Maternidade emancipada, crônica de Germana Accioly

 por Germana Accioly__



 


                      
Hoje o caçula faz 25. Como tive medo desse dia! Medo do buraco que poderia se abrir no meu peito, semelhante a uma aposentadoria sem propósito.

Em algum lugar, muito tempo atrás, li um texto sobre o amor materno humano. O autor (sim, era um homem, disso eu lembro bem), defendia que, por ser o mais dependente dos mamíferos, uma espécie de amor incondicional tomava conta das mães, até que as crias pudessem, enfim, sair do ninho, com sorte, duas décadas depois. Nesta visão, o amor seria um tipo de instinto de sobrevivência. Na ocasião, pensei: sobrevivência da mulher que se torna mãe também. Medida de proteção.

Hoje penso tanto mais sobre a maternidade! Uma bigorna prestes a cair na cabeça. Um jogo de adivinhação, de tentativa e erro. Talvez, uma missão conferida às mulheres tão "sagrada" que manda uma mensagem mensal. Pois bem. Uma hora o tal recado a cada 28 dias deixa de chegar e o corpo aponta para outras perspectivas. Não deve ser apenas instinto. Vejo leves vagas de amor-próprio.

É verdade, no meu caso, a maternidade salvou de alguns males da alma. E este amor imenso que sinto pelos filhos beira o divino.

E o infernal. As mães mamíferas não ensinam num primeiro momento a caçar. Elas são o alimento, nutrição e olhar profundo para a sobrevivência. O desafio é desmamar, simbolicamente, ao longo da vida.

Hoje, 1 de junho de 2023, o caçula com 25 anos e eu com 51.

Eu tinha 26 quando ele chegou. A ponta de rama, o maturi.

A cabeça vez ou outra se ocupava em entender quem seria eu depois dessa travessia, dessa aventura, dessa experiência maior que eu.

Hoje acordei emocionada sim. Gosto de celebrar o parto, este rito de passagem de mãe e filho.

Contudo, preciso fazer uma confissão: me sinto mais inteira do que nunca. Subi nas minhas convicções, me transformei numa mulher cheia de sonhos, recomeços, expectativas e força de ser.

Vou saindo de fininho da ribalta do meu menino-homem, vou subindo no meu palco. Quero encenar textos novos, dançar com as músicas do prazer, cantar loas. O buraco, aquele que simbolizaria o ninho vazio, está repleto de capacidade de amar, vontade de aprender.

Nunca, nunquinha, imaginei que esta seria uma data de celebração para os dois. Eu fantasiava a falta. Tão boba, querendo adivinhar o futuro!

Viva meu caçula adulto!

Viva eu, uma invenção ambulante, cheia de ideias que saem aos borbotões por todos os buracos da cabeça.




Germana Accioly
 é escritora e jornalista. Escreve no blog Perder deVista. Publicou Não é sobre você (Selo Editorial Mirada, 2021)