Gostaria que meus livros fossem mais criticados | Jr. Bellé

 

 por João Gomes/Revista Vida Secreta__

 





1 - Qual foi o primeiro livro que você leu?

Acho que foi “O cachorrinho Samba na floresta”, mas era uma exigência curricular. Minha primeira aventura literária por vontade própria foi a coleção “Os Karas”, do Pedro Bandeira.

 

2 - Entre a leitura e a escrita, qual o seu maior prazer?

Via de regra, ler. Gosto muito quando um livro me captura, e isso é bem recorrente. Acho que em questões literárias eu sou facinho. Mas há fases: eu me delicio com o começo de um livro, quando estou esboçando a história, contornando as personagens e descobrindo caminhos.

 

3 - Você costuma ler em e-reader?

Já tentei, acho uma plataforma interessante e uso para textos acadêmicos. O problema é que quando se trata de literatura, não me dá prazer algum ler numa tela.

 

4 - Você prefere ler um livro por vez ou vários de uma vez?

Adoraria ler um livro por vez, mas isso nunca acontece.

 

5 - Qual é a maior dificuldade para o escritor hoje?

Ser lido, o que envolve também ser bem editado e publicado. Hoje existe uma concorrência cruel pela atenção das pessoas, afinal estamos falando de mídias como Netflix, Tiktok, Instagram, televisão, etc. Ou seja, estamos concorrendo com um pessoal que não tem o menor pudor em jogar sujo. Além disso, para ser lido é preciso ser conhecido, e nem todo mundo tem grana para se publicizar, ou carisma e talento com as redes, para criar uma estratégia potente. Muitas vezes a pessoa é simplesmente uma ótima escritora ou poeta, e uma péssima influenciadora. Nesse caso, se não houver um apoio por parte da editora, é possível que o livro não encontre seus leitores. Isso, infelizmente, acontece com frequência.

 

6 - O que te faz amar um livro e qual mais influenciou sua vida?

O personagem, é ele, sempre que me faz amar uma história. Eu posso esquecer um enredo intrigante, um caso de mistério, mas lembrarei da protagonista. Agora, quando leio poesia, há outros fatores, muito mais sutis, que me encantam. Na maioria dos casos, o domínio da linguagem poética, a forma como a palavra me envolve, é essencial.

Há dois livros que realmente me influenciaram muito na juventude, e ajudaram a despertar minha paixão pela literatura: “A montanha mágica”, do Thomas Mann; e “Residência na terra”, do Pablo Neruda.

 

7 - O que te inspira a recomendar um livro a alguém?

O poder latente naquela obra: há livros que são poderosos pois o tema sobre o qual tratam é urgente, outros encontram seu poder em personagens marcantes (e aqui é quando o livro é de fato incrível), e há aqueles em que o estilo literário é tão envolvente que me faz querer gritar aos ventos sobre sua beleza.

 

8 - Qual gênero você raramente lê?

Crônicas, infelizmente. É um hábito que ainda preciso cultivar.

 

9 - Você se inscreve ou se guia por prêmios literários?

Me inscrevo em alguns prêmios e concursos que julgo relevantes. Meu mais recente livro, “Mesmo sem saber pra onde”, foi publicado pela editora Folheando, pois venceu o Prêmio Variações de Literatura LGBTQIA+. No entanto, é preciso ficar atento, pois há uma enormidade de prêmios ruins e antologias caça-níquel por aí.

E falta, de fato, mais prêmios para originais, especialmente de poesia. Quando comparo o volume de premiações em língua inglesa, ou mesmo espanhola, com as premiações para livros e escritores de um idioma periférico como o português, chega a dar tristeza.

 

 

10 - Diga um caso em que a fama do livro ou filme destruiu a sua experiência?

Eu fico encucado com o caso do “Alta Fidelidade”. O livro, escrito pelo Nick Hornby, é incrível. Contudo, ninguém sequer lembra que é um livro, pois todo mundo só se recorda do filme, que de fato é incrível, ou da série, que infelizmente foi cancelada na primeira temporada. Mas que fique registrado que o livro, mesmo esquecido, é o melhor dos três.

 

 

11 - Com que frequência você concorda com críticas dos livros?

Gostaria que meus livros fossem mais criticados, críticas são bem-vindas. Costumo valorizar quando alguém se dispõe a ler e comentar uma obra.

