Três poemas de Deborah Dornellas

  

por Taciana Oliveira__


Foto: Yu Kato


CAMINHOS

 

estão me faltando pedaços

é o efeito do tempo

frágeis alegrias já não me sustentam

coisas úteis

se fugazes

se desprendem e caem do fio das certezas

piso nelas e me machuco

mas meus pés criam casca

 

 


 

LONGE

 

ausência é assombro

corte na casca do tempo

presença do avesso 

copo vazio 

corpo endereço 

ausência é cisterna seca

pântano movediço 

cais sem trapiche 

labirinto sem fio

fio sem prumo 

noite sem dia 

fruta sem sumo

 

ausência é teu ombro

longe da minha cabeça




 

TEMPO

 

1

na casa antiga: moscas larvas vermes mofo

um véu delgado sobre as coisas

frutas secas doces

muito mais doces porque secas

sementes que não germinam 

e apodrecem novas

dias que guardam noites de insônia e febres

galos remotos e sinos repicando as horas

 

2

acorda levanta anda olha urina lava escova come veste sai entra volta senta assiste come dorme acorda boceja levanta anda despe defeca limpa lava enxuga veste come anda anda xinga volta come sonha chora dorme acorda lembra esquece 

envelhece

 

3

nasceu entre fluidos

vive entre flechas

morrerá entre flores







Deborah Dornellas é brasileira. Nasceu no Rio de Janeiro e migrou com os pais para Brasília, onde cresceu. De 2011 a 2019, viveu em São Paulo. Escritora, jornalista e aprendiz de artista plástica. Mestra em História e pós-graduada em Formação de Escritores. Em 2012, publicou Triz (In House), reunião de poemas. Desde 2013, integra o Coletivo Literário Martelinho de Ouro. Tem poemas, contos e ilustrações publicadas em diversas revistas literárias (Pessoa, Mallarmargens, Germina, Gueto, Diversos Afins, Ruído Manifesto, Escrita Droide, Laudelinas, entre outras). Seu romance de estreia, POR CIMA DO MAR (Patuá, 2018), foi finalista do Prêmio São Paulo de Literatura 2019 e venceu o Prêmio Literário Casa de las Américas 2019, na categoria “Literatura Brasileira”.