capaz de dizer durante o velório: "Ele era daquele jeito rude, mas era bondoso".

Mentirosa!

Sigo!

Estou cada vez mais perto.

Choro o Deuzebu pisando em minha sombra abstrata.

Sou um leve vulto entre folhas, ramagens, orquídeas, bromélias...

Ali está! A loucura jaz em sua superfície e profundeza.

A loucura da morte que sustém a vida

Beijo levemente seu veludo verde.

Meu coração pulsa.

Um dia morreremos.

Sobreviverá a selvageria virtual? A intolerância ambiciosa dos imbecis?

 





Laila Zanov
: natural de Itajaí, SC, é poeta, cronista, contista, roteirista; senhora de muitas fobias e de algumas ousadias. A loucura, o preconceito, a solidão, a morte, a noite são temas recorrentes em sua arte poética. Zanov escreve desde a adolescência, mas suas primeiras publicações datam de julho deste ano. Referência da imagem:   Kees Van Dongen - The Corn Poppy, c. 1919 







por Rebeca Gadelha__


Foto: Anastasia Taioglou