 

12 - Qual conselho você daria a um escritor iniciante?

Escreva. Faça isso regularmente, de preferência diariamente. Escreva mais. Erre bastante. Leia muito (e dê preferência a seus contemporâneos). Se der tempo, frequente um curso de escrita criativa, algumas manhas podem ajudar em momentos de crise.

 

13 - Qual o/a seu/sua poeta preferido/a?

Apesar de estudar a obra do Paulo Leminski, e ser seu conterrâneo, não posso deixar de dar esse crédito ao Neruda, ainda que ideologicamente nós não estejamos alinhados. Porém, se você estiver lendo essa entrevista e quiser sugestão de leitura de poesia, não pense duas vezes e vá atrás dos livros da Cida Pedrosa. AGORA!

 

14 - Como você acredita que deve ser a formação de um escritor?

Um escritor se forma vivendo — na rua conversando, no bar bebendo, na barricada lutando, na cama amando. Mas não sou da ala que desvaloriza a instrução formal: acredito que deveríamos ter muito mais cursos de formação de escritores e poetas, disciplinas nas universidades, cursos de pós-graduação, cursos livres, etc. Tudo isso ajuda muito, e caso não formemos excelentes escritores, formaremos excelentes professores ou pesquisadores, o que também é muito bem-vindo.

 

15 - Você considera a poesia elitista?

De forma alguma. Há poesia elitista, certamente, mas a poesia se encontrou com a rua, e já faz muito tempo.

 

16 - Quais livros você leva em viagens?

Aquele que estou lendo no momento, e o próximo da fila. Caso esteja viajando pra algum lugar onde a literatura seja pulsante, não levo nada e aproveito pra comprar livros de escritores e escritoras locais.

 

17 - Você acompanha financiamentos coletivos de livros e de projetos literários?

Sim, sempre! Há muita literatura ótima sendo publicada dessa forma.

 

18 - O que te faz parar de ler um livro na metade?

Tédio.


19 - Fale um pouco de algum projeto literário em andamento ou de um livro seu publicado recentemente.

Meu primeiro romance, “Mesmo sem saber pra onde”, acabou de entrar em pré-venda no site da editora Fo-lheando (editorafolheando.com.br). É um romance bas-tante erótico e político. Ele se passa em Curitiba e conta a história de quatro pessoas: um jovem pintor, uma confeiteira de meia-idade, uma professora universitária e um estudante. Apesar de terem idades e profissões completamente diferentes, eles se conhecem e se apaixonam. Mesmo sem saber como lidar com isso, decidem abraçar esse amor e se entregar a esse relacionamento a quatro. Mas precisam também encarar as consequências dessa decisão. Começa então nova rotina entre dois homens e duas mulheres. Uma família que se forma nas sombras de uma sociedade conservadora. É um romance sobre as políticas do amor e os amores que também são políticos.

 

 20 - Qual seu lugar favorito para ler e qual será sua próxima leitura?

Ler na beira da praia é perfeito, com uma cervejinha gelada sempre ao alcance da mão. Minha próxima leitura será o livro novo da Paula Fábrio, “Estudo sobre o fim: bangue-bangue à paulista”, que saiu pela editora Reformatório.



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Jr. Bellé nasceu no sudoeste do Paraná, filho da Dona Bete e do Seu Valcir. É poeta, escritor e jornalista, doutorando em Estudos Literários pela UFPR. Tem dois livros publicados: “Trato de Levante (Patuá) e amorte chama semhora” (Patuá). Em 2021 venceu o Prêmio Flipoços, na categoria Poesia, e o Prêmio Variações de Literatura LGBTQIA+ com seu primeiro romance, “Mesmo sem saber pra onde” (Folheando). Pode ser encontrado em @jr.belle.

 

 




 


João Gomes nasceu no Recife/PE em 1996. Autodidata, é escritor e poeta, publica resenhas, crônicas e entrevista com escritores na revista Mirada. Publicou em algumas antologias, como Granja, Sub-21, Capibaribe Vivo, Tente entender o que tento dizer, No entanto: dissonâncias e etc. Edita a revista de literatura e ideias Vida Secreta. Atualmente estuda Multimídia no Ginásio Pernambucano e mantém no prelo seu livro de poesia.