A bomba | Mayk Oliveira


por Mayk Oliveira__

 

Foto:Karen Khafagy

Eu gostava mais do Senhor L. quando ele não estava tentado me matar. A última vez que isso aconteceu foi ontem à noite. Estava voltando da faculdade com uma bolsa abarrotada de fotocopias xerocadas de livros quando ele estacionou a moto em minha frente. Pense como eu fiquei naquele momento! Quase tive um infarto quando pulei para calçada da minha casa instintivamente. Quase morri. Tentei evitá-lo durante aquela noite pois sabia do mal que me faria. Quis despistar sua investida dizendo que àquela hora não era boa. Tentei antes disso, sem sucesso, me esconder na construção da casa vizinha, crendo ser um bandido que descia a rua na sua motocicleta frenética à Hell´s Angels. No entanto ele já tinha me avistado. Prometi que seriam meus últimos instantes na cidade de Pedra. Poxa! Tantos dias para tirar minha vida porque escolheu a primeira segunda-feira após a volta às aulas? Seria intencional, como quem diz é um “dia morto”? ou inconsciente? Isso talvez não faça nenhum sentindo mais. Embora ele não tenha conseguido me matar por inteiro sei que um dia esse desfecho acontecerá. Ainda me encontro em risco. Um pouco de vida foi ceifada, sim. Acertamos de conversar no sábado seguinte e até lá vou basicamente buscar saídas para quando ele tentar cantar uma troca de livros novamente. Aguardo ansioso para que ele eleve a qualidade da obra que pretende cambiar. Anuncie um livro tão interessante para mim quanto ao da primeira vez. Era o livro de E.P. Thompson — Costumes em Comum que me foi apresentado. Foi minha primeira vez.  A primeira de muitas que ele tentaria me matar. Mas agora era diferente e ele tenta me matar de outra forma. Pior que eu sei que ele não será de todo culpado. Eu fui um tolo por não ter conferido, um dia, se aquele livro era de sua coleção. Eu preferia até acreditar nisso, que ele tentava me matar com uma bomba que não explodiria, do que perder o livro e o amigo. Todas as vezes que ele vem trocar livros eles estão carregados de nomes de outros donos. E essa fissura me faz entender que sou o próximo a morrer por permitir outros nomes nos meus livros.






Disse o professor Mayk Oliveira (1984-). Nascido em Gouveia-AL, pseudônimo de Antônio Oitibó: “Faço o mesmo serviço do Lineu. Me surpreendo e aprendo, como historiador de formação. Me emocionou com sambas, folks, blues e rocks. Arranho um violão. No underground literário, dou umas cacetadas na língua portuguesa, lendo e escrevendo, e quando dá, vejo o Flamengo e o Brasil jogando. Neste percurso, escrevi três livros de poemas, um romance e um livro de contos, desde 2000. Publicou na conceituada revista Utsanga (Itália). Enfim sou aqui um ser na caminhada da evolução do Para Onde.” Ambientalista de espírito. Poeta maldito pela potência da vontade e ainda colaboramos na revista literária “O Pardal”