Um toque de regionalismo freak num contexto de realismo fantástico

 

por Taciana Oliveira__




Conversamos com André Arieta, autor do romance Proibido Mirar Afuera (Toma aí um poema, 2022), livro inspirado “na iconoclastia boemia de uma Porto Alegre que já foi punk e progressista, mas que ainda resiste nos artistas que a reinventam”. A arte de capa é da artista Biah Werther. Na definição do autor: Uma obra que nasce de vários textos sem relação nenhuma, contos, poemas, frases soltas que fui colando e costurando com uma história que vai surgindo aos poucos.”


1 - Proibido Mirar Afuera traz um tanto de referências artísticas musicais e literárias. Como você apresentaria ao leitor a tua obra?


Estas referências definem a forma como escrevo, no sentido de que trazem muitos elementos ressignificados numa espécie de colagem. Devo isso a antropofagia modernista e as cores e sabores da tropicália. Ao mesmo tempo meu texto reflete o lugar de onde vim, a Porto Alegre roquenrou boêmia e psicodélica dos anos 90, com um toque de regionalismo freak num contexto de realismo fantástico. Eu apresentaria como um livro bastante pessoal, onde a fragmentação narrativa move a história em várias direções, mas sempre voltando ao escritor, o "Velho" sentenciado a prisão perpétua como único prisioneiro de uma cadeia em uma ilha deserta, tendo apenas como companheiro, o Carcereiro, que escuta suas narrativas estranhas que o narrador lê em cadernos velhos. desenvolvo este amálgama bizarro com um truque narrativo: a solução de um crime: quem matou a Morta com amnésia?

 

 

2 - Do processo criativo o que você destacaria? Quando nasce Proibido Mirar Afuera?


Nasce de vários textos sem relação nenhuma, contos, poemas, frases soltas que fui colando e costurando com uma história que vai surgindo aos poucos. Tudo começa com uma quase ausência de palavras que surgem tímidas, num mar de letras aleatórias e termina com letras que vão desaparecendo das frases.   A primeira parte do livro é mais solta, fragmentada, onde me aproximo da poesia concreta nas diferentes fontes e diagramações. Aos poucos surge e se desenvolve a história do escritor condenado e a rebelião de seus personagens, construída em torno de um assassinato.

Então o livro nasceu destes fragmentos e da história que criei para ressignificá-los

 

3 - Que autores você citaria como influência ou referência para o desenvolvimento narrativo da obra?


As influências são citadas na obra de forma direta ou indireta: Caio Fernando Abreu, Érico Veríssimo, Burroughs, Philip K Dick. Gabriel Garcia Marquez, Ernesto Sábato e Kurt Vonnegut. Existem outros, mas estes acima são grandes potências criadoras que me ajudaram a escrever

 

4 - Quem é André Arieta? Quando você se reconhece como escritor?


Desde o final da adolescência, mas demorei muito a conseguir escrever algo que me parecesse interessante. Por isso me dediquei ao cinema e a música durante tantos anos. Até escrever algo que tivesse qualidade suficiente, tendo como parâmetro uma régua muito alta, que são os autores citados acima. Então eu sou um escritor que escreveu sempre, mas só conseguiu ter um livro que valesse a pena ser lido agora. Mas sou também músico, cineasta, professor, não sou um especialista, jamais conseguiria fazer apenas uma coisa toda a vida. Meu trabalho, bom ou mau, tem uma identidade muito clara: minhas impressões digitais. Então o livro sempre esteve ali, nas músicas, nos filmes etc.

Mas agora chegou a vez da literatura, meu próximo romance já está sendo escrito.

 

5 - Proibido Mirar Afuera conversa com referências da cultura beat e tropicalista. Como se deu a concepção do perfil psicológico dos personagens? Há também elementos de autoficção  na construção dessa narrativa?

O perfil psicológico dos personagens não foi construído de uma forma consciente. eu simplesmente fui escrevendo a história de pessoas que perderam muito, e não sabem onde procuram seus destroços. Sim, existem muitos elementos de autoficção, que fui jogando ali, no meio da história, sem maiores explicações.







André Arieta - Músico, cineasta e cientista onírico André também é professor de cinema e calouro na fábrica de palavras e papel. Gosta de Syd Barret e Bete Carvalho e se desloca no espaço/tempo com os filmes de Antonioni. Se tu chegou até aqui, te aprochega!