Três textos de Antônio Lucas

por Antônio Lucas___

 


Foto: Sandro Gonzalez


I

 

a cor da tua rua quando chove apareceu no meu dia.

teu quintal gigante, cheio de redes, veio perambular nos meus pensamentos.

a tua casa era uma extensão do teu corpo, como um desenho, um mapa, um negócio bem bonito que é difícil explicar.

gostava do gosto da tua língua nos meus lábios. era saboroso.

o cheiro do teu café invadiu minha janela.

tenho até hoje teus bilhetes.

teus olhos acesos, livres, tinham um jeito de despir o mundo.

o teu lugar no meu peito constrói até hoje

mares    mares  mares

dentro de mim.

 

 

II

 

 

Hoje dancei pela casa

Respirei fundo

Pensei nas conversas com os amigos

O cheiro de todos eles vieram me visitar

O gosto do sol se confunde com o gosto da saudade

Uma dor pulsa no meu peito

A dor que, embalada pelos meus passos, conduz minha manhã

Resiste uma beleza nas manhãs que alivia o peso do mundo

Reparo em cada detalhe da casa: sei de todos os seus segredos agora...

Penso que as palavras povoam meus dias

E é por causa delas que vou preenchendo os meus caminhos

A água da minha sede...

Que dia é hoje mesmo? Já nem sei mais...


 

III



- Este é o mar, menino.

- Ele é medonho, meu pai.

- Tenho medo...

- Bobagem, moleque.

O mar trazia uma estranha sensação, pensava o menino...

(....)

Ele sabia algo sobre mim.

E o fato de saber algo que eu nem sabia me gelava a alma.

O que será?

Os meus olhos procuravam uma resposta, um alívio.

Eu ainda estava aprendendo a trabalhar o silêncio.

A esculpir, pacientemente, os mistérios da vida.

 


 


Antônio Lucas
é filho da Rosane, neto da Isaura. É professor; gosta de livros, discos e filmes.Constrói abismos para pular.