por Adriano Espíndola Santos__
![]() |
via REUTERS |
No feriado prolongado, fomos eu, minha esposa e meu filho para dois lugares: Cumbuco e Paracuru. Ficam no litoral oeste do Ceará. A pretensão era descansar, mas as idas e vindas, encontros e desencontros, me tornaram, especialmente, um farrapo. Sem previsão de volta, se no domingo ou na segunda, também feriado de Tiradentes, resolvemos, de última hora, voltar no domingo à noite. Não gosto de viajar à noite, mas a sensação de mais uma noite mal dormida me fez aceitar o fado. Voltamos por volta das 19h. A estrada, ao contrário do que pensávamos, não estava “limpa”. Parece que boa parte dos viajantes resolveu voltar à cidade grande no domingo, para descansar em mais um dia de feriado. Paramos no caminho para comer. Pedimos sanduíches variados e batata frita. Por conta da saciedade, encobrimos momentaneamente o cansaço. Ao chegar a casa, às 22h, já não havia o que fazer, a não ser dormir. Estávamos exaustos, sem forças sequer para conversar. Dormi bem, acordei às 11h de segunda-feira. E a primeira coisa que me esposa falou foi que o Papa havia falecido. A notícia caiu como uma bomba em meu colo. Passei o restante do dia mal, reflexivo. Como o Papa poderia ter morrido, se no dia anterior abençoou os fiéis espalhados na Praça de São Pedro. Vi e revi várias vezes a sua imagem do Domingo de Páscoa. Ele estava realmente abatido, mas nada que indicasse a morte. Um amigo meu me passou uma mensagem, muito triste com a situação, sabendo ele que eu amava o Papa. Refletimos sobre a morte tão súbita e sobre a falta de explicações. Procurei os melhores veículos de comunicação, mas nada além de mensagens do legado do Papa. Eu queria saber o motivo de sua morte. Na verdade, não queria aceitar que um Papa progressista e tão preocupado com a população pobre pudesse partir sem sobreaviso, assim, nos deixando órfãos. Era, para mim, a última voz para a defesa dos menos favorecidos. Imagino como ele deve ter passado os tempos mais recentes, com tantas guerras ocorrendo ao mesmo tempo. Populações inteiras dizimadas. Soube que ele ligava todas as noites para a Basílica de Gaza para escutar — somente para escutar. Perder o Papa foi como perder um ente querido. Papa Francisco será mais que um Papa, um anjo a interceder por nós. Vejo-o agora no céu, esplêndido, livre dos achaques que o perseguiam, na presença do Pai, a sorrir, a brincar, como fez em sua passagem terrena — e essa é a imagem que quero levar comigo. Tenho muita pena daqueles que comemoraram sua morte — sim, há os que comemoraram —, alegando ser um Papa comunista. Se cuidar dos pobres e desvalidos é ser comunista, que o seja. No grupo da minha família, tão católica, sequer uma menção ao Papa morto. O que ele fez de mal? Ele não era alinhado aos interesses de uma classe dominante, ou da extrema-direita? Isso me faz sentir que estou no caminho certo, como diz a música: “no caminho do bem”.
Adriano Espíndola Santos é natural de Fortaleza, Ceará. Em 2018 lançou seu primeiro livro, o romance “Flor no caos”, pela Desconcertos Editora; em 2020 os livros de contos, “Contículos de dores refratárias” e “o ano em que tudo começou”, e em 2021 o romance “Em mim, a clausura e o motim”, estes pela Editora Penalux. Colabora mensalmente com as Revistas Mirada, Samizdat e Vício Velho. Tem textos publicados em revistas literárias nacionais e internacionais. É advogado civilista-humanista, desejoso de conseguir evoluir — sempre. Mestre em Direito. Especialista em Escrita Literária e em Revisão de Textos. Membro do Coletivo de Escritoras e Escritores Delirantes. É dor e amor; e o que puder ser para se sentir vivo: o coração inquieto. instagram: @adrianoespindolasantos | Facebok:adriano.espindola.3 email: adrianoespindolasantos@gmail.com